Fadiga, fadiga....
Depois da fadiga dos filmes da Marvel, onde cada novo título é apenas "mais um", como uma obrigação, este segundo Doutor Estranho traz outra fadiga: aquela relacionada com as gerigonças dos universos paralelos, o multiverso do título. Por muita paciência e vontade de entrar no jogo, a narrativa do filme descamba sempre na mais preguiçosa fórmula do "vale tudo" da fantasia e na qual as personagens vão de um universo temporal para o outro com justificações esfarrapadas. E é nesse aleatório que se sente a pequenez do empreendimento, é aí que a suposta capa de engenho de cruzamento de material da BD se torna apenas pretexto para tonteria infantil.
Pena também que a outra palavra do título, "loucura" esteja desta vez ainda mais domesticada, um pouco a servir como pano de fundo da tal "novela" que liga todos estes filmes, sendo que o último Homem-Aranha acaba por ser mencionado como ponto de partida. "Incidente" é assim que o feiticeiro bom Doutor Estranho descreve a reunião dos três homens-aranha da história anterior, aliás, todos este Marvel Cinematic Universe está literalmente ligado.
E neste novo capítulo encontramos Stephen Strange (um sempre impecável Benedict Cumberbacht) a tentar ajudar uma adolescente chamada America Chavez, alguém com um dom único: poder viajar de universo para universo. Uma jovem super-heroína ainda incapaz de controlar os seus poderes e já perseguida pela Scarlett Witch (Elizabeth Olsen), aqui em modo verdadeiramente vilanesco. Ao fim ao cabo, a bruxa que já foi dos Vingadores quer recuperar a fantasia de ser dona-de-casa e mãe de dois filhos. Se ela ficar com os poderes de America pode ficar com um controlo excessivo sobre todo o universo, algo que Strange tenta evitar a todo o custo, o mesmo que referir que tem de enfrentar vários Doutores Estranhos de outros universos. Parece insano e caótico? É insano e caótico, mesmo sem ser tão descabelado como prometia. De alguma forma, temos um realizador como Sam Raimi a tentar executar alguns dos seus truques de manga, como alguma estética de terror série B e um humor insubordinado. Do outro, temos a metodologia fechada da Marvel, onde a dependência dos efeitos digitais e das batalhas exageradas matam qualquer tipo de bom senso.
O que poderia ser uma parábola sobre o destino e as suas múltiplas fintas, é apenas um amontoar de lugares comuns e igual aos piores momentos dos filmes de super-heróis, ou seja, barulhento, trapalhão e com falta de paisagem real. Um excesso cansativo de atores e figurantes em croma a baralhar mais a epopeia geral pós-Avengers. As suas 2 horas cansam imenso. Cansam porque tudo é indiferenciado, mesmo apesar de uma escala que não engana: é blockbuster sem olhar a meios, um bulldozer endinheirado que leva tudo à frente, com a agravante de ser cabotino no tom e com humor involuntário que nos faz rir nos momentos mais "sérios". Kevin Feige, o manda-chuva da coisa, anda a dormir... Na essência, é um filme com muito problemas em agregar as múltiplas pontas da estrutura da intriga...
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