Historiador russo da repressão estalinista condenado a 15 anos de prisão por abuso sexual

Yuri Dmitriev foi condenado a 15 anos de prisão por abuso sexual de uma criança. A condenação acrescenta dois anos à sentença proferida em 2020, no mesmo caso.
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O historiador russo Yuri Dmitriev, especialista no estudo da repressão estalinista, foi condenado esta segunda-feira a 15 anos de prisão por abuso sexual de uma criança, num caso que os seus apoiantes denunciaram como político.

Dmitriev, 65 anos, pertence à organização não-governamental (ONG) Memorial, dedicada à preservação da memória das vítimas dos campos de trabalho forçado estalinistas ('gulag') e que enfrenta um processo de extinção.

"Yuri Dmitriev apanhou 15 anos", anunciou a Memorial no seu canal na aplicação de mensagens Telegram, citada pela agência de notícias France-Presse (AFP).

A condenação acrescenta dois anos à sentença proferida em 2020, no mesmo caso.

A sentença foi proferida por um tribunal em Petrozavodsk, na região norte da Rússia, na Carélia, onde Dmitriev dirigia uma filial da Memorial.

A ONG considerou Dmitriev um preso político e denunciou que o verdadeiro motivo do seu julgamento é a "atividade para preservar a memória das repressões políticas" da era soviética.

A Memorial, considerada um dos pilares da sociedade civil russa desde a queda da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), há 30 anos, enfrenta dois julgamentos de extinção separados, por ter sido acusada de ser "agente estrangeiro" (indivíduos ou organizações que, de acordo com as autoridades russas, são financiados a partir de países estrangeiros).

Dmitriev foi detido e acusado em 2016 de pornografia infantil, por ter fotografias nuas da sua filha adotiva.

O historiador assegurou que as imagens se destinavam a acompanhar o crescimento da rapariga e foi absolvido em 2018.

Num segundo julgamento do mesmo caso, foi condenado a 13 anos de prisão, uma pena a que o tribunal acrescentou hoje dois anos.

Para muitas organizações, Dmitriev está a pagar pela sua investigação sobre a extensão da repressão estalinista, uma página da História cuja importância o Kremlin (Presidência russa) tenta minimizar por contradizer o discurso oficial sobre o heroísmo e a grandeza da Rússia, herdeira da URSS.

Dmitriev passou décadas a localizar valas comuns e a exumar os restos mortais das vítimas da repressão estalinista.

Sob liderança de Vladimir Putin, um antigo oficial do KGB, a organização sucessora da polícia política de Lenine e Estaline, o acesso aos arquivos estatais sobre estes assuntos foi drasticamente reduzido e as identidades dos que efetuaram as purgas foram classificadas.

Em 2009, a Memorial, Oleg Orlov, Sergei Kovalev e Lyudmila Alexeyeva foram galardoados com o Prémio Sakharov para a Liberdade de Pensamento pelo Parlamento Europeu.

Numa resolução aprovada no passado dia 16 de dezembro, o Parlamento Europeu condenou as "repetidas perseguições e as recentes tentativas de motivação política das autoridades russas de encerrar as duas entidades jurídicas da organização de direitos humanos Memorial - International Memorial e o Centro de Direitos Humanos Memorial".

Os eurodeputados apelaram também para que fossem retiradas todas as acusações contra a Memorial e para que a ONG tivesse todas as garantias de que podia "continuar a realizar com segurança o seu importante trabalho sem interferência do Estado".

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