A Lei de Bases da Saúde, o Estatuto do Ministério Público, a gestação de substituição ou uma alteração ao Regime Jurídico das Custas Judiciais são alguns dos 59 projetos de lei, 19 propostas de lei do governo e 90 projetos e propostas de resolução, num total de 170 diplomas que serão votados nesta sexta-feira na Assembleia da República, numa maratona que se mede, para já, em 110 páginas do guião de votações..Os deputados têm um último plenário antes das férias do verão para arrumar a casa em matéria de projetos de lei, propostas de lei do governo e propostas e projetos de resolução. E há ainda lugar a votos de pesar, condenação e louvor, alguns que se repetem, num total de dez. É um verdadeiro camião legislativo que segue depois para Belém, para o Presidente da República ler, analisar e depois decidir-se pela promulgação ou pelo veto..Antes das votações, há 12 pontos inscritos na agenda, que se iniciam pela leitura da mensagem do Presidente da República sobre a devolução sem promulgação da lei que regula o lóbi e o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito à Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e à Gestão do Banco. Tudo isto promete prolongar a sessão eventualmente até às 17.00, num dia em que os trabalhos arrancam logo pelas 09.00..No guião não escrito da sessão antecipa-se uma das imagens desta legislatura que agora chega ao fim: não só a esquerda voltará a unir-se numa proposta emblemática, como a Lei de Bases da Saúde, que depois de tantas guinadas acabou por ser acordada pelos partidos da geringonça, como na legislação laboral funcionará outra geometria na hora das bancadas se levantarem: PS e PSD devem travar as propostas do Bloco de Esquerda e do PCP para alterar o Código do Trabalho, como aconteceu nas votações indiciárias na comissão, e esse antigo arco de entendimento deve fazer passar as propostas do governo nesta matéria..Com os votos à esquerda a viabilizarem uma nova Lei de Bases da Saúde, resta saber o que fará Marcelo Rebelo de Sousa. O Presidente da República já admoestou em público uma maioria conjuntural que feche a porta à participação do setor privado na gestão de estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde (as parcerias público-privadas), mas PS, BE e PCP remeteram para um futuro próximo - depois das eleições - uma decisão sobre as PPP, permitindo então o voto da geringonça a favor desta nova lei..O primeiro-ministro, António Costa, diz-se confiante na promulgação da lei, garantindo que o Presidente da República tem todas as condições para a viabilizar, uma vez que não é ultrapassada nenhuma das linhas vermelhas estabelecidas por Marcelo..O destino das pontas dos cigarros.Noutra geometria diferente, o Estatuto do Ministério Público será aprovado pelo PS, PCP e CDS. O PSD votará contra e o Bloco de Esquerda mantinha as opções em aberto..Outros projetos de lei que irão a votos passam por um do PAN que "regulamenta o fim que deve ser atribuído às pontas de cigarros" ou outro do PEV que "determina a necessidade de alternativa à disponibilização de sacos de plástico ultraleves e de cuvetes de plástico nos pontos de venda de pão, frutas e legumes". E há uma freguesia que vai mudar de nome e outras duas que querem ver alterados os seus limites territoriais..É um contínuo puzzle de votações, que se refletirá também nos 90 projetos e propostas de resolução, recomendações sem força de lei, em que cabem também uma miríade de iniciativas: da necessidade de "recuperar a profissão de guarda-rios, na preservação e fiscalização dos recursos hídricos" (sugerida pelo PAN e PEV) ao pedido de uma "auditoria independente ao Novo Banco relativa ao período pós-resolução", feito pelo PSD. Já o PCP e o PAN recomendam ainda ao governo que estude a introdução da sesta na educação pré-escolar..PCP e PAN mordem-se nos votos de condenação.O grupo parlamentar do PCP apresentou um voto de condenação com um alvo claro: o PAN. E o deputado único deste partido devolve com outros dois votos de condenação do regime chinês em matéria de direitos humanos que, por norma, incomoda (e merece o voto contra da bancada comunista)..Desde as eleições europeias, nas quais o partido de André Silva subiu até aos 5% de votos (perto dos 6,2% da coligação de comunistas e ecologistas) que o PCP tem acelerado um discurso crítico do PAN, recordando a luta ambientalista que o partido abraçou na sua coligação com Os Verdes. Agora, um mês depois de uma deputada do PAN na Moita ter promovido uma moção pela "proteção dos equídeos" daquele concelho da margem sul do Tejo, com afirmações xenófobas sobre a comunidade cigana, o PCP promove um voto de condenação "pela atitude discriminatória e xenófoba assumida por uma representante do PAN"..A deputada municipal demitiu-se na altura, o PAN aceitou a sua demissão e a ex-deputada até apresentou um pedido de desculpa à comunidade cigana. O PCP não se comoveu e o texto dos comunistas não podia ser mais claro: "É particularmente revelador que a eleita do PAN tenha utilizado propostas apresentadas pretensamente em nome do bem-estar animal para sustentar posições de discriminação e xenofobia contra uma comunidade humana, no caso a comunidade cigana.".André Silva devolve com dois votos de condenação para incomodar o PCP: um de "de condenação pela repressão e perseguição aos cristãos e católicos na China" e outro "de condenação pela perseguição aos uigures pela China". O PAN pede ainda a condenação da Guiné Equatorial, por este país-membro da CPLP manter e aplicar a pena de morte - mas uma maioria parlamentar não deverá beliscar a diplomacia portuguesa..Noutros votos, a unanimidade será uma certeza: no louvor à seleção de hóquei em patins, pelo título mundial, e na congratulação pelo reconhecimento de três novos locais patrimónios da UNESCO (Santuário do Bom Jesus em Braga, Palácio Nacional de Mafra e Museu Nacional Machado de Castro em Coimbra). Mas nem aqui houve entendimento entre bancadas: PCP e PS apresentam dois votos pelo hóquei e CDS e PS dividem-se no louvor patrimonial. Está garantida a maratona.