Se há menos de uma semana diretores e representantes das associações de pais olhavam com moderado otimismo para o futuro face à perspetiva do fim da guerra dos professores pela recuperação do tempo de serviço, agora - após a ameaça de demissão do governo e a reviravolta na posição dos partidos - não escondem a apreensão. Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), defende que "o final de ano letivo pode ser mesmo catastrófico" face à perspetiva de "uma derrota humilhante" que poderá deixar os sindicatos "acicatados" para promoverem o protesto nas escolas.."Tudo mudou em alguns dias", considera. "Se antes eu dizia que as nuvens negras que pairavam desde o início do ano letivo pareciam estar a dissipar-se, agora essas nuvens parecem-me ainda mais densas.".Em cima da mesa, num cenário de chumbo parlamentar ao reconhecimento dos nove anos, quatro meses e dois dias exigidos pelos professores, está uma greve às reuniões de avaliação idêntica à que no ano passado atrasou o lançamento das notas finais e as matrículas de largos milhares de alunos. Mas desta vez - num calendário definido já há algum tempo pelas organizações sindicais - o protesto começará logo a 6 de junho, duas semanas mais cedo do que em 2018. O que poderá penalizar mais os alunos que estão nesta altura a concluir o secundário..Acesso ao superior pode ser mais afetado do que em 2018.Em 2018, com exceção do STOP (Sindicato de Todos os Professores), que deu início à paralisação logo no início de junho, as dez organizações reunidas na plataforma sindical esperaram até dia 18 de junho para começar o protesto. Uma medida assumidamente destinada a mitigar o impacto sobre os alunos com exames nacionais e provas finais - 9.º , 11.º e 12.º anos - cujas notas costumam ser lançadas mais cedo pelas escolas de forma a garantir que estes têm avaliações internas antes de se sujeitarem às externas..Em menos de quatro dias, entre 18 e 22 de junho, a paralisação já tinha resultado no adiamento de cerca de 8000 reuniões de conselho de turma, afetando perto de 160 mil alunos. Ainda assim, por essa altura, cerca de três quartos dos alunos já tinham recebido as suas avaliações finais. E a esmagadora maioria dos estudantes em final de ciclo, sobretudo os do 12.º ano, estavam salvaguardados. Quando finalmente, no final de junho, o Ministério da Educação pediu a fixação de serviços mínimos, que viriam a ser confirmados por um tribunal arbitral para os 9.º, 11.º e 12.º anos, o impacto dessa medida foi reduzido, porque eram sobretudo os alunos do 1.º ao 8.º anos que estavam a ser afetados pelas greves às reuniões de avaliação..Mas agora a situação será muito distinta, sendo de prever que desta vez o Ministério da Educação não perca tempo antes de recorrer à fixação dos serviços mínimos. "No dia 6 [de junho] terminam as aulas das turmas dos anos que têm exames: 9.º, 12.º, e desde logo fazemos conselhos de turma", confirma Filinto Lima. "No próprio dia 6 já pode haver reuniões ao final do dia. E essas reuniões poderão ser alvo desta guerra.".Jorge Ascenção, presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), não acredita que o volte-face na questão do tempo de serviço tenha sido uma surpresa total para as organizações sindicais: "Acho que os sindicatos, e provavelmente até a grande parte dos professores, já contavam que isto pudesse acontecer", diz. Por isso, embora assumindo que a questão "está a preocupar" os encarregados de educação, diz esperar que os protestos do ano passado não se repitam. Muito menos que se agravem: "Todos percebemos quão mau foi para as famílias, para os alunos, para os próprios professores e escolas", lembra. Ainda assim, diz, "obviamente" o Ministério da Educação terá de estar preparado para tomar medidas que permitam acautelar o protesto..No ano passado, considera, por não se tratar de uma greve a exames nacionais, a paralisação dos professores poderá ter sido subestimada em termos de impacto. Mas as consequências foram sérias: "Não é só a avaliação [que o aluno deixa de receber]. São as opções que deixa de ter. Nos privados, os alunos vão atempadamente ter conhecimento da sua avaliação e decidir para que curso querem ir. Outros contingentes [de acesso ao ensino superior], nomeadamente de alunos estrangeiros, ficarão numa situação de desigualdade face àqueles que optaram por frequentar a escola pública.".Sindicatos fazem pressão final junto dos partidos.Para já, as organizações sindicais não falam desta forma de luta. Nem de outras que eventualmente possam vir a ser decididas quando as dez estruturas que integram a plataforma dos professores se sentarem à mesa. Uma reunião que só acontecerá após a votação final - que poderá ser já na sexta-feira - dos projetos de alteração ao decreto-lei do governo que consagra a devolução de apenas dois anos, oito meses e dezoito dias de serviço..A prioridade é convencer os partidos que apoiam a contagem de todo o tempo de serviço a procurar um novo consenso. Depois de PSD e CDS terem avisado que não abdicarão de exigir salvaguardas financeiras para aprovar esta devolução, e de PCP e Bloco de Esquerda terem deixado claro que não estarão dispostos a aprovar essas exigências, Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, pediu nesta terça-feira aos partidos que se "deixem de politiquices" e ponham o interesse dos docentes em primeiro lugar..Também nesta terça-feira foi divulgada uma carta aberta subscrita por todos os sindicatos da plataforma apelando aos partidos para que não deixem cair as alterações ao diploma do governo..João Dias da Silva, da Federação Nacional de Educação, confirma ao DN que - num cenário de votação desfavorável às pretensões dos docentes - a greve será seguramente "às reuniões de avaliação, que é o que está planeado". Mas acrescenta que ainda há muito em aberto: "Teremos de esperar pela votação no plenário e a seguir, se for caso disso, veremos que contornos assumirá a greve. Ainda há debate interno, quer dentro das próprias organizações sindicais quer entre elas", explicou.