"Mercado mundial de Esports movimenta mil milhões de dólares"

Os desportos eletrónicos estão em franca expansão a nível mundial e a pandemia provocada pelo covid-19 deu-lhes maior destaque. Um "mundo" que estará esta tarde em análise numa conferência da Federação Portuguesa de Desportos Eletrónicos.
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O que são os desportos eletrónicos e a sua importância na sociedade, a relação com o desporto tradicional e as potencialidades económicas que representa são alguns dos temas que na tarde desta quinta-feira (30 de abril) estarão em análise na primeira conferência internacional de Esports organizada em Portugal.

Da responsabilidade da Federação Portuguesa de Desportos Eletrónicos este encontro online - que terá lugar entre as 14.30 e as 18.30 - vai reunir uma representante da secretaria de Estado e da Juventude e Desporto, Diana Santos, o diretor-geral do Comité Olímpico de Portugal, João Paulo Almeida, e um dirigente da International Esports Federation ou da European Esports Federation.

Criada em 2016, a Federação Portuguesa de Desportos Eletrónicos é dirigida por Tiago Fernandes que em entrevista ao DN fala sobre os Esports em Portugal, o impacte que a pandemia causada pelo novo coronavírus teve neste setor e as perspetivas para o futuro.

Em que ponto estão os Esports em Portugal? A Federação Portuguesa de Desportos Eletrónicos (FPDE) tem dados sobre o número de jogadores e clubes que participam nas várias competições?

Os Esports em Portugal seguem a tendência mundial de crescimento em todas as vertentes: no número de atletas, de clubes e de pessoas que assistem a conteúdos de videojogos e desportos eletrónicos. Embora não existam números oficiais no que se refere ao número de jogadores e clubes no nosso mercado, cremos que o número de praticantes das diversas modalidades dentro do Desporto Eletrónico ultrapassará, em Portugal, um milhão, dos quais cerca de 10 mil são atletas amadores que praticam regularmente e que aspiram a serem profissionais. Este valor justifica-se com vários indicadores, especialmente os cerca de 3 milhões de pessoas de nacionalidade Portuguesa ou atualmente a residir em Portugal que têm como principal hobby jogar videojogos.

Qual o impacte da atual situação nos Jogos Eletrónicos? As competições têm sido adiadas? E economicamente?

Tal como qualquer outra indústria no Mundo atualmente, também a dos Desportos Eletrónicos foi impactada pela atual situação criada pelo surto pandémico do covid-19. Todos os eventos presenciais foram cancelados ou adiados para 2021 e a retração (ou impasse) no investimento das marcas, que suportam uma esmagadora percentagem da indústria, tem criado um ambiente de grande incerteza em competições, equipas e jogadores. Contudo, como os Esports vivem na sua essência no âmbito virtual, a indústria rapidamente se adaptou e passámos a um cenário competitivo 100% online, com todas as competições a serem disputadas através da Internet. Por outro lado, com todas as competições do Desporto Tradicional paradas, têm sido promovidas várias iniciativas que têm permitido cruzar desportistas reconhecidos de vários desportos, como o futebol ou o automobilismo, com profissionais de Esports. Estas ativações têm ajudado a promoção dos Desportos Eletrónicos como complemento aos desportos tradicionais e a torná-los mais mainstream do que nunca.

A Conferência Internacional de Esports que tem lugar esta tarde tem como um dos seus pontos a relação entre os Desportos Eletrónicos e o chamado Desporto Tradicional. Essa relação existe? E em que moldes?

Existe um claro paralelismo entre os Desportos Eletrónicos e o Desporto Tradicional, podendo mesmo em alguns casos, funcionar como extensão do próprio Desporto Tradicional. Existem campeonatos, clubes, jogadores e, principalmente, fãs que acompanham, assistem e adquirem merchandising. A grande diferença entre os dois reside no ambiente digital em que os Esports habitam. Uma diferença que acaba por aproximar mais a comunidade que vive e gravita na indústria e a mudar a forma como os fãs e adeptos se relacionam com os clubes e os seus ídolos. A entrada de clubes desportivos tradicionais nos Esports são prova que os Desportos Electrónicos terão um grande peso na vida dos clubes e na renovação das suas massas associativas.

A crescente visibilidade do Desporto Eletrónico tem levado a que surjam questões, por exemplo, se este pode ser considerado um Desporto. O que entende a federação?

Não existe uma resposta definitiva sobre o que torna uma atividade um desporto ou uma atividade desportiva. A FPDE considera que o Desporto Eletrónico reúne vários aspetos que juntos nos dão a legitimidade de lutar pelo reconhecimento dos Desportos Eletrónicos como modalidade desportiva de pleno direito - a estratégia, a perícia, o jogo de equipa, a competição, o profissionalismo e o entretenimento. Se o aspeto físico, ou a sua intensidade, fosse o único fator a ter em conta para considerarmos uma atividade um desporto, não teríamos o Xadrez, Bridge ou Pesca Desportiva como desporto. Contudo, existem mesmo estudos científicos que demonstram que os níveis de esforço físico, coordenação motora de diversos órgãos do corpo e pressão a que estão sujeitos os atletas de alta competição de Desportos Eletrónicos são equivalentes (e em alguns casos até superiores) a outros desportos tradicionais, como a Fórmula 1 ou o Ténis de mesa, este último um desporto olímpico.

Sendo uma atividade com grande recetividade nas camadas mais jovens da população essa adesão reflete-se na presença de empresas no apoio seja a equipas, a praticantes individuais ou a provas/exibições?

A predominância dos videojogos e dos Desportos Eletrónicos como atividade predileta nas camadas mais jovens é inegável. Não só na prática, mas principalmente no consumo de conteúdos na esfera digital. Esta realidade reflete-se naturalmente na alteração do foco das marcas, endémicas ou não à indústria, que vão onde estão seus atuais e futuros consumidores. Esta presença traduz-se no apoio a competições, equipas ou jogadores que começam a ser, à semelhança de outros desportistas, embaixadores das marcas. Em Portugal temos o exemplo do jogador profissional Ricardo Pacheco que é um atleta patrocinado pela Red Bull.

Nos países onde os Desportos Eletrónicos já existem há vários anos há inúmeros atletas profissionais. Qual é a realidade em Portugal?

O gaming em Portugal, no geral, tem evoluído de forma francamente positiva, sobretudo nos últimos cinco anos. Se juntarmos isso à entrada de vários clubes desportivos ao mercado, será fácil aferir que tanto a nível comercial como no número de praticantes, o mercado está em franco crescimento. Contudo, ainda não estamos ao nível de outros países quando falamos na profissionalização do setor e é algo que na FPDE queremos mudar rapidamente para que num futuro próximo nos aproximemos da realidade internacional. Entre atletas portugueses a competir em equipas internacionais e atletas residentes em Portugal a competir em equipas nacionais, estimamos que existam cerca de 20 atletas 100% profissionais.

Como é a relação com o Governo e outras entidades oficiais?

Em termos internacionais, a Federação Portuguesa de Desportos Eletrónicos é membro tanto da Federação Europeia de Esports (EEF) como da Federação Internacional dos Desportos Eletrónicos (ieSF), vulgo a "UEFA" e "FIFA" dos Desportos Eletrónicos. E estamos a trabalhar a uma só voz para termos os Desportos Eletrónicos como Desporto e ajudar a dinamizar a indústria a nível global. Em Portugal, estamos já a trabalhar com as instituições governamentais no sentido de ter a FPDE reconhecida como uma Federação de pleno direito, estamos na fase de instrução para obtenção do estatuto de Utilidade Pública.

A Federação tem dados sobre o impacte que os Desportos Eletrónicos têm na sociedade?

Tendo em consideração que as gerações digitais (pessoas nascidas na década de 90) sempre viveram numa realidade e sociedade digital, em que as redes sociais, as plataformas de video on demand e, especialmente, o gaming e os Desportos Eletrónicos, entre muitas outras ferramentas digitais são, atualmente, uma parte fundamental e as suas principais atividades, é fácil chegar à conclusão que os Desportos Eletrónicos são o desporto do futuro.

De acordo com dados da consultora Newzoo, perto de 500 milhões de pessoas em todo o Mundo assiste hoje a conteúdos de Esports, num mercado que já movimenta mais de mil milhões de dólares. Estes números são já superiores ao Futebol Americano e Rugby, em conjunto. Quando se fala do impacto social dos Desportos Eletrónicos, mesmo sem ter em consideração estes números, facilmente se percebe que ele é enorme pela influência nas atividades diárias destas pessoas, na forma como ocupam os seus tempos livres e até na forma como as pessoas socializam. Se a isso se juntar o facto de que muitas destas pessoas estão já a criar verdadeiras carreiras profissionais na indústria, em diferentes áreas, torna-se inquestionável o valor e importância social dos Desportos Eletrónicos.

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