Uma dupla escultura de Alexandre Farto, mais conhecido como Vhils, vai relembrar a chegada à Coreia em 1604 do primeiro português, o mercador João Mendes. Dupla, porque além da escultura que ontem à tarde foi inaugurada em Lisboa, no Jardim das Docas da Ponte, uma outra obra de Vhils embelezará em breve também a cidade de Tongyeong, onde no início do século XVII naufragou o português, que seguia num barco japonês a caminho de Nagasáqui.."A chegada de João Mendes à cidade de Tongyeong foi um acontecimento histórico que marcou o início de um intercâmbio cultural entre Tongyeong e Lisboa. Acredito que os monumentos comemorativos concebidos pelo reconhecido artista português Vhils contribuam para uma maior aproximação entre Portugal e a Coreia", declarou ali mesmo junto ao Tejo o presidente da Câmara Municipal de Tongyeong, Chun Younggee. Ao seu lado, o homólogo lisboeta, Carlos Moedas, que ao discursar falou da dupla escultura de Vhils como símbolo de "duas cidades e dois países abertos ao mundo", dando vivas a uma relação que desejou "seja longa e duradoura"..A peça artística agora parte da paisagem lisboeta consiste numa figura feminina coreana e uma representação gráfica da Coreia, tal como a escultura em Tongyeong mostrará uma figura masculina portuguesa e uma representação de Portugal. Vhils não discursou, mas participou na cerimónia, sendo convidado pelo autarca de Tongyeong a estar presente na inauguração na Coreia do Sul da escultura irmã da de Lisboa..A assistir à cerimónia estavam algumas figuras coreanas e da comunidade luso-coreana, como o chef Telmo Saraiva, casado com uma coreana, e que, recém-regressado de umas férias no país da mulher, contou ter ido de propósito a Tongyeong fotografar uma placa que desde 2006 assinala a chegada de João Mendes. É dele, aliás, uma das fotografias que acompanha este texto, a única tirada na Coreia. Encontro também Byung Goo Kang, professor de história, cultura e língua coreanas na Universidade Nova de Lisboa e que em 1990, apenas três anos depois da descoberta dos documentos sobre João Mendes, escreveu um ensaio sobre o português. "João Mendes era mercador e estava no Camboja, onde uma frota oficial japonesa tinha-se deslocado. Atraído pelo que tinha ouvido falar do Japão, onde outros portugueses faziam comércio, embarcou num dos barcos que regressavam e acabou envolvido numa batalha com a marinha coreana. Náufrago mais o seu servo africano, foi levado para a capital, Seul, para ser interrogado. Isto em 1604. Foi depois entregue à China"..A Coreia ainda recentemente tinha sido alvo de uma tentativa de invasão japonesa, repelida pelo almirante Yi Sun-shin com apoio da dinastia Ming. "Os chineses acabaram por entregar João Mendes aos portugueses em Macau", sublinha o professor Kang, que admite casos prévios de portugueses na península, mas sem as provas documentais nem o envolvimento de João Mendes, considerado o primeiro ocidental a pisar o país situado no outro extremo da Eurásia e referido nos anais coreanos como Ji-Wan-Myeon-Je-Su..Também presente na cerimónia de inauguração da escultura de Vhils, o embaixador da República da Coreia em Portugal, Cho Yeongmoo, mostrou-se satisfeito com mais uma prova da excelente relação entre os dois países, que no ano passado celebraram 60 anos de relações diplomáticas. "A distância geográfica entre a Coreia e Portugal, situados nas extremidades da Eurásia, já não é um obstáculo ao intercâmbio entre os dois países. A instalação do monumento comemorativo da chegada de João Mendes à Coreia em Lisboa simboliza a união entre os nossos povos e é, por isso, muito significativa", afirmou o diplomata da Coreia do Sul, vibrante democracia e pujante economia..leonidio.ferreira@dn.pt