Já lá vão mais de 20 anos, desde que Fred Pinto Ferreira se deu a conhecer como baterista, nos saudosos Yellow W Van. À época, a curiosidade tinha mais a ver com o facto de ser filho de Kalú, esse mesmo, o dos Xutos e Pontapés, mas o tempo viria a demonstrar que este filho de peixe não só sabia nadar como podia muito bem voar além da sombra do pai. O seu confunde-se, aliás, com a própria história da música portuguesa dos últimos vinte anos, enquanto membro de bandas como Oioai, Dapunksportif, Os Maduros, Buraka Som Sistema, 5-30, Orelha Negra ou Banda do Mar, neste caso com os brasileiros Marcelo Camelo e Mallu Magalhães. Em paralelo com tudo isto acompanha diversos artistas e também produz discos. Mais recentemente, iniciou também uma carreira a solo, com o álbum O Amor Encontra-te no Fim, editado em 2019, ao qual se segue agora este Series Vol.1 - Madlib, "uma espécie de tributo", como o próprio o classifica, ao rapper e produtor americano Otis Jackson Jr, mais conhecido como Madlib, apresentado pelo músico português como "um decantador do som". Um epiteto que poderia ser também aplicado ao próprio Fred, pelo modo como neste disco se rodeou de um quarteto de "experimentados músicos de jazz" (Eduardo Cardinho no vibrafone, Tomás Marques no saxofone, Márcio Augusto no baixo e Karlos Rotsen no piano e teclados) para desbravar um novo caminho para a sua música, através dos sinuosos atalhos que aproximam o jazz do hip-hop..Depois de já ter passado por tantos universos musicais, chega agora ao jazz... Sempre gostei muito de jazz estou sempre a tentar aprender novas formas de tocar e a explorar novas sonoridades, mas não pretendo ter a arrogância de considerar este trabalho um disco de jazz. Os músicos que trabalharam comigo, sim, têm essa formação, eu não posso ter essa ousadia. Agora, é sabido que o hip-hop e o jazz são primos não muito afastados e é normal que, por vezes, esses dois universos se encontrem em projetos como este, um pouco inclassificáveis em termos de género musical..E como foi então trabalhar com um quarteto de jazz? Foi um processo de comunicação muito fácil, até porque estão todos muito habituados a improvisar. Havia sempre uma conversa inicial sobre os ambientes pretendidos para cada tema e depois foi só deixar fluir a coisa de uma forma natural. Até combinámos deixar acontecer alguns momentos de improvisação, em determinados momentos, para tornar tudo muito mais orgânico. E a verdade é que esse método correu bastante bem, porque o disco ficou gravado em apenas cinco takes..Porque decidiu fazer um disco de tributo ao rapper e produtor americano Madlib? Porque é um verdadeiro decantador do som, cuja obra abrange um universo musical muito vasto e por isso foi desde logo a minha primeira escolha para este projeto..Depois de tantos anos em bandas ou a trabalhar para e com outros artistas, fazer música a solo é um escape ou um refúgio? Um escape não é, porque gosto muito do meu trabalho, tantos nas bandas como com outros artistas, mas é de facto um refúgio e um espaço de liberdade, que me permite fazer a música que tenho na cabeça tal como a penso. Trata-se é de uma responsabilidade um bocadinho diferente, pois sou só eu quem define os caminhos. Até mesmo num disco como este, que foi feito em total parceria com a banda, a última palavra acaba sempre por ser minha..É um projeto para continuar, portanto? Se tudo correr bem, o objetivo é que este disco seja, como o próprio nome indica, o primeiro de uma série dedicada a alguns dos artistas que mais admiro, como o Sun Ra ou Beastie Boys. A ideia é manter esta formação, mas de uma forma aberta, para que possam entrar outros participantes, como aliás já aconteceu neste álbum. Tenho muita vontade que isso aconteça, tal como tenho de voltar a fazer música de uma forma mais autoral, como aconteceu no meu primeiro trabalho a solo..O disco vai ser apresentado ao vivo? Sim, neste momento é esse o nosso foco. Houve um primeiro concerto de apresentação, logo em setembro e agora queremos levá-lo para a estrada no próximo ano, até porque é em palco que estes temas vão amadurecendo e até, de certa forma, direcionando o futuro deste projeto..dnot@dn.pt