Há cinco que anos que O Sol da Caparica se tornou uma espécie de porto de abrigo da música lusófona, onde Portugal, África e Brasil se encontram anualmente, através de estilos tão diferentes como o rock, o samba, o hip-hop, o fado ou a kizomba. Nesta sexta edição, são mais de trinta os artistas (ver caixa) que vão passar pelos palcos do Parque Urbano da Caparica, uma zona verde mesmo junto à praia que também muito tem contribuído para o sucesso deste festival. Como habitualmente, o cartaz junta nomes emergentes e consagrados, oriundos das mais diversas latitudes musicais e geográficas, mas que têm em comum a língua portuguesa..Um dos nomes mais fortes deste ano é o rapper brasileiro Gabriel, o Pensador, de regresso ao Sol da Caparica, onde atuou na primeira edição, para um concerto em que promete "caprichar", como diz em entrevista ao DN, na qual fala da relação especial com Portugal e da "extremada" situação política do Brasil..Depois de algum tempo de ausência, neste ano tem atuado bastante em Portugal, onde continua a ser sempre muito bem recebido... É verdade, tenho mesmo uma relação muito especial com Portugal e o público português. Lembro-me de que em junho, quando vim fazer o concerto de encerramento das Festas de Oeiras, me senti mesmo como que a regressar a casa. Tinha estado um mês de férias na Indonésia, já estava com saudades de atuar ao vivo e foi o sítio certo para voltar a fazê-lo. Quando cantei o Tás a Ver?, que é um tema dedicado a Portugal e não tocamos sempre, tive mesmo de me esforçar para segurar as lágrimas, porque fiquei muito emocionado com a reação do público..Já há sete anos que não edita um álbum, quando é que vai haver um novo disco de Gabriel O Pensador? Para falar a verdade, já não sinto grande entusiasmo com a ideia de gravar um álbum. O mercado da música mudou bastante e neste momento já não é tão importante para um músico gravar álbuns. Aliás, creio mesmo que já nem é preciso. Fazer um álbum implica um longo trabalho de composição e de estúdio que já não é compensado. Acabamos por gravar dez músicas, mas depois só duas ou três é que acabam por ser trabalhadas em termos de comunicação e ao vivo todas as outras são desperdiçadas. Deixou de fazer sentido editar tanta música de uma única vez..É por isso que tem optado, nestes últimos anos, por lançar singles em vez de álbuns? Exatamente, a música chega da mesma forma às pessoas e continua a tocá-las quando assim tem de ser. Quando há três anos lancei o singleFé na Luta, pouco tempo depois recebi uma mensagem de uma fã, no Facebook, a dizer que esse tema lhe tinha salvado a vida. Fiquei curioso e perguntei-lhe porquê e ela contou-me que, devido a uma depressão, estava com pensamentos suicidas, mas que depois de ouvir a música tinha decidido tratar-se. Meses mais tarde acabei mesmo por conhecê-la pessoalmente, num concerto em Palmas, a capital do estado de Tocantins. Cantámos os dois juntos, no palco, foi um momento muito emocionante..E este regresso ao Sol da Caparica, como vai ser? Vou caprichar bastante nesse concerto, não só porque vou ter os meus amigos da Ericeira e de Torres Vedras, com quem costumo surfar em Portugal, mas também por ser um festival onde sempre fui muito bem recebido. Já participei, como artista, mas também já aí estive no público, quando lá fui ver um show do Criolo..Deu-se a conhecer em 1992, com o tema Tou Feliz, Matei o Presidente, dedicado ao então presidente Collor de Mello. Mais de 25 anos depois, como vê o atual momento político do Brasil? Na verdade, em todo esse tempo, não me lembro de um único momento em que estivesse muito contente com a situação política do meu país. O pior, neste momento, é a divisão entre os brasileiros. A situação está muito extremada e o fosso entre as duas partes é cada vez maior. Foi para alertar contra essa situação que, na altura das eleições, lancei o tema Um Só, no qual pedia para não nos deixarmos dividir..Que consequências é que essa divisão tem na sociedade brasileira? Tem conseguido diminuir e desvalorizar causas que deviam ser de todos, como a questão indígena, que deveria ser apoiada por qualquer pessoa sensível e decente, independentemente da sua cor política. Mas hoje qualquer pessoa que fale nesta questão é logo acusada de ser da oposição. Chegou-se ao ponto de as pessoas quase terem medo de falar abertamente, com receio de serem apontadas. Antigamente dizia-se que as paredes tinham ouvidos, mas hoje parece que são os ouvidos que têm paredes. As pessoas já não se escutam umas às outras e mesmo entre amigos, especialmente no que à política diz respeito, a discórdia fala mais alto do que a tolerância e a compreensão..E qual é a solução para isso? Sinceramente, não sei, porque os políticos aproveitam-se dessa animosidade entre as pessoas para alimentar uma situação de ódio e de violência que apenas tem como objetivo continuar a explorar o povo..O SOL DA CAPARICA.Parque Urbano da Costa da Caparica, Almada. 15 a 18 de agosto, quinta a domingo 16.00. 19 € a 60 € (passe)..Dia 15.Anselmo Ralph e Amigos, Benjamim, D.A.M.A, David Carreira, Flak, Kyaku Kyadaff com Rui Orlando, Leo Príncipe (c/ Halison Paixão e Twenty Fingers), Linda Martini, Matias Damásio, Rich & Mendes, Mayra Andrade e Mary N..Dia 16.Seu Jorge, Mariza, Carlão, Luís Represas, Luísa Sobral, Fred, I Love Baile Funk, Jafumega, Diana Lima, The Happy Mess, Lookalike e Dany Silva..Dia 17.Ludmilla, Gabriel, o Pensador, Karetus, Richie Campbell, Boss AC, Capitão Fausto, Força Suprema, RIOT DJ SET, Supa Squad, Mishlawi, Plutónio e Truekey..Dia 18.Mão Verde, O Recreio da Anita e Porbatuka.