Guerra na Síria. Acordo com a Rússia é a "única esperança"

O ex-vice-primeiro-ministro foi um dos convidados especiais de um Fórum mundial, em Marrocos, onde também estava Jesse Jackson, o antigo senador democrata dos EUA
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A guerra na Síria, o bom exemplo da democracia de Marrocos e o futuro do continente africano foram os três temas escolhidos por Paulo Portas, na sua intervenção como guest speaker, no Forum Crans
Montana, em Dakhla que juntou mais de mil decisores africanos e de outros continentes. O ex-vice-primeiro ministro falou no painel, presidido pelo reverendo Jesse Jackson (antigo candidato a Presidente e senador democrata nos EUA ).
Paulo Portas foi muito crítico em relação à Europa, pela forma como avaliou, mal, o papel da Rússia em relação à guerra da Síria e ao consequente crescimento dos terroristas do daesh. "O ocidente, em
geral, e a Europa agiram sem qualquer realismo na questão da Síria", constatou, "há dois anos que o mundo sabe que o presidente Obama não porá 'boots on the ground'.Ou seja, não há qualquer solução militar viável. Donde só há soluções politicas: passam pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas e implicam o acordo da Rússia. O ocidente devia ter percebido muito mais cedo que a única esperança para o fim daquela tragédia era, precisamente, esse compromisso com a Rússia. o
qual é incompatível com vetos a este ou aquele na mesa das negociações. Realisticamente não há outro caminho".
O ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, que tinha na plateia Jaime Gama, também ex-MNE, mas do PS, lamentou que "em vez desse realismo, alguns países europeus" se tenham empenhado "em fornecer armamento a oposição Síria". O resultado, assinalou, sabendo que "há demasiado tempo que a oposição Síria é heteróclita e perigosamente infiltrada por grupos fundamentalistas, com mais de 200 grupos dessa oposição identificados no terreno como tendo ligações a franchises do terrorismo islâmico, dar-lhes armamento é como por o fuzil na mão de quem no dia seguinte liquidará os cristãos ou os judeus ou os alauitas ou simplesmente os moderados islâmicos". Portas lembrou que Portugal foi um dos poucos países europeus a opor-se ao fim do embargo de armas a oposição Síria."Não há os bons de um lado e os maus do outro. Não há inocentes no conflito na Síria. Inocentes só mesmo as vitimas da maior barbárie a que o mundo assistiu neste principio do Sec XXI", asseverou.
"Na origem do drama dos refugiados está a guerra na Síria. Também é na Síria que se treinam muitos dos jovens terroristas que cometem atentados na Europa. As falhas de política externa tem
consequências. Enquanto a Europa enquistava a sua relação com a Rússia no tema da Ucrânia a Síria - com a Rússia como player obrigatório - transformava se num inferno para os seus habitantes e
exportava uma crise sem precedentes para a Europa".
Falando em Marrocos, num evento patrocinado pelo Rei, Portas não perder a oportunidade de destacar o bom exemplo do sistema político daquele país. "Em Marrocos existe um modelo politico singular: o Rei e ao mesmo tempo Comandante dos Crentes. Acresce que Moahmaed VI foi e é um reformador previdente e até visionário : Marrocos não teve de esperar por qualquer ' primavera' porque as reformas foram feitas a tempo - por exemplo a reforma do código de família que dignificou as mulheres é de 2004 - e por isso também não sofreu o caos que se viu e vê na região. O crescimento e o sector privado são muito fortes e isso afasta qualquer país de revoltas e tormentas. Ainda assim, sendo
uma das sociedades mais jovens do mundo - 60% da população tem menos de 35 anos - Marrocos devia constituir uma prioridade europeia", considerou o ex-presidente do CDS.
Quanto a questões mais polémicas, Portas diz que "não devemos envolver-nos em questões sensíveis, mas algo superadas pelo tempo - por exemplo o Sahara Ocidental - devemos antes promover, tanto quanto possível, o diálogo entre Rabat e Argel porque a região e a Europa precisam de estabilidade e não devemos dar sinais errados em matéria económica. Quanto mais comércio com o Magrebe, mais amizade. Quanto mais protecionismo, mais pobreza. E um dia arrependemo-nos de não ter investido no desenvolvimento". "A Europa deve apoiar com nitidez e meios o Estado da região de quem mais se pode dizer que tem paz civil, estabilidade politica, crescimento económico e reformas sociais inclusivas. Esse Estado é o reino de Marrocos e é - nem mais nem menos - o nosso primeiro vizinho na fronteira sul", assinalou.
A finalizar, África, continente que Paulo Portas acredita poder vir a ser "em certo sentido", neste século XXI, "aquilo que a China conseguiu ser no ultimo quartel do Sec XX depois das reformas de Deng
Chiao Ping". Para isso há três condições essenciais: "a estabilidade politica, a segurança jurídica e a abertura económica. Sem estabilidade ninguém investe. Sem segurança ninguém fica. Sem abertura perde se o potencial e a inclusão social não avança. Depende das lideranças africanas dar estas garantias e fazer do seu continente das oportunidades".
O atual vice-presidente da Câmara de Comércio e Indústria lembrou que "para as empresas europeias África e um destino muito interessante na internacionalização".Mas chama a atenção que "não se trata apenas de comprar e vender. As sociedades africanas precisam de tecnologia e é
preciso aceitar transferi-la ; e carecem de parcerias que ajudem a criação de classes médias e empreendedoras, o que alguns países europeus sabem fazer sem paternalismos e percebendo que partilhar o futuro é mais importante do que recordar o passado".

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