O Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN), que integra os hospitais de Santa Maria e Pulido Valente, suspendeu esta semana a atividade cirúrgica não urgente e prioritária, não sabendo quando a retomará. "Tudo depende da evolução da pandemia", afirmou ao DN fonte da administração. O Hospital Garcia de Orta (HGO, em Almada) contratualizou este mês a utilização de blocos operatórios de unidades privadas para os seus cirurgiões poderem continuar a trabalhar, estando a fazer tudo para manter os cuidados aos doentes não covid. .O Hospital Beatriz Ângelo (HBA), em Loures, espera luz verde da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT) para que os seus médicos também possam começar a operar estes doentes nas unidades do Grupo Luz-Saúde. O objetivo é não suspender de todo a atividade cirúrgica programada..O Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (CHULC), que reúne seis hospitais, São José, Santa Marta, Curry Cabral, Capuchos, D. Estefânia e Maternidade Alfredo da Costa, ainda não teve necessidade de cessar radicalmente a atividade cirúrgica não urgente, mas já o fez episodicamente e para gerir sobretudo camas das Unidades de Cuidados Intensivos (UCI)..No Hospital Fernando Fonseca, mais conhecido por Amadora-Sintra, o cenário não diverge muito do de outros hospitais, mas, neste momento, ainda não tiveram de suspender a cirurgia não urgente. "Foi pedido esta semana aos diretores de serviço que definam as cirurgias urgentes e que reprogramem as não urgentes, mas ainda não houve um cancelamento efetivo", disseram ao DN..DestaquedestaqueAté ontem Portugal contava com 249 498 casos de infeção pelos SARS CoV2 e 3762 mortes..O Amadora-Sintra, que tem na totalidade 635 camas distribuídas por enfermarias de medicina e de cirurgia, para uma área de influência com mais de meio milhão de habitantes, encerrou esta semana 30 camas em enfermaria por "não haver capacidade em recursos humanos para as assegurar"..Neste momento, têm 77 doentes covid em enfermaria e 13 em UCI, mas a sua capacidade estende-se até às 90 camas em enfermaria. "A oferta é elástica e vamos abrindo ou encerrando camas conforme as necessidades. Estamos a fazer tudo para que, em relação aos doentes não covid, todas as situações sejam resolvidas dentro da própria unidade. Dos seis blocos operatórios da unidade, só um parou, todos os outros continuam a funcionar", sublinha fonte ligada à administração..Aliás, "a atividade ambulatória, consultas externas, exames, hospitais de dia mantém-se e estamos a libertar camas e equipas dentro do hospital com a abertura da Unidade de Hospitalização Domiciliária, que já está a tratar 18 doentes". Em dezembro, está previsto que esta unidade abra nova urgência, com 25 camas, mas para tratar covid-19. .Em Cascais, a resposta enviada ao DN, o hospital assume que, em função da resposta aos doentes covid-19, articulada com as necessidades da região, terá contingências na resposta aos doentes não covid e em atividade programada", mas que está "garantido o atendimento a todos os doentes urgentes". O hospital diz estar em conjunto com a ARS de Lisboa e Vale do Tejo a tentar "encontrar uma solução para garantir o atendimento aos doentes não covid". O DN contactou ainda o Hospital de Setúbal mas não obteve qualquer resposta..Destaquedestaque O planeamento falhou na gestão da segunda vaga, argumentaram ao DN. O próprio primeiro-ministro já o assumiu..Mas o cenário é idêntico em todas as unidades da Grande Lisboa, a região com maior densidade populacional do país, numa altura em que o Norte ainda está sob pressão e com uma prevalência de infetados por 100 mil habitantes muito elevada. O planeamento falhou na gestão da segunda vaga, argumentaram ao DN. O próprio primeiro-ministro já o assumiu..Está aprovado novo estado de emergência até 8 de dezembro e, depois, "logo se verá". Quem está no terreno diz que a curva de transmissão irá manter-se ascendente e nos hospitais arranjam-se soluções para não se deixar os doentes não covid para trás. Até porque, os alarmes continuam a soar sempre que o Instituto Nacional de Estatística (INE) atualiza o número de mortes durante o período da pandemia, indicando haver mais quase oito mil do que no período homólogo dos últimos cinco anos. Destes, a maioria morreu fora do contexto hospitalar..As falhas começam a ser referidas. "Só começámos a ouvir falar de modelos de gestão e de planeamento no final de setembro princípio de outubro", referiu Artur Vaz, administrador executivo da Sociedade Gestora do Hospital de Loures. Quando se sabia e foi sobejamente referido por médicos, especialistas e outros que "os recursos do SNS eram limitados", que se deveria ter "acelerado a contratação de profissionais" e que "não se podia ter deixado sair os profissionais que viram os seus contratos caducar". Agora, já com as Unidades de Cuidados Intensivos (UCI) no limite, o que vem a seguir "é o preço que a sociedade tem a pagar pelo sistema que temos"..Para um médico o lema é sempre o mesmo: "Todos os doentes têm de ser tratados." "Não há nenhum médico de medicina intensiva que deixe de tratar um doente não covid para tratar um doente covid. Esse critério não existe", diz o médico João Ribeiro, diretor do Serviço de Medicina Intensiva do Hospital de Santa Maria. Mas há uma certeza: tal acontecerá "à custa do esforço dos profissionais"..Na primeira fase da pandemia, o Governo decretou o cancelamento da atividade não urgente e pediu aos portugueses que só fossem aos hospitais no caso de ser uma situação urgente, e os doentes não covid desapareceram. Os médicos alertam: "Não podemos chegar à mesma situação, porque quando os doentes começaram a cá chegar já vinham em estado grave.".Neste momento, há hospitais que já sentem uma redução na afluência às urgências e mais faltas a consultas e a exames. O que faz o administrador executivo de Loures sublinhar um facto: "As pessoas têm de perceber que é mais seguro ir ao hospital do que ir às compras, e que se vierem ter connosco serão tratadas." O gestor diz mesmo que uma das preocupações em relação à área que a sua unidade serve tem a ver com a redução na referenciação de doença oncológica em cerca de 40% por parte dos cuidados primários, desde o início da pandemia. "É uma redução significativa e eles são o primeiro contacto com a comunidade. Se os doentes não nos são referenciados ou os apanhamos numa ida à urgência, então serão tratados muito tarde". Tanto neste hospital como em todos os outros do país, a atividade na área da oncologia mantém-se por ser considerada urgente e prioritária..Esta semana, e com a previsão de que o pico da pandemia possa ser alcançado nas próximas, e com a antevisão de que o número de concelhos ao abrigo de medidas restritivas possa aumentar, atualmente inclui 191, o Ministério da Saúde publicou um despacho a permitir às unidades a não autorização de gozo de férias dos profissionais, tendo em conta as necessidades..Mas do gabinete de Marta Temido já tinha saído a 3 de novembro um despacho a autorizar a suspensão da atividade programada não urgente, sempre que fosse necessário para dar resposta à covid-19. No decreto do estado de emergência que termina segunda-feira, já se definia protocolos com o setor privado, social e cooperativo para apoio à resposta à pandemia..Ontem mesmo, o Parlamento aprovou o decreto do Presidente da República em que se prolonga o estado de emergência de 24 de novembro a 8 de dezembro, e onde se limita "a saída de profissionais do SNS com contratos a terminarem". Medidas que de uma forma ou de outra tentam atenuar a falta de recursos humanos no Serviço Nacional de Saúde (SNS), que "é a razão fundamental que está a levar à suspensão de atividade programada, à suspensão de férias e à mobilização de profissionais de uns serviços para os outros", explicou João Ribeiro..O CHULN foi o primeiro dos grandes hospitais da Grande Lisboa a decidir pela suspensão da atividade cirúrgica não urgente, e sem data de regresso. No entanto, mantém-se "toda a atividade em hospital de dia, consultas, cirurgia de ambulatório", mas a pressão de doentes covid e a falta de recursos humanos levou a administração a esta decisão..O diretor do Serviço de Medicina Intensiva, um dos que está sob pressão, afirmou ao DN que "a necessidade de suspensão de alguma atividade tem a ver com aquilo que é a complacência limitada e finita do nosso sistema de saúde", argumentando que "o aumento de capacitação de resposta quer na urgência, na medicina, nas áreas de doença crítica, como a medicina intensiva, passa necessariamente pelo aumento do tempo de disponibilidade dos profissionais". Não há que enganar, "a aritmética é simples". "Falo pela medicina intensiva, mas acontece o mesmo nas outras áreas, o aumento de capacidade de resposta assistencial está associado à disponibilidade adicional dos profissionais. Os médicos de medicina intensiva não só duplicaram a sua disponibilidade em presença efetiva no hospital como já tiveram de prescindir do gozo de férias. Esta foi a primeira medida, que teve de ser assumida pelas direções de serviço, para se aumentar a capacidade de resposta assistencial"..Destaquedestaque "É o preço que temos a pagar por aquilo que é a expressão absolutamente inexorável da pandemia.".Mas até esta hipótese se esgota "numa primeira ou segunda fase, porque tem um fim na impossibilidade de se poder continuar a pedir mais responsabilidade aos profissionais e presença efetiva". Para esta situação, o hospital tem vindo a arranjar outras soluções, como a mobilização de profissionais de outras áreas, "mas com habilitações passíveis de poderem exercer, para a medicina intensiva". Uma situação que é recorrente também nas outras unidades. Aliás, João Ribeiro argumenta que quando se "coloca em perspetiva suspender alguma atividade programada ela não resulta de outro fator que não seja o da falta de recursos humanos", acrescentando: "É o preço que temos a pagar por aquilo que é a expressão absolutamente inexorável da pandemia." Neste momento, "há uma realidade que não estamos a conseguir controlar, que é a transmissão comunitária, e o sistema tem de de ter esta resposta adaptativa, mas que também tem limites"..O médico de Santa Maria concorda com os colegas que defendem que "a solução para a pandemia não está no aumento da capacitação dos serviços de saúde", porque "é óbvio que a solução está no controlo da pandemia na comunidade, mas enquanto isso não se faz, não temos outra alternativa senão suspender alguma da atividade programada". Mais uma vez, "é um preço que a comunidade no seu todo está a pagar, mas não há alternativa"..Neste caso, a aritmética também é simples, quantos mais doentes covid, quanto mais camas para estes, menos para os doentes não covid. "Todas as unidades funcionam em harmónio", justificam, "tem de ser assim, não há outra forma", porque os "recursos das unidades são finitos", explicam ao DN. Daí que João Ribeiro reforce que "a receita organizativa é muito importante", o que, para este médico, e como já foi assumido por António Costa, "falhou".."Isto não é uma leitura política, refiro o que já foi assumido pelo primeiro-ministro, mas o facto de não nos termos preparado atempadamente obriga-nos agora a ter um regime de resposta adaptativa completamente diferente daquela que, porventura, poderia resultar se tivéssemos tido planeamento e uma intervenção atempada"..Uma situação que o médico diz: "Deve ser explicada ao cidadão, porque há alguns que tinham a expectativa de serem operados e, mais uma vez, vão ver esse procedimento adiado. O que acontece porque houve um atraso na preparação do sistema". Portanto, "a realidade é um xadrez que temos de redesenhar para podermos responder às necessidades que nos surgem, não no dia de amanhã, mas a cada momento"..DestaquedestaqueNo mundo, o SARS CoV2 já infetou 57,76 milhões de pessoas e já provocou 1,3 milhões de mortes..Sobre o que vem aí, o médico João Ribeiro acredita que "será ainda mais violento", e que tal o obriga a ser "muito explícito" e dizer que "mais do que achar tenho a responsabilidade de preparar o meu serviço para um impacto muito mais violento do que aquele que estamos a viver ao dia de hoje. E se não preparasse o meu serviço para uma resposta adicional, estaria a ser alguém displicente". Porque, argumentou, "a acumulação de doentes não vai cessar e não se vai controlar nos próximos dias a transmissão da doença. A pressão vai continuar nos hospitais. Se há alguém que nos serviços de ação médica entende não haver razões para nos prepararmos para um impacto ainda mais violento, muito honestamente penso que está a olhar para a realidade com uma perspetiva muito otimista e até displicente"..Não nos enganemos, diz o médico. "Mais doentes covid e menos resposta haverá para todos os doentes. Este conceito é importante, o esgotamento progressivo dos recursos vai afetar tanto os doentes não covid como covid"..Fonte da administração do CHLN explicou ao DN que haver neste momento 24 camas em UCI, mas que têm capacidade para abrir mais quatro, até às 28, e ir abrindo até às 38 e, na última fase de contingência, até às 48, mas "esperamos que tal não aconteça"..O Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, tem sido um dos que não tem tido descanso em relação à pressão da pandemia. Neste momento, "estamos a fechar com a ARSLVT a subcontratação de serviços clínicos fora do hospital para doentes não covid, de maneira a libertar os recursos internos para doentes covid", explicou Artur Vaz.."O que estamos a tentar fazer é retirar a capacidade cirúrgica do hospital não a anulando, não a suspendendo, mas fazendo-a fora do hospital, permitindo aos nossos cirurgiões uma subcontratação com o Hospital da Luz e com as suas unidades clínicas de Odivelas, Oeiras e outras, para que operem os seus doentes". .A situação teria de ser aprovada pelo próprio doente, mas é uma das soluções que Loures está a tentar para não deixar os doentes não covid para trás. O acordo seria com o próprio Grupo Luz-Saúde que também gere aquela unidade, uma espécie de sinergia, já que o cenário que antecipam é o de ter "de duplicar as camas de cuidados intensivos, apontando para um aumento que vai até às 30. A nossa capacidade normal é de dez para covid"..Nesta fase, a resposta está em oito camas para covid e seis para não covid, embora "tudo seja muito flutuante". O administrador referiu ainda ao DN que uma das situações que já estão a registar tem a ver com "a diminuição da vinda de doentes ao hospital, não tanto como na primeira fase, em que a afluência parou praticamente", sendo esta uma preocupação..Em Loures, ainda não chegaram ao ponto de suspender as férias aos profissionais, Artur Vaz refere que é uma medida que estão a evitar a todo o custo, para "não prejudicar os profissionais e para isso criámos alguns mecanismos de solidariedade interna. Os profissionais têm estado a responder, permitindo resolver sem grandes dramas as necessidades causadas pela ausência de colegas em férias, folga ou em isolamento". Segundo explicou, o hospital criou uma bolsa solidária de horas onde todas as semanas vão sendo inscritas as necessidades para os dias seguintes e para as quais, de forma voluntária, os profissionais vão inscrevendo-se e aceitando fazer..O Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central, que reúne seis hospitais, não tendo tido ainda a necessidade de cessar as atividades cirúrgicas programadas na totalidade. "Houve situações pontuais, sobretudo para se conseguir gerir camas de cuidados intensivos"..O bloco da cirurgia invasiva, para transplantes, por exemplo, está centralizado no Curry Cabral, mas há um outro bloco especializado em São José que continua a funcionar. Aqui, os profissionais também não têm dúvida de que quanto mais doentes e mais camas se têm de abrir para doentes covid, mais se têm de retirar camas a enfermarias não covid. Este centro hospitalar de Lisboa já está a mobilizar profissionais de umas áreas para outras, para as que estão sob maior pressão, mas esta "tem sido uma situação recorrente desde o início da pandemia e normal", mas ainda não chegou ao ponto de suspender as férias aos profissionais..Em Almada, o Hospital Garcia de Orta (HGO) tem uma nova modalidade desde o início deste mês. Os seus cirurgiões vão poder operar em blocos operatórios de unidades privadas de forma a libertar os recursos hospitalares. Em resposta ao DN, a administração do hospital explica ter contratualizado "a disponibilização de blocos operatórios ao Hospital do SAMS e a Clínica São João de Deus, para serem utilizados pelos cirurgiões", mas desde maio que mantém um acordo com o Hospital da Cruz Vermelha para cirurgias programadas a doentes não covid..Segundo o hospital, está a ser priorizado o atendimento dos casos urgentes, oncológicos e os da Lista de Inscritos para Cirurgia através da produção adicional, até mesmo ao sábado. No entanto, a administração assume que, em harmonia com o artigo 243.º do Código do Trabalho, já suspendeu o direito a férias dos profissionais de saúde com efeitos a partir já desta segunda-feira, 23 de novembro..Na quinta-feira, o HGO tinha um total de 92 utentes covid internados, dos quais 78 em enfermaria, 13 em UCI e um doente em hospitalização domiciliária. Neste momento, está no nível III do seu plano de contingência, o qual previa inicialmente 66 camas em enfermaria e nove em cuidados intensivos. Contudo, argumentam, tal aconteceu por haver "um esforço bastante superior ao que estabelecemos no plano de contingência. Neste momento, temos 85 camas de enfermaria de adultos covid-19"..Em relação à medicina intensiva, a unidade explica que a sua lotação era de 22 camas, oito não covid, oito para covid e seis quartos individuais de pressão negativa, que permitem uma gestão flexível de acordo com as necessidades covid e não covid", mas, na próxima semana, garantiram, esta lotação será anda aumentada em mais três a seis camas..Na mesma resposta, o hospital referia que durante o período de pandemia, a atividade programada "tem sido e continuará a ser avaliada, e ajustada, em função da evolução da situação epidemiológica. Estamos a reavaliar que atividade será priorizada em novembro, face ao aumento do número de casos, sendo absolutamente essencial ter presente que a situação clínica e a assistência aos doentes não covid-19 não pode ser descurada".