Merkel favorita mas com coligação em aberto

Alemães votam hoje em eleições legislativas, nas quais Angela Merkel aposta num terceiro mandato como chanceler do país. As sondagens que têm vindo a ser divulgadas apontam para a sua vitória, deixando pairar a dúvida apenas sobre quem serão os parceiros de coligação da CDU/CSU. As urnas abriram às 08.00 da manhã (07.00 na hora portuguesa) e encerram às 18.00 (17.00 na hora portuguesa). Nessa altura surgirão as primeiras projeções mas espera-se um resultado apertado que poderá gerar inicialmente alguma indefinição. Muita gente na UE, especialmente nos países da Europa do Sul, tem os olhos postos neste escrutínio devido ao peso que a Alemanha tem ou pode ter na resolução da crise do euro.
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Merkel votou de manhã em Berlim, acompanhada do marido, Joachim Sauer, enquanto que o seu rival social-democrata, Peer Steinbrück, votou em Bona, onde vive com a família. Ao deixar o centro de voto, onde esteve acompanhado pela mulher, Gertrud, Steinbrück disse que dormiu bem e declarou-se satisfeito pela reta final da campanha, em que, não sua opinião, "o SPD revelou um perfil claro". E acrescentou: "Espero que isso se reflita nos resultados".Numa entrevista hoje publicada pelo 'Bild Zeitung', Steinbrück garantiu ainda que não aceitará entrar numa Grande Coligação com a CDU/CSU de Merkel: "Quero ser chanceler de uma coligação entre sociais-democratas e Verdes. Não estou disponível para governar com uma equipa de Grande Coligação".

A nível interno a campanha não foi muito animada e alguns media disseram tratar-se da mais aborrecida campanha eleitoral desde 1949. Alguns estudos de opinião mostram o desinteresse dos alemães na mesma, sendo esse desinteresse mais profundo entre as camadas mais jovens do eleitorado. O assunto do terceiro resgate grego ou da intervenção na Síria ressurgem aqui e ali e lá animam o debate. O resto são casos, como o dossiê da Stasi do candidato social-democrata, da empregada ilegal filipina que no passado esteve a trabalhar na sua casa ou do dedo médio que decidiu exibir durante uma entrevista e foi capa da 'SZ Magazin'. No primeiro e único duelo televisivo entre Merkel e o seu rival Peer Steinbrück o assunto mais comentado nas redes sociais foi... o colar que ela usou, com peças com as três cores da bandeira da Alemanha. Tanto para o colar dela, como para o dedo médio dele, internautas mais animados criaram contas de Twitter próprias.

Nesse debate Steinbrück criticou as políticas de austeridade que Merkel tem ajudado a impor aos países que estão sob programas de assistência financeira e que, no entender do social-democrata, têm sido servidas em "doses mortais". O candidato do SPD lembrou que, após a II Guerra Mundial, a Alemanha foi muito ajudada no âmbito do Plano Marshall e que agora é a sua vez de ajudar. Porém, Steinbrück, que foi ministro das Finanças de Merkel durante o Governo de Grande Coligação CDU/CSU-SPD (2005-2009), sublinhou a importância da consolidação orçamental. Foi com ele naquela pasta ministerial que a Alemanha inscreveu na Constituição o chamado "travão da dívida".

Merkel, que neste seu segundo Executivo governa coligada com o FDP, rejeitou por sua vez uma "falsa solidariedade" e prometeu manter a "pressão". Ou seja, admite continuar a ajudar os parceiros europeus que precisam, mas mantém as exigências de que esses mesmos países prossigam os seus esforços de consolidação orçamental e as reformas estruturais. A chanceler disse também que ninguém sabe ainda a dimensão do terceiro resgate da Grécia. Os alemães são muito reticentes em financiar as dívidas alheias e exigem aos outros o rigor que dizem ter experimentado na própria pele.

Alguns analistas consideram que a melhor solução para a crise na Zona Euro seria a formação de uma nova Grande Coligação, como em 2005, pois seria a opção mais representativa e inclusiva da sociedade alemã, tornaria mais difícil os bloqueios no Bundesrat (câmara alta do Parlamento, dominada pelo SPD e Verdes) e ajudaria na tomada de decisões relativamente à resolução da crise. Encontrar um meio-termo não seria, no entanto, fácil. A CDU/CSU não querem ouvir falar em mutualização da dívida entre países da moeda única, nem de um fundo pago pelos bancos, destinados aos resgates desses mesmos bancos, nem noutras ideias que impliquem a partilha por todos do fardo da dívida (como se a UE subitamente fosse uma verdadeiro Estado federal).

Se os liberais do FDP conseguirem um bom resultado, contrariando a má prestação que têm registado em eleições regionais na Alemanha, Merkel poderá manter então a coligação atual e prosseguir no mesmo caminho. Ou não. Isto porque a maior economia da UE começa a sentir por outras vias o impacto da crise dos outros.

Apesar do crescimento de 0,7% que registou no segundo trimestre e de uma taxa de desemprego de 6,8% em agosto (muito longe dos valores de países como Portugal, Espanha, Grécia ou Itália), a Alemanha viu agora as suas exportações caírem. A variação das exportações germânicas foi negativa, na ordem de 1,1%, em julho, quando comparado com o mês anterior.

55% das exportações alemãs têm como destino países da União Europeia, sendo que 36% do total vão para os parceiros do euro. Só para a Grécia, desde 2008, as exportações alemãs caíram cerca de 40%, dizia recentemente um artigo do 'New York Times'.

Assim, Merkel , que recentemente, num artigo publicado na 'Spiegel' foi acusada pelo filósofo Jürgen Habermas de pôr a Alemanha a "dormir sobre um vulcão" e de alimentar uma "soberania de fição" para os países europeus em crise, poderia tornar-se mais europeísta.Por outro lado, sublinhou o 'Financial Times', quem esperar muito da Alemanha pós-22 de setembro pode sofrer uma desilusão. Não só porque as eleições em si podem nada mudar na UE e na Zona Euro, mas também porque grandes passos, como a alteração de tratados para aprofundar a união política, económica, financeira ou bancária, requerem grandes lideranças e entendimentos. E essas condições podem não existir noutros países-chave da UE, que não a Alemanha.

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