"Estamos a transformar uma doença potencialmente fatal em doença crónica"

Os tratamentos que foram sendo desenvolvidos podem permitir "adormecer" a doença, sempre acompanhada com vários tipos de tratamentos, fazendo que o paciente possa ter qualidade de vida.
Publicado a
Atualizado a

O tema próstata é "o bicho papão da urologia", confessa Preza Fernandes, urologista anfitrião da primeira paragem da iniciativa "Próstata de Lés a Lés" que aconteceu em Guimarães. O médico fez um diagnóstico do carcinoma da próstata na região onde diz, satisfeito, existirem os recursos necessários e um acesso satisfatório às inovações e afirma que os homens têm muito medo do assunto por tudo o que lhe está associado, seja a impotência sexual ou a incontinência urinária. Há um sentimento de vergonha e de perda da masculinidade. "Talvez seja por essa razão que há mais pessoas a procurar ajuda mais cedo para fazer o diagnóstico e esclarecer dúvidas. Habitualmente são homens referenciados pelo médico de família que depois chegam à urologia solicitando vigilância médica."

Na sua região, o médico tem experiência no Serviço Nacional de Saúde (Hospital da Senhora da Oliveira), mas também no setor privado (Guimaclinic e Hospital da Luz). É um profissional otimista sobre quem lhe entra pela porta dentro. "Sinto que em Guimarães as pessoas estão informadas. Por norma noto que o cidadão da cidade, e mesmo das zonas mais rurais do concelho ou das regiões limítrofes, que nos chega ao consultório é uma pessoa informada. Quando isso não acontece questionam-me para ficarem mais esclarecidos e interessam-se. Nos casos diagnosticados até costumam ser participativos na investigação e na decisão clínica."

Apesar desta convicção, o especialista acredita existirem ainda demasiados mitos relacionados com o cancro da próstata, sobretudo porque são confundidos com outros problemas como a hiperplasia benigna da próstata, ou seja, o aumento de volume da glândula que em situações normais tem o tamanho de uma noz. "A primeira desmistificação necessária a fazer é que nem todos os sintomas representam cancro. Muitas vezes quando começamos a ter sintomas desta doença benigna achamos erradamente que estamos com cancro. É importante esclarecer que a maior parte dos cancros é silenciosa." Outra desmistificação necessária está relacionada com as consequências do tratamento dos tumores cancerígenos. "A impotência sexual tem solução seja com comprimidos, injeções ou até a chamada prótese insuflável do pénis. Temos também uma série de soluções para a incontinência urinária. Num e noutro caso esses problemas não serão eternos", explica Preza Fernandes argumentando que é importante falar abertamente do assunto e desmistificar, porque depois de explicados e ultrapassados os receios "os homens saem da toca".

Por circunstâncias profissionais, mas também porque gosta de olhar em frente, o médico de 40 anos vê no desenvolvimento científico e tecnológico um grande aliado para combater o cancro da próstata. "Os últimos 10/15 anos deram-nos ferramentas para diagnosticar e tratar os tumores em fases cada vez mais precoces. Isso permite tratar a doença de modo mais localizado para conseguir evitar as sequelas que são um grande entrave aos processos de tratamento como a impotência ou a incontinência urinária, etc."

Entre as novas opções que aumentam a sobrevida dos doentes nos casos mais graves (quando o cancro está metastizado, ou seja, quando as células cancerosas já se espalharam para além do tumor original e formam novos tumores em outras zonas do corpo), o médico cita a utilização de hormonoterapias. Nestas situações os médicos tentam perceber a carga de doença, ou seja, o que está fora da próstata. Pode estar nos ossos, nos gânglios ou em algum órgão, nomeadamente no fígado. "Compreendida a fase da doença e o perfil do doente introduzimos medicação. Sequencialmente, e essa é a grande novidade, podemos ir conjugando diversos tipos de tratamento. Ora podemos recorrer à hormonoterapia, depois à quimioterapia ou vice-versa. Temos um leque alargado de possibilidades que vamos testando e observando como reage o doente."

Até 2006 apenas a quimioterapia era a solução para os casos mais graves, depois começaram a surgir hormonoterapias de segunda linha (quando falha o primeiro tratamento) que permitem, em associação com outros fármacos, transformar um cancro com metástases, que antes tinha um desfecho habitualmente fatal, em doença crónica. "Na prática é adormecer a doença, permitindo ao doente ter qualidade de vida sabendo, contudo, que o problema está lá. Administramos novas terapêuticas sempre que necessário para controlar os sintomas e a progressão da doença. Este processo permite gerir o problema e acompanhar o doente sempre com o foco na qualidade de vida. De nada vale prolongar os anos de vida sem o doente ter qualidade na sua vivência."

As novas armas de combate ao cancro da próstata ao nível da terapêutica, garantem os especialistas, permitem controlar situações a 10 e 15 anos, acreditando os médicos que, em breve, possam conseguir prolongar ainda mais esses períodos. Questionado sobre a experiência que tem no acesso generalizado às inovações onde exerce a prática da urologia, Preza Fernandes diz não ter dúvidas de que a região do "berço de Portugal" tem os recursos necessários "tanto no setor público como no privado. Há toda uma nova tecnologia no diagnóstico e no tratamento e orgulho-me de que em Guimarães tenhamos esses recursos".

dnot@dn.pt

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt