O recente referendo holandês, que rejeitou o acordo de parceria entre a Ucrânia e a UE, revela bem uma tendência crescente nos eleitorados europeus: a direita populista tem conseguido explorar os erros e incompetências do diretório de Bruxelas-Berlim - a que, intermitentemente se junta Paris - não para pedir reformas, mas para decapitar o próprio projeto europeu. Provavelmente, no atual estado de coisas, até um hipotético acordo entre a UE e o Vaticano teria sido rejeitado... O governo de Mark Rutte terá agora de escolher entre vetar globalmente o acordo, para não prejudicar a sua posição eleitoral, ou minimizar a leitura dos resultados, excluindo apenas as competências de Haia quanto ao mesmo. Importa recordar que este acordo foi o rastilho que incendiou a Ucrânia, derrubando o presidente Ianukovich, conduzindo ao regresso, armado e referendado, da Crimeia à soberania russa. Milhares de mortos depois, os ucranianos devem interrogar-se sobre o valor das promessas da UE, servida por uma diplomacia fragmentada, sem cadeia de comando, nem objetivos estratégicos coerentes. Em paralelo, a Comissão Europeia avança com a proposta de criação de uma agência comum para a política de asilo, numa altura em que o problema dos refugiados está a ser gerido por uma Realpolitik de gestão da procura, através de um acordo com Ancara, cheio de zonas de sombra éticas e jurídicas. De um lado, o nacionalismo cavernícola que faz do medo o seu programa. Do outro, um federalismo burocrático que chega sempre tarde e sem capacidade de persuadir e esclarecer. Talvez um dia Bruxelas chegue ao ponto de anunciar a mutualização da dívida e a necessidade de um verdadeiro governo constitucional europeu. Resta saber se nessa altura ainda haverá alguém a prestar atenção.