Em 174 cabeças-de-lista só 60 são mulheres

Representação feminina no topo das listas é de cerca de um terço. Bloco de Esquerda é o partido mais paritário, Chega só tem duas mulheres em 22 círculos eleitorais. Em Aveiro e Braga não há mulheres a cabeça-de-lista entre os oito partidos representados no parlamento.
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Entre os 174 cabeças-de-lista às eleições de 30 de janeiro apresentados pelos oito partidos com representação parlamentar há apenas 60 mulheres. Um número que deixa a representação feminina no primeiro lugar das listas ligeiramente acima de um terço - 34,4%.

A Lei da Paridade impõe que as listas tenham pelo menos 40% de representação de cada um dos sexos, mas a avaliação é feita no global. O diploma obriga a que não haja mais de dois candidatos seguidos do mesmo sexo, mas nada dispõe quanto à precedência, que fica à livre escolha dos partidos.

E essa escolha é, sobretudo, masculina. O único partido com paridade nos cabeças-de-lista é o Bloco de Esquerda, que avança com 11 mulheres e 11 homens nos 22 círculos eleitorais do país. No polo oposto está o Chega: o partido de André Ventura (que já qualificou a Lei da Paridade como um "absoluto disparate") apresenta apenas duas candidatas para os 22 lugares disponíveis - uma representação feminina de 9% no lugar cimeiro das listas.

Já os dois maiores partidos apresentam números idênticos - ambos têm seis candidatas a encabeçar listas versus 16 homens na mesma posição. A representação feminina situa-se, assim, nos 27, 2%. No caso do PS (que em 2006 aprovou a Lei da Paridade, com o Bloco de Esquerda) há nove círculos em que o segundo lugar é ocupado por uma candidata e sete em terceiro (nos círculos de Portalegre e Fora da Europa como suplentes). A disposição não é irrelevante nas contas finais de deputados efetivos no parlamento, dado que os cabeças-de-lista nos dois maiores partidos saem, muitas vezes, para ocupar lugares no governo.

Tanto no PS como no PSD, a representação feminina na topo das listas diminui, por comparação com as eleições legislativas de 2019. No caso dos socialistas, há três anos a proporção era de oito mulheres (36,3% do total) para 14 homens. Já no que se refere aos sociais-democratas, a diferença é mais ligeira: há agora menos uma cabeça-de-lista do que nas eleições anteriores para a Assembleia da República.

Que a lei da paridade levou mais mulheres à Assembleia da República é uma realidade demonstrável pelos números: nas últimas legislativas, em 2019, a percentagem de eleitas alcançou os 40%, acompanhando a subida da representação de género imposta pela lei. Questão diferente é se teve repercussões para lá da imposição legal, por exemplo ao nível dos cabeças-de-lista. Os dados mostram que algo parece ter mudado, mas lentamente, sobretudo a partir de 2015, provavelmente em resultado da crescente censura social à falta de representação feminina. Tomando ainda como exemplo os dois maiores partidos: em 2005, nas últimas eleições sem lei da paridade, o PS apresentou uma única mulher a encabeçar listas, o PSD seis. Um número ao nível do atual, mas que os sociais-democratas não repetiriam nem em 2009, nem em 2011: em ambas as legislativas apresentaram apenas duas mulheres como cabeças-de-lista. O PS não andou muito longe: nas mesmas eleições teve três mulheres a encabeçar candidaturas nos 22 círculos eleitorais. Chegados a 2015 os socialistas chamaram aos lugares de topo seis mulheres, os sociais-democratas sete - sensivelmente a mesma ordem de valores que mantêm até agora.

Dá-se o caso que os dois partidos de poder não são os mais exemplares no que à paridade diz respeito. Voltando às listas deste ano, bastante acima dos números de representação feminina no PS e PSD, estão a CDU e o PAN. Quer a coligação entre PCP e PEV quer o Pessoas-Animais-Natureza avançam com 12 homens e dez mulheres (45,4%) no topo das listas aos vários círculos eleitorais. A Iniciativa Liberal fica um pouco abaixo, mas também acima dos 40%, com 13 candidatos do sexo masculino e nove do sexo feminino. Já o CDS apresenta seis mulheres como cabeças-de-lista e 14 homens (sendo que os centristas não têm cabeças-de-lista nos círculos eleitorais de Açores e Madeira, onde avançam em coligação com o PSD).

Olhando para o mapa eleitoral há dois círculos onde, considerando os partidos com representação parlamentar, só avançam homens como número um às eleições antecipadas de 30 de janeiro. Em Aveiro e Braga não há nenhuma candidata a encabeçar listas. No círculo de Fora da Europa a hegemonia masculina apenas é quebrada pela candidatura da CDU. E há nove círculos com um quadro de sete homens e duas mulheres a liderar listas: Beja, Bragança, Guarda, Leiria, Lisboa, Madeira, Portalegre, Viana do Castelo e Viseu.

Em sentido contrário há cinco círculos eleitorais onde as mulheres estão em maioria como número um - Castelo Branco, Europa, Porto, Setúbal e Santarém. Em todos estes casos há cinco candidatas versus três candidaturas masculinas. Há, aliás, alguns círculos em que o principal duelo eleitoral é protagonizado por mulheres. É o caso de Coimbra, onde medem forças a ministra da Saúde, Marta Temido, e Mónica Quintela, vice-presidente do PSD. Um remake das eleições de 2019, embora Marta Temido avance agora como militante socialista (filiou-se no último congresso do partido) e não como independente. Em Castelo Branco avançam Ana Aragão (que substitui Hortense Martins como cabeça-de-lista do PS) e a deputada social-democrata Cláudia André. Em Santarém a disputa eleitoral será entre a atual ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, e Isaura Morais, deputada e vice-presidente do PSD, no que é também uma reedição das últimas legislativas.

Em Setúbal , o PSD avança com um cabeça-de-lista, mas há um duelo mais à esquerda, entre a líder parlamentar socialista, Ana Catarina Mendes, a deputada do PCP Paula Santos e a parlamentar do Bloco de Esquerda Joana Mortágua. Nas últimas eleições o PS elegeu nove deputados em Setúbal, o PSD três, a CDU outros tantos e o Bloco de Esquerda dois.
Só Lisboa e Castelo Branco elegeram primeiros-ministros

Com o país dividido em 22 círculos eleitorais (correspondentes aos 18 distritos do país, mais Açores e Madeira, Europa e Fora da Europa), que elegem deputados em função do número de eleitores, há dois que assumem um papel preponderante. Lisboa, que elege 48 assentos na Assembleia da República, e o Porto, que elege 40, representam no conjunto 38,2% dos eleitos para o parlamento.

Como é habitual em eleições legislativas, Lisboa congrega boa parte dos líderes partidários - com exceção, como já aconteceu nas últimas legislativas, de PSD e Bloco de Esquerda, com Rui Rio e Catarina Martins a avançarem no Porto. Entre os cabeças-de-lista dos principais partidos há duas mulheres: a deputada do BE, Mariana Mortágua, e a líder do PAN, Inês de Sousa Real. No Porto, o caso muda de figura, com predominância de mulheres a liderar listas: são cinco.

Uma curiosidade: historicamente, decorrência direta do facto de os líderes avançarem habitualmente em Lisboa, o primeiro-ministro é eleito pelo círculo da capital. Foi assim com Mário Soares, Francisco Sá Carneiro, Cavaco Silva, Durão Barroso, Pedro Passos Coelho, António Costa. Há cinco exceções na história das eleições legislativas, todas elas com o mesmo círculo de origem - Castelo Branco, por onde concorreram António Guterres e José Sócrates.

Significa isto que nunca o Porto, o segundo maior círculo eleitoral do país, elegeu o primeiro-ministro, pelo que o cenário de vitória de Rui Rio (que avança em segundo e não como cabeça-de-lista, outra particularidade) seria uma estreia na história das legislativas.

susete.francisco@dn.pt

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