Francisco Sá Carneiro

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Assinalou-se nesta semana o aniversário da morte de Francisco Sá Carneiro. Apesar dos quase 40 anos que nos separam desse período, é assinalável a atualidade do seu pensamento.

É verdade que os desafios de um país mergulhado durante décadas no isolamento de uma ditadura são, necessariamente, diferentes daqueles que se impõem a um país democrático, assente num Estado de direito, membro da União Europeia e parte de um mundo e mercado globais. Há, no entanto, desafios que permanecem atuais.

Em primeiro lugar, numa altura em que há cada vez mais quem queira erguer muros, em vez de criar pontes, à boleia dos movimentos populistas, levantando fantasmas, acicatando o medo, fechando fronteiras e fragilizando a democracia, importa recordar palavras de Sá Carneiro em julho de 1974, quando afirmava que "a nossa história ensina-nos que os períodos de grandeza de Portugal são aqueles em que o país está aberto ao mundo e em que os períodos de decadência, e até da perda da independência, coincidem com os períodos de isolamento, que são sempre uma atitude de provincianismo e de insuficiência".

É certo que quem o faz procura explorar as muitas fragilidades que enfermam o país que construímos nas últimas quatro décadas. Continuamos a ter profundas desigualdades e um país dividido. Uma divisão que Sá Carneiro referia ao Comércio do Porto em julho de 1974. "A sociedade que herdámos da ditadura enferma de contradições, tensões e desigualdades gravíssimas: entre os ricos e os pobres; entre os que detêm o poder e os dele dependentes; entre os cultos e os que não têm acesso à cultura; entre os detentores dos meios de produção e os que têm de vender a força do seu trabalho para sobreviver; entre os que vivem nas zonas do litoral industrializado e os que ficaram no vasto interior empobrecido; entre os homens e as mulheres; entre os novos e os velhos; entre os saudáveis e os deficientes; entre os citadinos e os rurais..."

Para a correção destas desigualdades é fundamental a aposta na educação e na saúde de qualidade e de forma universal. Sá Carneiro defendia isso mesmo, por exemplo, numa entrevista ao DN em junho de 1974: "A criação de sistemas nacionais de saúde e ensino que efetivamente funcionem são, portanto, objetivos fundamentais do governo. Isso não significa que tenham de ser afastadas quaisquer hipóteses de colaboração do setor privado, desde que se integre inteiramente dentro dos princípios que, em cada domínio, regem a atividade governamental."

Sem prejuízo dos enormes avanços feitos na escolarização da sociedade portuguesa e com a criação do Serviço Nacional de Saúde, tal como em dezembro de 1978 continuam atuais as palavras de Sá Carneiro quando afirmava que (e cito) "a igualdade de oportunidades, independentemente dos meios de fortuna e da posição social, é cada vez mais um mito, designadamente em setores como a saúde, a habitação e o ensino, em que tudo se degrada a um ritmo alucinante".

Também hoje isto se verifica, quando o atual governo escolhe deliberadamente a degradação dos serviços públicos, das escolas, dos hospitais, contrariando aquele que é o fim da vida política tão bem definido por Sá Carneiro em junho de 1976: "O fim da vida política é prosseguir, sem parar, a libertação da pessoa humana de todas as formas de alienação, opressão e exploração que a degradam à condição de objeto e procurar para homens, mulheres e crianças de Portugal condições para o livre desenvolvimento da sua personalidade e para que possam, em solidariedade, assumir o papel de autores e sujeitos da nossa história."​​​​​​​

E há muitas páginas da história do país que o PSD tem ainda de escrever. Com uma política que, tal como em janeiro de 1980, seja "por natureza humanista no projeto, portuguesa na raiz e europeia na vocação". ​​​​​​​

Presidente da JSD

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