Governo prepara quadro legal para permitir voto dos idosos nos lares
O Governo prepara-se para abrir caminho a que os residentes nos lares possam votar nas eleições presidenciais sem que tenham de se deslocar às mesas de voto. O DN sabe que o Executivo está a preparar um instrumento jurídico e os procedimentos eleitorais necessários para proceder à recolha de votos nos lares para todos os idosos que manifestem a vontade de votar nos próximo dia 24.
A decisão final está dependente de que esta possibilidade venha a constar do próximo decreto presidencial a declarar novo estado de emergência, uma renovação que deverá acontecer já esta semana face à necessidade de medidas mais restritivas para evitar a propagação de novos casos de covid-19, que nos últimos dias tem rondado os dez mil casos diários.
A intenção do Governo passa por permitir a recolha dos votos dos residentes em lares dentro do quadro legislativo atualmente existente, dado que qualquer alteração às leis eleitorais seria nesta altura bastante complicada, até pela proximidade das eleições. Acresce o facto de as leis eleitorais serem uma matéria da exclusiva competência da Assembleia da República, o que em nenhuma circunstância pode ser alterado, nem nos decretos de estado de emergência do presidente da República. Por essa razão, em cima da mesa está o cenário de a recolha de votos ser feita à semelhança do que está previsto para as pessoas que estão em confinamento - ou seja tratar-se-á de estender esta prerrogativa, que recentemente foi objeto de uma lei própria, aos residentes dos lares. Cabe agora ao Ministério da Administração Interna, responsável pelo processo eleitoral, encontrar a fórmula precisa que permita o voto não presencial destes eleitores.
A possibilidade de a votação dos residentes em lares ser feita através da recolha dos votos já foi admitida pelo Presidente da República que, em entrevista ao DN e à TSF, disse estar a a envidar esforços para ver se é possível avançar "para um alargamento do conceito de isolamento profilático para cobrir aquilo que no fundo é um isolamento profilático específico daqueles que são utentes nos lares". Marcelo Rebelo de Sousa apontou vários caminhos "que podem ser explorados juridicamente", um deles precisamente através do "decreto presidencial de renovação do Estado de Emergência próximo - ainda anterior ao exercício do direito de voto -, haver a inserção específica desse alargamento".
O mesmo tema foi abordado nas audições dos últimos dois dias em São Bento entre o Governo e os partidos com assento parlamentar, com vários partidos a mostrarem preocupação com o voto dos mais idosos numa altura em que a pandemia atinge os números mais altos de sempre.
Quem também defendeu a solução de um voto não presencial nas urnas por parte dos cidadãos que vivem em lares foi Luís Marques Mendes. Ao DN, o comentador e antigo líder do PSD defendeu que é um "um contrassenso" que os mais idosos tenham de se deslocar aos locais de voto, depois de meses sem poder sair dos lares sem fazer uma quarentena. Defendendo que este é um problema de saúde pública, Marques Mendes disse também que não fazer nada representa um risco para a democracia, na medida em que muitas pessoas nesta situação optarão por não ir votar.
"A abstenção já é um perigo nesta eleição. Para evitar tudo isto, a solução não é os idosos saírem para ir às mesas de voto, mas as mesas de voto irem aos idosos. Dir-se-á que isto não é normal. Bem... nada do que está a acontecer é normal", defendeu Marques Mendes em entrevista ao DN. "Foi este modelo que o governo adotou e muitíssimo bem na vacinação, que é toda a gente vai vacinar-se aos centros de saúde e os idosos são vacinados nos lares. Como o governo fez este modelo de vacinação poderia adotá-lo em matéria de votos e isso seria vantajoso para todos, desde que a ida das mesas para recolher o voto fosse acompanhada pelos representantes das várias candidaturas para garantir que não há manipulação de forma nenhuma", acrescentou.
Este é um problema prático que pode levantar-se e que o Presidente da República também fez menção, sublinhando que "é preciso ver se há capacidade de mobilizar cidadãos" que recolham os votos dos idosos isolados, uma vez que estes "ainda têm de ter um período de quarentena, embora curto".
A possibilidade de recolha dos votos de pessoas em isolamento profilático - à partida, a lei que servirá agora para permitir uma extensão aos utentes dos lares de idosos - estabelece que os eleitores que se encontrem em confinamento obrigatório (decretado pelas autoridades de saúde) podem pedir para exercer o direito de voto antecipado, mediante o registo em plataforma digital disponibilizada pela Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna.
De acordo com a lei, publicada no passado mês de novembro, o voto é depois recolhido por elementos da câmara municipal, acompanhados por representantes das candidaturas presidenciais e elementos das autoridades de Saúde. Os boletins de voto devem ficar posteriormente em quarentena de 48 horas nas embalagens utilizadas para o seu transporte.
Regras que provocaram alguma incerteza entre os autarcas, caso de Rui Moreira, presidente da Câmara Municipal do Porto, que chegou a escrever à Direção-Geral de Saúde a solicitar orientações específicas.