Índia: 69.º dia da República
No 69.º aniversário da República da Índia, a comemorar no dia 26 de janeiro, é oportuno recordar factos representativos do que a independência conseguiu para o povo indiano e o que ainda está para vir. E pensar nos travões que podem surgir para alcançar os objetivos de crescimento e inclusão social.
Algo importante se fez no âmbito da criação da riqueza e no desenvolvimento da população: instrução generalizada; crescente acessibilidade aos cuidados de saúde, que tem de intensificar para chegar aos 100%; uma agricultura pujante que alimenta a sua gente, permitindo exportar mais de 20 milhões de toneladas de cereais por ano; um enquadramento industrial atraente para investimentos; uma imponente base de produção de fármacos a preços imbatíveis; destacada posição em TI e serviços facilitados pelos TI; um eficaz hub para a I&D, com mais de 1100 multinacionais ocupando milhares de cientistas locais cada uma; lançamento e colocação em órbita a baixo custo de satélites de comunicações, meteorologia e outros fins...; uma boa infraestrutura para acolher o turismo, sobretudo o da saúde. A Índia tem um invejável conjunto de especialistas em altas posições no mundo nos campos da medicina, da engenharia, de management, de IT, etc., em particular nos EUA.
Apesar das muitas conquistas, é chocante que uma fração significativa dos cidadãos viva em condições infra-humanas...; uma percentagem elevada de crianças subalimentadas; parte importante de mulheres grávidas anémicas; e uma elevada mortalidade infantil.
Dentro da ampla diversidade da população - racial, religiosa, social, linguística, de pigmentação da pele...-, a Índia segue um caminho de unidade cada vez mais forte, com liberdade para pensar e viver de acordo com as convicções, praticando a sua religião, seguindo os seus princípios norteadores. A Constituição protege a diversidade, que acaba por fortalecer a unidade, em paz, no progresso: a Índia é, pois, um grande espaço de liberdade onde cada um potencia as suas capacidades para as pôr ao serviço da sociedade inteira.
Enfrentar e discutir divergências é a melhor maneira de defender a paz. Quando há atritos e confrontos, a destruição é inevitável e todas as partes sofrem e perdem. Por isso, a sociedade civil e os governantes procuram o bem da população no diálogo democrático. Já basta o sofrimento da negra era colonial, com consequências que ainda perduram!
O espírito pacifista da população indiana respeita e assume as regras do jogo político, que fortaleceram ao longo dos anos da independência uma saudável convivência. Ela respeitou as diferenças e foi a aglutinadora do país.
O atual governo será, provavelmente, dos mais bem preparados para dirigir um país da complexidade da Índia. Definiu os grandes planos de ação; afirmou uma presença digna da Índia no contexto mundial; tratou de dar realidade a múltiplos projetos, com objetivos e metas para a criação de riqueza. Um bom número de medidas centrou-se na erradicação da pobreza, num prazo realista: proporcionando uma habitação digna e garantindo rendimentos suficientes; tendo o país todo eletrificado, incluindo as aldeias remotas.
A pressa de fazer, sempre tão importante, pode ter efeitos de atraso no crescimento, como a demonetization (troca de notas de grande valor) feita para combater a corrupção mas que paralisou a atividade das pequenas e médias empresas; antes que o país recuperasse desse golpe veio o GST, taxa única no país para a transação de bens e serviços, medida importante e ótima, mas que mais afrouxou a atividade económica no imediato. Sem dúvida medidas bem-intencionadas, talvez sem a devida preparação nem previsão dos seus impactos, mas assumidas com coragem.
Quando, apesar do esforço, ele não é reconhecido ou não dá os resultados esperados, pode ser tentador deixar passar atritos, não defendendo o direito para desviar as atenções, como faria um governante medíocre. Mas os desaires, como a descida nas urnas, ajudam a ser mais humilde, a tirar lições para fazer o que o país necessita - sem extravasar as atribuições com aspetos de ideologias ou restritivos -, como faz um bom governante.
Felizmente sempre houve sensatez para lutar pela paz a todo o custo na Índia. É com base na paz que se atacam todos os problemas. Bem lembrava o nobel Venkatraman Ramakrishnan: "All this sectarian squabble about who eats what kind of meat and all this religious antagonism between different groups is harmful to the country." Estes parecem temas insignificantes, mas o cidadão quer ser respeitado nas suas opções e privacidade.
*Professor e dirigente da Associação Amizade Portugal-Índia