Farmacêutica pressionada a desenvolver medicamento que teve sucesso em gatos

Um grupo de ativistas instou a farmacêutica Gilead a estudar melhor um medicamento que foi eficaz em gatos. Alegam que a aposta no antiviral remdesivir é baseada no maior potencial de lucros. Mas entre os especialistas há quem discorde deste pedido.
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A farmacêutica Gilead Sciences está a ser pressionada por ativistas para estudar e desenvolver um medicamento para o tratamento da covid-19, que já se mostrou promissor na cura de gatos com coronavírus.

O medicamento, chamado GS-441524, está quimicamente relacionado com o remdesivir, um antiviral também fabricado pela Gilead, e um dos únicos tratamentos para reduzir com sucesso a duração da recuperação de covid-19.

O GS-441524 também atraiu a atenção pela sua promessa de tratar outro potencial coronavírus, a peritonite infecciosa felina ou FIP. A droga tornou-se um tratamento não aprovado no mercado negro, numa doença que era universalmente considerada fatal para os gatos.

Numa carta enviada aos chefes de quatro agências governamentais dos EUA que atualmente desenvolvem tratamentos e vacinas para a covid-19, o grupo de cidadãos de esquerda Public Citizen pediu que a Gilead trabalhasse em colaboração para iniciar o desenvolvimento do medicamento.

O grupo também acusou a Gilead de optar por desenvolver o remdesivir, que está muito mais adiantado no processo de ensaios clínicos do que o GS-441524, porque permanecerá sob patente por mais tempo e, portanto, produzirá mais lucro.

"É tristemente previsível que a Big Pharma responda a uma pandemia global tentando comercializar apenas os medicamentos que maximizam os seus lucros", disse ao The Guardian Michael Abrams, investigador do grupo de pesquisa em saúde do Public Citizen e principal autor da carta.

"O que é alarmante aqui é que os cientistas federais e os reguladores do governo Trump parecem estar dispostos a unir-se à Gilead em decisões que são claramente contrárias ao imperativo primário do governo de melhorar a saúde pública durante esta crise mundial", disse Abrams.

A Gilead é especializada em tratamentos antivirais e já recebeu críticas no passado pelas suas políticas de preços. Mas nem todos concordam que o preço por si só está a dirigir as decisões da Gilead. Derek Lowe é um cientista de descoberta de drogas e autor de In the Pipeline, um blog que aborda o desenvolvimento inicial de medicamentos. Lowe disse que o remdesivir pode ser útil apenas por um período relativamente curto se uma vacina bem-sucedida for desenvolvida, e que a GS-441524 está anos atrás do remdesivir.

"Anticorpos e vacinas monoclonais são a resposta para essa pandemia", disse Lowe. À medida que esses tratamentos forem disponibilizados, "antivirais baseados em moléculas, como remdesivir e GS-441524, ficarão menos valiosos.

O remdesivir estava disponível para uso humano rapidamente, porque a Gilead esperava desenvolver a droga para tratar as vítimas do Ébola. Embora tenha falhado como tratamento para esse vírus, o remdesivir tinha "um perfil estabelecido de dosagem e segurança", como escreveram os investigadores do National Institutes of Health .

"É isso que está a impulsionar a tomada de decisão da Gilead. Sabem que o remdesivir é o seu pássaro na mão e que despejar recursos noutro composto pode ser uma má decisão", disse. Lowe. "Quando estiverem prontos para o lançamento, é possível que ninguém se importe."

Um porta-voz da Gilead disse que a decisão de desenvolver o remdesivir foi tomada porque demonstrou ser "mais eficaz" em certas áreas-chave que a GS-441524 e, portanto, uma melhor candidata ao tratamento potencial da covid-19.

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