Pedro Sánchez anulou ontem a participação na cimeira sobre o financiamento das economias africanas, em Paris, para tratar de uma crise migratória cuja origem se explica pelas dificuldades económicas. Na véspera, uns 6 mil migrantes, na sua maioria marroquinos, atravessaram a fronteira entre Fnideq e Ceuta pelo mar, um recorde absoluto, enquanto em Melilla 86 pisaram o outro enclave espanhol em território africano..No entanto, o primeiro-ministro espanhol prometeu "restabelecer a ordem", o que passa por impedir na medida do possível a travessia dos migrantes, e a expulsão dos que conseguiram nadar até à cidade que ostenta na sua bandeira o escudo português..DestaquedestaqueA decisão de Madrid de acolher o líder da Frente Polisário estará na origem da porosidade da fronteira no lado marroquino..No Twitter, a jornalista e ativista espanhola Helena Maleno alertou que desde domingo circulava a informação de que Marrocos - país onde viveu durante 20 anos até ter sido expulsa em 2019 - havia deixado de vigiar as fronteiras, um convite a todos quantos queiram tentar a sorte e também, alertou, "pôr centenas de vidas em risco"..Twittertwitter1394210434220183552.Assim foi. "Vi no Facebook que era possível atravessar a fronteira, por isso apanhei um táxi com o meu amigo, pois já não consigo alimentar a minha família", disse Ouarda, de 26 anos, da cidade de Tetuão. "Não tenho medo. Ou morro ou atravesso", disse à AFP. Antes desta mãe de dois filhos, divorciada e desempregada se dirigir para Ceuta, milhares conseguiram-no, primeiro pela linha costeira, depois a nadar e ou a caminhar na maré baixa a partir das praias marroquinas a poucos quilómetros a sul. Tudo sob a passividade da polícia marroquina..Na terça-feira, com blindados do exército alinhados junto à vedação fronteiriça e um reforço policial de 200 elementos, as forças de segurança espanholas lançaram gás lacrimogéneo para território marroquino e recolhiam as centenas que continuaram a passar as águas. Da véspera, cerca de metade dos migrantes já tinham sido expulsos..Pedro Sánchez, que lamentou a "grave crise para Espanha e para a Europa", lembrou que a devolução dos migrantes a Marrocos é o destino, dando cumprimento aos acordos com Rabat. "Marrocos é um parceiro, um país amigo de Espanha e assim deve continuar. Mas para que resulte efetiva, esta cooperação deve ser baseada, sempre, no respeito às fronteiras mútuas", advertiu..A União Europeia, pela voz da comissária dos Assuntos Internos Ylva Johansson, expressou solidariedade para com Madrid e afirmou que Rabat deve impedir a saída "preocupante" de migrantes do seu território. A pressão diplomática terá dado frutos, com Marrocos a reforçar a fronteira de Fnideq..Madrid nega que haja uma ligação entre a hospitalização do líder da Frente Polisário, movimento que defende a independência do Saara Ocidental, e este afluxo. O reino marroquino, que pretende o território, ex-colónia espanhola, mostrou a sua fúria perante o sucedido e considerou "um teste" às relações entre ambos os países. Brahim Ghali, de 73 anos, foi internado num hospital em Logroño no final de abril, com covid-19..A ministra dos Negócios Estrangeiros Arancha González Laya afirmou que Ghali tinha sido acolhido por "razões humanitárias". Mas o MNE marroquino disse que se tratava de de "uma decisão soberana de Espanha, que Marrocos reconhece plenamente" e do qual, acrescentou, "tirará todas as suas consequências"..cesar.avo@dn.pt