Manifestação de polícias. PSP impõe tolerância zero contra a violência
Poucas manifestações de polícias mereceram tanta atenção e preocupação da parte das autoridades como a que se vai realizar nesta quinta-feira. Apesar de organizada pelas duas maiores estruturas sindicais da PSP e da GNR, o nível de risco agravou-se com a adesão do Movimento Zero, uma estrutura de polícias anónimos, que tem atraído apoiantes ligados à extrema-direita entre os mais de 53 mil seguidores no Facebook.
No comando da PSP de Lisboa, o planeamento da operação para esta manifestação, que teve início no Marquês de Pombal, começou a ser pensado há várias semanas. Todo o efetivo do Corpo de Intervenção e das Equipas de Intervenção Rápida ficou sem folgas e férias neste dia para reforçar o policiamento.
"Um dispositivo que só tem paralelo com o das manifestações do período da troika e dos protestos das forças de segurança de 2014 e 2017", sublinha ao DN fonte policial que está envolvida nas operações. Todos os operacionais destacados têm ordens para, ao mínimo sinal de desordem, cercarem e afastarem os responsáveis. "Será tolerância zero contra qualquer sinal de violência", confirma a mesma fonte.
Ontem à tarde, as escadarias do Parlamento, junto das quais está marcada a concentração às 16.00, já estavam "blindadas" com grades e blocos de cimento em alguns acessos. A PSP tem também preparados drones e as equipas de pilotagem estão a postos na sala de comando.
Nesta quinta-feira, 21, faz precisamente seis anos que uma manifestação de polícias, com os mesmos sindicatos na organização, acabou com uma violenta e descontrolada invasão de escadarias do Parlamento.
Nas últimas semanas, tanto as secretas como a própria PSP têm monitorizado avidamente as redes sociais à procura de detetar sinais de promoção de violência - um cenário que é admitido como possível nos relatórios das autoridades.
Nos últimos dias, tentando fazer uma contenção de danos, o Movimento Zero tem-se desdobrado em apelar à "responsabilidade" dos participantes e que obedeçam às orientações dos organizadores, sublinhando que "é obrigação de todos os polícias fazer cessar de imediato qualquer tipo de ato impróprio".
Mas vai ainda aparecendo quem se manifeste inquieto. "Vai ser uma procissão de anjinhos e não vai criar impacto nenhum na Europa ou até no mundo. Falta dizer para não esquecerem o garrafão e a guitarra para cantar o fado. É mais uma manifestação para justificar a quota que se paga durante o ano aos sindicatos", escreve um Carvalho Jorge no site do M0. Responde um Luís Filipe: "Carvalho Jorge, meu caro, vai ser algo que ninguém está à espera, vai ser algo, com o devido respeito, superior aos 'secos e molhados'. Eles vão ter orgulho em nós. M0 sempre."
Da parte da organização, liderada pela Associação Sindical de Profissionais de Polícia (ASPP) e pela Associação de Profissionais da Guarda (APG) - os sindicatos mais moderados -, todas as cautelas são poucas. Pela primeira vez criaram um dispositivo próprio de segurança para percorrer o desfile e ir avaliando a situação.
"Na verdade, a adesão do Movimento Zero preocupou-me mais inicialmente, mas nesta fase, depois de termos falado com alguns elementos e terem também demonstrado vontade de cumprir as nossas regras, estamos mais tranquilos. Ninguém quer que alguma coisa corra mal e perder o apoio que temos tido de milhares de cidadãos", sublinha Paulo Rodrigues, presidente da ASPP, lembrando que têm recebido contactos de várias classes profissionais, "como bombeiros, professores, enfermeiros, que também querem estar presentes".
Paulo Rodrigues reconhece que "há sempre o risco, como em qualquer outra manifestação, de alguma coisa correr mal, mas seria totalmente inconsequente, com a quantidade de polícias que ali estão dispostos a resolver logo o assunto".
Foi difundido um conjunto de normas rígidas para os participantes: usar T-shirts brancas, ou só com palavras de ordem relativas às reivindicações, não serem exibidos símbolos partidários, nem ser feita apologia de ideologias políticas. O Movimento Zero, porém, está a vender T-shirts com o seu símbolo.
"Há sempre quem se queira infiltrar e criar problemas", admite também o presidente da APG, César Nogueira. "O que mais queremos é uma manifestação muito participada. Interessa ir com a razão e sair com a razão", assinala.
"Esta manifestação é de polícias e aberta a todos os cidadãos que apoiam as forças de segurança, mas apela-se ao bom senso e responsabilidade de todos para que não tenham atitudes que coloquem em causa o trabalho dos polícias que estão de serviço, que não criem situações de alteração de ordem pública, que ponham em causa a segurança das pessoas ou que aproveitem esta iniciativa para fins que atropelem, desacreditem ou comprometam os seus verdadeiros motivos ou a condição policial dos profissionais da PSP e da GNR. Cada um é responsável pelos seus atos", avisa em comunicado a organização.
A ASPP e a APG apelaram também a que os partidos ou deputados que já se solidarizaram com o protesto, mantenham esse apoio "exclusivamente nos debates e na pressão política dentro da Assembleia da República e das autoridades responsáveis".
No entanto, o Movimento Zero ignorou esta nota e, numa atitude de claro desafio, dirigiu um convite direto aos partidos com representação parlamentar "para participar na manifestação organizada pelas forças de segurança", juntando-se a ela, junto às escadarias da Assembleia. Acrescentam que "a manifestação não terá como objetivo a confrontação política, religiosa ou racial".
O partido que tem demonstrado apoio público ao Movimento Zero é o Chega - André Ventura já usou publicamente a pulseira do movimento.
Paulo Rodrigues não esconde o desagrado com a iniciativa. "Não o deviam ter feito", assevera, não acrescentando mais comentários.
Com o lema "Tolerância Zero - Tempo de Agir", a manifestação começa às 13.00 no Marquês de Pombal e ruma à Assembleia da República, com concentração marcada para as 16.00.
Apesar de o ministro da Administração Interna (MAI) ter reunido na quinta-feira passada com os sindicatos mais representativos da PSP e na segunda-feira com a APG/GNR, as estruturas decidiram manter o protesto, por ainda não estar definido um calendário para a resolução rápida dos problemas, apenas uma agenda de reuniões negociais.
Entre as reivindicações que motivaram o protesto, e além dos aumentos salariais, está também a atualização dos suplementos remuneratórios, que "há mais de dez anos que não são revistos", o pagamento de um subsídio de risco e mais e melhor equipamento de proteção pessoal. Os polícias exigem também uma fiscalização das condições de higiene, saúde e segurança no trabalho e que seja cumprido o estatuto na parte referente à pré-aposentação aos 55 anos.