A retoma da economia portuguesa ganhou força no último trimestre de 2021, crescendo 5,8% em termos reais (descontando a inflação) face ao último trimestre de 2020, confirmou ontem o Instituto Nacional de Estatística (INE). O avanço tinha sido de 4,4% no terceiro trimestre, portanto, houve aqui um balanço mais favorável na reta final do ano passado..No entanto, mesmo este balanço, que levou o produto interno bruto (PIB) anual de 2021, a subir 4,9%, (o ritmo mais elevado desde 1990), não é de todo suficiente para apagar os danos destrutivos provocados pela pandemia covid-19 em 2020. Neste ano, a recessão anual chegou a 8,4%, também esta uma marca histórica. E contas feitas, cerca de metade ou mais de metade da economia portuguesa ainda estará abaixo da linha de água marcado pelo começo pandemia..De acordo com cálculos do Dinheiro Vivo a partir dos dados novos do INE, a economia portuguesa ainda está 3,9% abaixo do nível anterior à covid-19. Já era assim no terceiro trimestre, mas a reta final do ano passado apesar do maior dinamismo, não veio alterar o quadro de atraso..Vários analistas diziam, antes de eclodir a guerra na Ucrânia (no passado dia 24 de fevereiro), que apenas no segundo trimestre é que Portugal limpa totalmente o referido atraso económico..No entanto, a realidade é bastante diversa consoante os agregados da procura ou os setores da oferta considerados (onde a medição é feita através do valor acrescentado bruto ou VAB)..Ótica da procura.Na ótica da procura, as despesas de consumo familiares estão 3,1% abaixo de 2019 e as exportações totais mais de 8% aquém dos níveis pré pandémicos, muito por causa da pesada destruição de valor nas atividades de serviços ligadas ou expostas ao turismo, como alojamento, comércio, viagens..O valor exportado em mercadorias está com um atraso de 1,6%, mas nos serviços a quebra ainda era de quase 22% face ao final de 2019..O investimento fixo (o que foi efetivamente realizado com projetos novos ou reforçados) é o agregado que destoa. Aqui, de facto, já foram superados os níveis pré-pandemia, mostra o INE. Está 3,2% acima de 2019, em termos reais..Apesar dos investimentos em equipamentos de transporte acusarem um tombo monumental de quase 26%, as restantes categorias acabam por compensar..O investimento em "recursos biológicos cultivados", no fundo o investimento em agricultura, já superou em 1,8% o patamar alcançado em 2019..O segmento designado "outras máquinas e equipamentos e sistemas de armamento" registam uma recuperação de 4,4%. O investimento expresso em "produtos de propriedade intelectual" avançou 11,5%..Mas o mais decisivo é a construção. É o setor que maior peso tem no investimento total e supera já 5,1% os níveis anteriores à pandemia..Ótica da oferta, por setores empresariais.A outra ótica é a da oferta. Aqui, a medição é feita, como referido, através dos VAB setoriais (ver infografia em baixo)..O VAB total a preços de base ainda se encontra mais de 3% abaixo do nível pré-covid. Para este atraso contribui o setor definido pelo INE como "comércio e reparação de veículos; alojamento e restauração". O atraso ainda é superior a 12% face ao final de 2019..O trio "energia, água e saneamento" regista uma quebra de 4,4%, a segunda maior..A indústria transformadora está com um atraso de 3,5%..O setor "transportes e armazenagem; atividades de informação e comunicação" encontra-se quase 2% abaixo do ponto anterior à crise pandémica..Estes quatro setores mencionados foram responsáveis por uma criação de valor de 77 mil milhões de euros em 2021, isto é 45% do VAB total. Ou seja, metade da economia portuguesa ainda está a caminho da saída dos efeitos nefastos da pandemia..A compensar positivamente, está o valor acrescentado da construção, que rodará cerca de 6,6% face ao final de 2019..Menção positiva também para o setor primário, composto por "agricultura, silvicultura e pesca", que já avançou ligeiramente e supera a crise em 0,5%, em termos reais.."Apesar do choque sanitário e económico abrupto que levou a economia a cair 8,4% em 2020, teve início no ano passado uma recuperação saudável e espera-se que a economia volte ao seu nível pré pandémico no segundo trimestre de 2022", dizem os analistas da agência de rating DBRS, que estão mais otimistas quanto à tendência na nota da dívida soberana.."A crise não parece ter inflingido danos económicos graves a longo prazo. Além disso, as perspetivas de crescimento são fortes nos próximos anos, apoiadas por uma maior estabilidade política após a maioria [absoluta do PS] nas eleições legislativas de janeiro de 2022, pelo facto de a população ter das taxas de vacinação mais elevadas da Europa e pelas grandes transferências [fundos] da União Europeia que visam melhorar a capacidade produtiva do País", rematam os economistas, que fecharam este diagnóstico a 22 de fevereiro, dois dias antes da nova guerra eclodir..Luís Reis Ribeiro é jornalista do Dinheiro Vivo