Governo aprova requisição civil de enfermeiros
O governo aprovou esta quinta-feira, em Conselho de Ministros, uma resolução para avançar com uma requisição civil de enfermeiros. O governo justificou esta decisão pelas "situações de incumprimento dos serviços mínimos" na "greve cirúrgica" dos enfermeiros, que decorre desde o final de janeiro e prolonga-se até 28 de fevereiro.
O anúncio foi feito pela ministra da Saúde, Marta Temido, em conferência de imprensa após o Conselho de Ministros, onde afirmou que "face a situações de incumprimento dos serviços mínimos reportados em diversos hospitais" e "sem prejuízo do direito à greve", o governo "não teve alternativa" e optou pela requisição civil.
"Face aquilo que é do nosso conhecimento, de doentes cujas cirurgias foram canceladas e que estavam abrangidas pelos serviços mínimos, face à gravidade da situação não poderia o Conselho de Ministros tomar outra opção", disse.
A Associação Sindical Portuguesa dos Enfermeiros (ASPE), uma das estruturas sindicais que convocou a "greve cirúrgica", já reagiu à decisão do governo. A presidente da ASPE, Lúcia Leite, afirmou à Lusa que "o incumprimento dos serviços mínimos é falso" e avisa o Governo para o risco de surgirem formas de luta "mais incontroláveis" que não sejam suportadas por sindicatos, considerando que os enfermeiros não ficarão serenos face à decisão de requisição civil.
Marta Temido assegurou que a portaria que vai definir o âmbito da requisição civil dos enfermeiros será produzida durante a tarde desta quinta-feira, tendo a sua publicação efeitos imediatos.
"Estando em causa, já nalguns casos concretos de algumas instituições que estão a ser afetadas pela greve, situações que são preocupantes e que revelam incumprimentos, ela será produzida o mais depressa possível, esta mesma tarde, e a sua produção de efeitos é imediata", respondeu Marta Temido aos jornalistas.
A portaria vai definir "o concreto e o respetivo âmbito" da requisição civil, uma vez que a resolução do Conselho de Ministros apenas reconheceu a necessidade de utilizar este instrumento.
Segundo o secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Tiago Antunes, esta requisição vai vigorar "até ao final do período para o qual existe um pré-aviso de greve".
"Na sequência desta resolução que reconhece a necessidade, haverá então uma ou mais portarias que, em função da necessidade e numa lógica de proporcionalidade, delimitarão o âmbito da requisição civil", explicou Tiago Antunes.
Na terça-feira, o primeiro-ministro admitiu que o Governo tomaria todas as medidas "legalmente adequadas" para proteger os direitos dos doentes e acusou alguns sindicatos dos enfermeiros de terem uma conduta cruel em relação aos doentes.
No início desta semana, o Governo pediu ao Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República para se pronunciar sobre a greve, embora tenha garantido acreditar que os serviços mínimos estavam a ser cumpridos.
Uma segunda greve de enfermeiros dos blocos operatórios de sete hospitais públicos às cirurgias programadas começou a 31 de janeiro e foi marcada até final de fevereiro. A partir desta sexta-feira, dia 8, a paralisação passa a abranger mais três centros hospitalares o que faz um total de dez.
A chamada segunda "greve cirúrgica" surgiu depois de uma primeira paralisação idêntica em cinco grandes hospitais, que durou de 22 de novembro a 31 de dezembro, e que levou ao cancelamento ou adiamento de quase oito mil cirurgias.
As duas greves foram convocadas por duas estruturas sindicais, embora inicialmente o protesto tenha partido de um movimento de enfermeiros que lançou publicamente recolhas de fundos para compensar os colegas grevistas que ficam sem ordenado por aderir à paralisação. Ao todo, para as duas greves, recolheram mais de 740 mil euros.
O modelo de greve é considerado inédito em Portugal, não só devido à sua duração como pela criação de um fundo de recolha de dinheiro para financiar os grevistas.
A requisição civil, instrumento que está na lei desde 1974, só deve ser usada em "circunstâncias particularmente graves", tendo sido criada por decreto-lei em 1974 para "assegurar o regular funcionamento de serviços essenciais de interesse público ou de setores vitais da economia nacional".
O diploma expressa, aliás, que a requisição civil tem "caráter excecional" e que pode ter como objeto "a prestação de serviços, individual ou coletiva, a cedência de bens móveis ou semoventes, a utilização temporária de quaisquer bens, os serviços públicos e as emersas públicas de economia mista ou privadas".
Segundo o diploma, a requisição civil não dá direito a qualquer indemnização que não seja o salário ou vencimento decorrente do contrato de trabalho ou da categoria profissional.
Apesar do seu caráter extraordinário, a requisição civil foi já usada diversas vezes para travar greves em empresas de transportes, como CP ou TAP.