A maior abelha do mundo, a Megachile pluto, que foi identificada pela primeira vez em 1858 pelo naturalista britânico Alfred Wallace, na ilha de Bacan, na Indonésia, estava desaparecida há 38 anos, mas um feliz acaso levou uma equipa de biólogos ao seu encontro, numa outra ilha do arquipélago. Foi esta semana. Poucos dias antes, a tartaruga-gigante Chelonoidis phantasticus, conhecida pelo nome comum de tartaruga-da-ilha-nórdica, que já ninguém via há um século, voltou a aparecer. Estava na ilha Fernandina, território do Equador. E um felino do Quénia - uma pantera-negra -, que se julgava extinto, foi captado, a vaguear na savana, por uma câmara fotográfica automática, depois de ter andado cem anos arredado do olhar humano. Extintos? Afinal não, e estes até nem são fenómenos assim tão raros..Basta olhar para os mamíferos. "Mais de um terço das espécies de mamíferos que foram classificadas como extintas, possivelmente extintas ou desaparecidas, foram redescobertas", contam os biólogos César Garcia e Cristiane Bastos Silveira, do Museu Nacional de História Natural e da Ciência (MUHNAC), da Universidade de Lisboa. E há um mundo de motivos para que assim seja..Todos estes casos "são ótimas notícias", resumem os dois especialistas, explicando que são vários os fatores que, em conjunto, contribuem para estes ressurgimentos felizes, de espécies que se julgavam perdidas..Um deles prende-se, desde logo, com "uma maior sensibilidade ambiental das populações nos diversos países" e, por consequência, por uma maior atenção das pessoas para com a natureza. Por outro lado, "há cada vez mais um fenómeno muito interessante à escala global, que são os naturalistas amadores, muitas vezes entusiastas da fotografia, ou da simples observação, na generalidade pessoas apaixonadas pela biodiversidade, pelo campo e pelo seu conhecimento, e que são uma enorme ajuda para os profissionais", sublinham César Garcia e Cristiane Silveira. Em alguns destes casos, é mesmo pela mão desses naturalistas e fotógrafos amadores que algumas das espécies que se pensava estarem extintas reaparecem aos olhos humanos..Mas pode ter havido também erros de diagnóstico à partida. "Um estudo recente concluiu que o erro é maior quando as espécies têm uma grande distribuição espacial", notam os biólogos do MUHNAC, sublinhando que, nestes casos, "a extinção é atribuída à perda ou fragmentação do habitat", uma tendência que "se intensificou no século XX"..A natureza a perder terreno.É óbvio que há problemas a montante, que ditam em primeiro lugar o desaparecimento de animais e plantas, senão de vez, pelo menos de extensas regiões onde anteriormente até podiam ser abundantes..A destruição e fragmentação dos ecossistemas ditadas pela presença humana e pelas suas atividades, ou as doenças causadas por novos fungos ou vírus emergentes mais agressivos, que dizimam algumas espécies e grupos - o caso dos anfíbios, com 3300 espécies em declínio rápido e 1875 ameaçadas, no conjunto das 6674 conhecidas, é paradigmático -, são as principais ameaças que pairam sobre a biodiversidade. Os estudos sobre a perda acelerada de espécies sucedem-se há anos a bom ritmo e alguns cientistas falam mesmo de uma extinção em massa em curso, o que torna este outro fenómeno ainda mais importante e positivo..César Garcia, que é especialista em plantas e também investigador do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (CE3C) da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), conhece bem a sensação de dar com uma espécie que estava dada como extinta em Portugal. Foi em 2010, numa linha de água do Douro. Lá estava ela, uma planta aquática chamada Porella pinnatta, encontrada pela primeira vez 80 anos depois de ter sido observada e "recolhida no rio Coura, em Fomariz, por António Machado, filho do antigo presidente da República Bernardino Luís Machado Guimarães"..O seu grupo está, por isso, a tentar agora localizar outras espécies que também não são observadas há um século, ou mais, desde 1908, 1917 ou 1920, por exemplo. "É fundamental", diz César Garcia, existir "o registo histórico, a georreferenciação e o espécime numa coleção profissional" que "será muito útil" no futuro para o conhecimento da biodiversidade atual..Tecnicamente, uma espécie considera-se extinta após o desaparecimento do seu último indivíduo e é a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla de língua inglesa) a entidade a quem cabe fazer essa avaliação. Mas uma situação "nem sempre é fácil de determinar", lembra o biólogo Gonçalo M. Rosa, especialista em anfíbios e investigador do CE3C, da Universidade de Lisboa, e do Instituto de Zoologia, no Reino Unido. Estes casos de reaparecimento são a melhor demonstração disso mesmo..Na sua experiência de trabalho no terreno, nomeadamente no Panamá, Gonçalo Rosa também viveu em primeira mão o ressurgimento de espécies que estavam dadas como desaparecidas, no caso, depois de uma epidemia provocada por um fungo ter levado ao colapso generalizado das populações de anfíbios no país, nos anos de 1990..Houve espécies "que, simplesmente, deixaram de se encontrar e, passados todos estes anos todos, algumas não recuperaram, ou foram, talvez, perdidas", diz. Mas nessa razia, há pelo menos dois casos felizes que já se podem confirmar. Um deles é o da rã-foguete-comum (Colostethus panamansis), "que foi observada pela primeira vez em 2013, em El Copé, depois de sete anos sem se ter visto um único indivíduo", e que hoje "já apresenta números próximos daqueles encontrados antes do declínio", conta o biólogo..O outro é o da rã-arlequim-variável (Atelopus varius), que desapareceu na mesma altura, e da qual, dez anos depois, já se vão encontrando alguns indivíduos. "São poucos, bastante longe dos números que já foram", mas isso "mostra que a espécie não se extinguiu, como se pensava, e que pode sobreviver, embora com uma forte pressão extra causada pela perda de habitat"..Cada espécie é uma caso face às circunstâncias. Porque reaparecem algumas, e outras não? Que perdas nos habitats podem ser irreversíveis para umas e não para outras? E o que é preciso estudar para responder de forma útil à conservação das diferentes espécies?."Essas são perguntas a que estou a tentar responder", diz Gonçalo M. Rosa. Disso dependerá uma intervenção mais ajustada à sua conservação.
A maior abelha do mundo, a Megachile pluto, que foi identificada pela primeira vez em 1858 pelo naturalista britânico Alfred Wallace, na ilha de Bacan, na Indonésia, estava desaparecida há 38 anos, mas um feliz acaso levou uma equipa de biólogos ao seu encontro, numa outra ilha do arquipélago. Foi esta semana. Poucos dias antes, a tartaruga-gigante Chelonoidis phantasticus, conhecida pelo nome comum de tartaruga-da-ilha-nórdica, que já ninguém via há um século, voltou a aparecer. Estava na ilha Fernandina, território do Equador. E um felino do Quénia - uma pantera-negra -, que se julgava extinto, foi captado, a vaguear na savana, por uma câmara fotográfica automática, depois de ter andado cem anos arredado do olhar humano. Extintos? Afinal não, e estes até nem são fenómenos assim tão raros..Basta olhar para os mamíferos. "Mais de um terço das espécies de mamíferos que foram classificadas como extintas, possivelmente extintas ou desaparecidas, foram redescobertas", contam os biólogos César Garcia e Cristiane Bastos Silveira, do Museu Nacional de História Natural e da Ciência (MUHNAC), da Universidade de Lisboa. E há um mundo de motivos para que assim seja..Todos estes casos "são ótimas notícias", resumem os dois especialistas, explicando que são vários os fatores que, em conjunto, contribuem para estes ressurgimentos felizes, de espécies que se julgavam perdidas..Um deles prende-se, desde logo, com "uma maior sensibilidade ambiental das populações nos diversos países" e, por consequência, por uma maior atenção das pessoas para com a natureza. Por outro lado, "há cada vez mais um fenómeno muito interessante à escala global, que são os naturalistas amadores, muitas vezes entusiastas da fotografia, ou da simples observação, na generalidade pessoas apaixonadas pela biodiversidade, pelo campo e pelo seu conhecimento, e que são uma enorme ajuda para os profissionais", sublinham César Garcia e Cristiane Silveira. Em alguns destes casos, é mesmo pela mão desses naturalistas e fotógrafos amadores que algumas das espécies que se pensava estarem extintas reaparecem aos olhos humanos..Mas pode ter havido também erros de diagnóstico à partida. "Um estudo recente concluiu que o erro é maior quando as espécies têm uma grande distribuição espacial", notam os biólogos do MUHNAC, sublinhando que, nestes casos, "a extinção é atribuída à perda ou fragmentação do habitat", uma tendência que "se intensificou no século XX"..A natureza a perder terreno.É óbvio que há problemas a montante, que ditam em primeiro lugar o desaparecimento de animais e plantas, senão de vez, pelo menos de extensas regiões onde anteriormente até podiam ser abundantes..A destruição e fragmentação dos ecossistemas ditadas pela presença humana e pelas suas atividades, ou as doenças causadas por novos fungos ou vírus emergentes mais agressivos, que dizimam algumas espécies e grupos - o caso dos anfíbios, com 3300 espécies em declínio rápido e 1875 ameaçadas, no conjunto das 6674 conhecidas, é paradigmático -, são as principais ameaças que pairam sobre a biodiversidade. Os estudos sobre a perda acelerada de espécies sucedem-se há anos a bom ritmo e alguns cientistas falam mesmo de uma extinção em massa em curso, o que torna este outro fenómeno ainda mais importante e positivo..César Garcia, que é especialista em plantas e também investigador do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (CE3C) da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), conhece bem a sensação de dar com uma espécie que estava dada como extinta em Portugal. Foi em 2010, numa linha de água do Douro. Lá estava ela, uma planta aquática chamada Porella pinnatta, encontrada pela primeira vez 80 anos depois de ter sido observada e "recolhida no rio Coura, em Fomariz, por António Machado, filho do antigo presidente da República Bernardino Luís Machado Guimarães"..O seu grupo está, por isso, a tentar agora localizar outras espécies que também não são observadas há um século, ou mais, desde 1908, 1917 ou 1920, por exemplo. "É fundamental", diz César Garcia, existir "o registo histórico, a georreferenciação e o espécime numa coleção profissional" que "será muito útil" no futuro para o conhecimento da biodiversidade atual..Tecnicamente, uma espécie considera-se extinta após o desaparecimento do seu último indivíduo e é a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla de língua inglesa) a entidade a quem cabe fazer essa avaliação. Mas uma situação "nem sempre é fácil de determinar", lembra o biólogo Gonçalo M. Rosa, especialista em anfíbios e investigador do CE3C, da Universidade de Lisboa, e do Instituto de Zoologia, no Reino Unido. Estes casos de reaparecimento são a melhor demonstração disso mesmo..Na sua experiência de trabalho no terreno, nomeadamente no Panamá, Gonçalo Rosa também viveu em primeira mão o ressurgimento de espécies que estavam dadas como desaparecidas, no caso, depois de uma epidemia provocada por um fungo ter levado ao colapso generalizado das populações de anfíbios no país, nos anos de 1990..Houve espécies "que, simplesmente, deixaram de se encontrar e, passados todos estes anos todos, algumas não recuperaram, ou foram, talvez, perdidas", diz. Mas nessa razia, há pelo menos dois casos felizes que já se podem confirmar. Um deles é o da rã-foguete-comum (Colostethus panamansis), "que foi observada pela primeira vez em 2013, em El Copé, depois de sete anos sem se ter visto um único indivíduo", e que hoje "já apresenta números próximos daqueles encontrados antes do declínio", conta o biólogo..O outro é o da rã-arlequim-variável (Atelopus varius), que desapareceu na mesma altura, e da qual, dez anos depois, já se vão encontrando alguns indivíduos. "São poucos, bastante longe dos números que já foram", mas isso "mostra que a espécie não se extinguiu, como se pensava, e que pode sobreviver, embora com uma forte pressão extra causada pela perda de habitat"..Cada espécie é uma caso face às circunstâncias. Porque reaparecem algumas, e outras não? Que perdas nos habitats podem ser irreversíveis para umas e não para outras? E o que é preciso estudar para responder de forma útil à conservação das diferentes espécies?."Essas são perguntas a que estou a tentar responder", diz Gonçalo M. Rosa. Disso dependerá uma intervenção mais ajustada à sua conservação.