É impossível ficar indiferente perante a imponência do edifício da Escola Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho, na rua Rodrigo da Fonseca, em Lisboa. Mas para além da óbvia beleza exterior, o interior possui um riquíssimo património. Por isso, foi classificada como monumento de interesse público, de acordo com a portaria publicada no Diário da República, em outubro de 2020..Criado em 1885, com o nome de Liceu Maria Pia, em homenagem à rainha D. Maria Pia de Saboia, foi o primeiro liceu feminino em Portugal. Mas só se mudou para as novas instalações em 1933, passando a chamar-se Liceu Feminino Maria Amália Vaz de Carvalho. O nome é um tributo à famosa prosadora, poetisa e ativista feminina. Este novo edifício foi desenhado pelo famoso arquiteto Miguel Ventura Terra, responsável por projetos como o Liceu Luís de Camões, o Liceu Pedro Nunes, o Teatro Politeama e a Sinagoga de Lisboa..De acordo com a Portaria 610/2020 do Diário da República, "para além de manter a sua vocação educativa, o imóvel conserva ainda quase intacto o programa arquitetónico original, bem como um importante acervo de mobiliário, arquivos documentais e fotográficos, a coleção de instrumentos científicos dos laboratórios de Física e Química, e os espaços dedicados a Geografia e História, onde se conserva diversa cartografia, e a Biologia-Geologia, incluindo o depósito de Geologia e Mineralogia"..Ainda segundo a portaria, o projeto da autoria de Miguel Ventura Terra, com algumas alterações de António do Couto de Abreu, "apresenta um modelo construtivo simples e funcional, denotando clara influência dos modelos franceses dos Lycée, e constituindo, pela sua racionalidade e amplitude, um caso exemplar das construções escolares femininas"..Maria de Fátima Lopes chegou ao cargo de diretora do Liceu Maria Amália em 2012 e um dos primeiros objetivos que estabeleceu foi precisamente tentar a classificação como monumento de interesse público. "Especulava-se que existia uma conspiração para a escola ser vendida, dizia-se que havia poucos alunos... enfim, não se anteviam tempos fáceis, mas para mim não fazia sentido que este liceu não estivesse classificado como monumento público, como naquela altura já sucedia, por exemplo, com o Liceu Pedro Nunes e o Liceu Camões, por exemplo. Entreguei a documentação necessária para fazer esse pedido e o processo foi bastante longo, mas ao fim de oito anos chegou o reconhecimento merecido", sublinha..A diretora enaltece as duas pessoas que considera terem sido decisivas para que fosse possível a classificação do edifício como monumento público. "Quero realçar o extraordinário trabalho que foi feito pelo professor Amaro Silva e pela professora Fátima Abraço na reunião de todo este património. O mérito é todo deles e eu apenas lhes permiti que tivessem o tempo suficiente para se dedicarem a esta tarefa. E a verdade é que foram horas e horas de trabalho minucioso de recolha e catalogação do património, com seleção de mapas, reunião de artigos, etc". Refira-se que estes dois professores reformaram-se no ano passado, recebendo poucos meses depois a recompensa oficial pelo árduo trabalho que tiveram..O DN teve direito a uma visita guiada da diretora por todo o (enorme) espaço interior e exterior da escola. Começámos pela sala dos professores, que à entrada ainda tem uma placa com a inscrição "Gabinete das Professoras", pois antigamente, para além das alunas, todo o corpo docente era feminino..Todo o mobiliário é original e os laboratórios de Física e de Química possuem um impressionante espólio de animais embalsamados e utensílios muito antigos, que ainda são utilizados pelos alunos, à exceção deste período de pandemia. Destaca-se ainda o Museu de Biologia e Geologia e uma enorme biblioteca, com mais de 30 mil livros das mais variadas épocas históricas. As aulas de Educação Física realizam-se em dois ginásios e dois campos exteriores..Um dos locais mais emblemáticos deste grande edifício é o Salão Nobre que, como todas as salas, conserva o seu traçado original. "É aqui que se realizam palestras com convidados, a festa de aniversário da escola, a 2 de fevereiro e a festa de finalistas do 12º ano, com a bênção das fitas e celebração da Eucaristia. Infelizmente, devido à pandemia, não tem sido muito utilizado, mas esperamos que em breve tudo volte ao normal", refere Maria de Fátima Lopes. Existe ainda uma pequena capela, com a porta aberta a alunos, professores e funcionários. "Só pedimos que não acendam as velas, pois há uns tempos houve aqui um incidente...", atira a diretora..Maria de Fátima Lopes explica que as paredes exteriores do edifício foram pintadas há 20 anos, mas uma intervenção interior tem ficado adiada. "É algo que terá de ser feito a breve prazo, mas será uma obra gigantesca e muito dispendiosa. Já iniciámos conversações com a Câmara de Lisboa a esse respeito", diz..A Escola Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho preserva um impressionante espólio antigo, mas a tradição fica à porta das salas de aula. Isto porque a sua diretora garante a grande modernidade do ensino, que segue o Plano de Inovação Curricular..A escola acolhe 1250 alunos (960 no horário diurno e 290 no horário noturno). "Uma vez que só temos alunos do secundário [n.d.r: entre o 10º e o 12º ano] o nosso objetivo era tornarmo-nos numa escola-piloto tendo em vista a preparação para o ensino universitário", realça..Foi nesse sentido que foram estabelecidos protocolos com algumas universidades, cujos professores podem realizar estágios no Maria Amália, nomeadamente de Geografia, História e Belas Artes. E os alunos têm à disposição dois cursos profissionais: Técnico de Apoio à Gestão Desportiva e Técnico de Restauração. Este último numa parceria com a Escola de Hotelaria do Chiado, com a teoria a ser lecionada no Maria Amália e as aulas práticas na escola de hotelaria..A escola tem ainda um protocolo com os estabelecimentos prisionais de Monsanto e de Campolide, que permite aos seus professores lecionarem nestes locais. Outra particularidade foi a abolição dos tradicionais três períodos letivos. No Maria Amália a divisão é feita apenas em dois semestres..A Escola Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho foi criada em 1885, com a designação de Escola Dona Maria Pia, e as primeiras instalações foram em Alfama, no Largo do Contador-Mor. Logo na fundação passou a estar direcionada para o ensino feminino. Os seus primeiros cursos foram lavores, tipografia, telegrafia e escrituração comercial. Em 1906, a escola passou ao estatuto de liceu feminino, por decreto do rei D. Carlos..O liceu mudou-se para o Palácio Valadares, no Largo do Carmo, no Chiado, em 1911. Cresceu de forma sustentada e em 1917 passou à categoria de Liceu Central, podendo ministrar cursos complementares, por decreto de Sidónio Pais. Nessa altura, mudou o nome para Liceu Central de Almeida Garrett..Em 1933, passou a ocupar as instalações atuais, na rua Rodrigo da Fonseca e passou a chamar-se Liceu Feminino Maria Amália Vaz de Carvalho, em homenagem à famosa escritora ativista feminina. Após o 25 de Abril de 1974, a escola deixou de ser exclusivamente feminina e mudou a designação de liceu para escola secundária..Atualmente acolhe alunos das mais variadas proveniências, apresentando uma multiculturalidade que é uma das suas imagens de marca.