Formação em ciberdefesa atrasada e Ministra não explica porquê

Nas audições parlamentares de Helena Carreiras, uma delas à porta fechada, o investimento em ciberdefesa e os ciberataques contra o EMGFA e o Ministério tiveram destaque.
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O PSD saiu "muito mais preocupado e intranquilo" da audição da Ministra da Defesa Nacional, à porta fechada, que tinha requerido sobre os recentes ciberataques contra o Ministério e o Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA).

Mantendo reserva sobre a reunião, o vice-presidente da bancada social-democrata, Joaquim Pinto Moreira, expressou, ainda assim, ao DN, um sentimento de apreensão por Helena Carreiras não ter dado "resposta cabal que dissipasse as zonas de nebulosa que persistem nesta matéria", sendo "evasiva" e "refugiando-se na informação classificada, mesmo em matérias em que não se justificaria".

Ponto positivo, no entender de Pinto Moreira, foi a Ministra ter "aberto uma janela de oportunidade para o conjunto de iniciativas que o PSD já tinha pensado", de promover debates sobre cibersegurança e ciberdefesa, chamando vários responsáveis da área, como o secretário de Estado da Digitalização, Mário Campolargo, o diretor do Gabinete Nacional de Segurança, contra-almirante Gameiro Marques e o Chefe de Estado-Maior-General das Forças Armadas, Almirante Silva Ribeiro. "A senhora Ministra aceitou como boa esta iniciativa e acreditamos que o PS não inviabilizará", afiançou.

Mas a "preocupação" já tinha começado a crescer na audição anterior, esta regimental e pública, que decorreu também nesta terça-feira.

Os deputados confirmaram que um plano para formar militares em ciberdefesa e operações no ciberespaço, que deveria ter começado este ano, ainda não arrancou, apesar de a ministra da Defesa ter autorizado em agosto as verbas para o mesmo.

Terá sido nessa altura que, recorde-se, conforme o DN noticiou, o Governo foi informado pelos serviços de informações dos EUA de que o Ministério da Defesa Nacional (MDN) e o Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA) tinham sido alvo de um grave ciberataque em que foram exfiltrados, entre outros, documentos classificados NATO.

Mais, recentemente, a rede do EMGFA foi alvo de um novo ciberataque. Ambos estão a ser investigados pelo Ministério Público e PJ, por haver suspeitas de crimes, entre outros, o de espionagem.

Para o plano de formação está prevista uma despesa de 11.5 milhões de euros (+ IVA) durante nove anos (2022-2030), sendo que para este ano deviam já ter sido pagos 1,6 milhões. Foram convidadas já três empresas, duas das quais israelitas, que aguardam o concurso.

"O rei vai nu", foi a expressão escolhida por Joaquim Pinto Moreira para sintetizar o balanço global do (des)investimento em ciberdefesa, a reduzida execução orçamental e as consequências que estão à vista.

O motivo para o atraso do referido programa de formação no EMGFA - onde está o Centro de Ciberdefesa - foi uma das questões colocadas pelo PSD a Helena Carreiras, mas a Ministra não respondeu, tal como não tinha respondido na semana passada, quando indagada pelo DN sobre essa situação.

Pinto Moreira lamentou a "opacidade" e elencou as falhas do Governo em matéria de ciberdefesa, numa altura em que, frisou, "a ocorrência de ciberataques tem crescido exponencialmente e esse aumento não se verifica apenas em número, mas em grau de complexidade crescente e na sua capacidade para afetar as redes e as infraestruturas críticas nacionais, incluindo as da Defesa Nacional".

Recordando ainda que "a ciberdefesa nacional foi definida como um dos nove objetivos estratégicos do mandato do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, concretamente no reforço das capacidades do Centro de Ciberdefesa do EMGFA, dotando-as de maior capacidade para defender redes militares e realizar operações no ciberespaço", o deputado indignou-se com o facto de a execução orçamental em 2021 para esta matéria tenha sido "apenas de 27%!". "Senhora Ministra, perdoe-me a expressão plebeia, mas "o rei vai nu"!", criticou.

Helena Carreiras também não se pronunciou sobre estes números em concreto, sublinhando que está previsto um investimento de mais de 45 milhões de euros até 2030.

A Ministra sublinhou que "está a ser feito um esforço" para "reforçar" a ciberdefesa, destacando o referido despacho para contratar consultoria em formação, bem como a "aquisição de plataformas e equipamentos", garantindo que "há verbas disponíveis".

Na sua intervenção inicial, esta responsável tinha assinalado que a ciberdefesa era "uma área onde as três prioridades" que elencou no início do mandato "se conjugam": "uma Defesa Nacional centrada nas pessoas; Forças Armadas modernas e preparadas para os desafios do futuro; e contribuir para a credibilidade de Portugal como produtor de segurança internacional".

A governante salientou que "a segurança cibernética de qualquer organização e a sua capacidade de atuação dependem em primeira linha dos seus recursos humano", considerando "da maior importância continuar a aprofundar o trabalho em curso no âmbito do Comité de Monitorização da Ciberdefesa e a dinamizar os instrumentos formativos essenciais à qualificação dos nossos recursos humanos".

Em segundo lugar, quanto a capacidade tecnológica, "os investimentos no quadro da Lei de Programação Militar têm permitido alcançar melhorias e planeamos reforçar essa linha de investimento em atualização permanente. Esperamos que possa ser aprovada em breve, em Conselho de Ministros, a Estratégia Nacional de Ciberdefesa"

Por último, garantiu a Ministra, o Governo vai "continuar a aprofundar esse caminho com parcerias nacionais e internacionais, incluindo no âmbito da Política Europeia de Defesa, reforçando a nosso papel como aliado credível".

A concluir, asseverou que "problemas todos os aliados enfrentam" mas que "isso não define a nossa fiabilidade".

O que a define, sublinhou, "é a nossa resiliência e capacidade de implementar soluções para esses problemas e, nesse ponto, asseguro-vos que todos os aliados reconhecem a Portugal uma exemplar capacidade de resposta".

Nesta audição, Helena Carreiras anunciou que a criação do quadro permanente de praças para o Exército e Força Aérea "está em processo legislativo", embora preferisse não se comprometer com datas.

"A minha esperança é que sim, que corra o mais celeremente possível", respondeu ao Chega que a questionou sobre se esse processo ficaria concluído ainda este ano.

Sobre o orçamento de Estado, entregue nesta segunda-feira, em que a Defesa terá uma despesa total consolidada de 2.584,9 milhões de euros (mais 8,3%), destacando-se o investimento de mais 17 milhões na Lei de Programação Militar face às estimativas para 2022, foi o Chega a questionar Helena Carreiras, se, perante estes valores, tinha "condições para continuar no cargo". Ao que a Ministra sorriu e declarou "com certeza que sim".

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