Enes Kanter atua na NBA ao serviço dos New York Knicks mas falar do turco de 26 anos apenas como basquetebolista da liga norte-americana é dizer pouco..Embora resida desde 2009 nos Estados Unidos, onde já representou os Utah Jazz e os Oklahoma City Thunder, Kanter tem estado bem atento à situação do seu país, assumindo-se como um crítico do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, e um apoiante do movimento Hizmet, que visa o diálogo, a educação e a paz social e é liderado pelo teólogo e ativista Muhammed Fethullah Gülen, opositor do regime e considerado persona non grata na Turquia..Foi precisamente por declarar apoiar um discurso de Gülen e "não ter pedido desculpas" que Kanter foi excluído de forma surpreendente da seleção turca, que preparava o Campeonato da Europa de 2015. "As razões pelas quais não fui incluído na equipa foram os valores em que acredito e a minha postura política", justificou nas redes sociais, embora o selecionador se tenha apressado a negar que o afastamento se tenha dado por questões políticas..Detido na Roménia.Essa foi a primeira de muitas retaliações de que foi alvo. Em maio de 2017, quando ainda atuava pela equipa de Oklahoma, foi detido num aeroporto da Roménia por ter visto o seu passaporte ser cancelado pelo governo turco, uma situação que o próprio jogador denunciou..Na mesma altura, confessava à ESPN que não contactava a sua família na Turquia há dois anos com medo de que sofresse represálias..Uma semana depois, o jornal diário turco pró-regime Daily Sabah noticiou que o governo tinha emitido um mandado de detenção contra o pivô, acusando Kanter de fazer parte de uma organização terrorista. No Twitter, o jogador nascido em Zurique, na Suíça, reagiu com humor: "Hahaha. Não vão apanhar-me, não gastem as vossas energias. Eu vou à mesma à Turquia para cuspir nas vossas caras feias.".Pai foi despedido e preso.Dias mais tarde, foi a vez de o pai de Kanter, que já tinha sido despedido do seu emprego, também ser preso, embora os ideais do progenitor sejam opostos aos do filho. "O meu pai foi preso pelo governo turco e pelo Hitler do nosso século. Ele provavelmente vai ser torturado como muitos outros", anunciou, censurando o ato da polícia através de um comunicado no site oficial do jogador.."A polícia invadiu a nossa casa em Istambul, algo que está a acontecer a muitas famílias inocentes em toda a Turquia só porque são membros do Hizmet, inspiradas por Fethullah Gülen. O Hizmet é uma iniciativa social transnacional que defende os ideais de direitos humanos, igualdade de oportunidades, democracia, combate à violência e liberdade religiosa e cultural", começou por escrever Kanter, que tem uma fundação, a Enes Kanter Light Foundation, que propaga os ideais de Gülen.."O atual regime suprimiu a imprensa livre, bloqueou os partidos da oposição de inúmeras maneiras, mudou a Constituição concedendo poderes sem precedentes e alterou a democracia para que pudesse consolidar o poder", prosseguiu, referindo que a Amnistia Internacional publicou inúmeras histórias sobre "violações e tortura nas prisões turcas após a suposta tentativa fracassada de golpe militar a 15 de julho de 2016 que é atribuída a indivíduos inocentes do Hizmet"..Despatriado e sem sair dos EUA.Enquanto procurava obter nacionalidade norte-americana, em setembro de 2017, acabou por ser despatriado pela Turquia, ficando sem nacionalidade. Impedido de voltar à Turquia, Kanter pretende ficar pelos Estados Unidos, país que não extradita para a Turquia a menos que a suposta infração viole a lei federal dos dois países..Por ter medo do que lhe podem fazer no Reino Unido, decidiu não viajar com os New York Knicks para Londres, onde nesta quinta-feira a sua equipa defrontou os Washington Wizards. "O governo turco está obcecado comigo. Falei contra Erdogan, por isso não me sinto seguro. É mau porque eu adoro Harry Potter e sempre quis ir a Londres, mas não posso correr o risco", justificou.."Não estou a dizer que Erdogan vai montar uma operação contra mim em Londres, mas há muitos seguidores dele que são loucos. Podem achar que sou paranoico, mas não quero correr riscos. A equipa de segurança dos Knicks disse que eu não podia sair do meu quarto enquanto estivesse em Londres. E eu estou a ter mais ameaças de morte, foram centenas nos últimos dias. Mas não vou deixar de ser sincero, quero que todo o mundo saiba o que está a acontecer na Turquia. Isso é maior do que o basquetebol, é maior do que a NBA", acrescentou..Erdogan tem um papel importante na vida política turca desde 1994, quando foi eleito presidente da Câmara de Istambul. Nove anos depois, tornou-se primeiro-ministro e não mais saiu do círculo do poder. Apesar das acusações de corrupção e de abuso de poder e da contestação à escala internacional, está para durar na liderança do país.