Haverá diferença entre rapazes e raparigas nas avaliações dos professores e nas notas dos exames? E o género dos professores tem impacto nestas avaliações? Foram estas as perguntas que a Catarina Angelo e Ana Balcão Reis, da Nova SBE Economics of Education Knowledge Center tentaram responder com os seus dois últimos trabalhos. E as respostas são claramente sim, no primeiro caso, e um pouco, mas não muito, no que diz respeito à segunda pergunta..No primeiro trabalho, as duas académicas compararam para rapazes e raparigas as diferenças das notas que têm nos exames das mesmas cadeiras e no mesmo ano, sem nenhuma informação adicional sobre os professores. Esta análise debruçou-se sobre os exames do 11.º e 12.º anos, mas também para os exames de 9.º, 6.º e 4.º anos na altura em que estes existiam. "O que vimos foi que, em média, é verdade para todos, rapazes e raparigas, as notas dadas pelo professor são mais altas e depois têm notas mais baixas nos exames. Só que esta queda é menor para os rapazes. Os rapazes aguentam-se melhor", explica ao DN Ana Balcão Reis, uma das autoras destes estudos. "Quer dizer que quando pensamos em coisas como o acesso ao ensino superior - em que no fundo o que interessa é o ranking e não a nota em si - para os rapazes seria melhor os exames terem um peso maior, porque eles, em termos relativos, ficam melhor nos exames do que as raparigas. E para as raparigas seria melhor as notas dos professores terem mais peso"..O que o atual projeto acrescenta a este primeiro estudo é tentar perceber se, por exemplo, o facto de a maioria dos docentes do secundário ser do sexo feminino tem influência no facto de as raparigas terem melhores notas dadas pelos professores ou se existe algum efeito de correspondência entre o género do professor e dos alunos. Para este trabalho, Ana Balcão Reis e Catarina Angelo usaram informação dos Dados Administrativos do Sistema de Ensino Português entre os anos letivos de 2008/09 e 2016/17. "A primeira conclusão é que temos o mesmo resultado quer os professores sejam homens ou mulheres. Para os rapazes a nota do exame é relativamente melhor, para as raparigas é relativamente melhor a nota do professor", refere a também diretora científica do Economics of Education Knowledge Center da Nova SBE..Os resultados obtidos mostram ainda que, para a generalidade dos alunos, ter um professor do sexo masculino contribui para uma maior diferença entre a nota interna e a nota de exame. "Algo que também acrescentámos agora neste trabalho é que esta diferença, esta queda da nota do professor para o exame, é maior no caso dos alunos que têm professores homens, sendo que esse efeito é menor para os rapazes", diz Ana Balcão Reis, que defende que esta conclusão tem de ter um estudo diferente, com outro tipo de observações. "Posso pôr uma hipótese de os professores, se calhar, preocupam-se em ensinar outras competências e ligam menos aos exames, é uma hipótese de trabalho, mas não há nada que me permita dizer se é esta a razão"..Para esta académica, a grande conclusão do segundo estudo é a confirmação do primeiro trabalho, acrescentando que, no geral, a explicação não está no género no professor. "Não é por eu meter mais rapazes com professores homens ou as raparigas com mulheres, não é isso que vai alterar este resultado. Uma alteração disto não vai acontecer pela mudança de género do professor ou uma alteração do matching entre o género do professor e dos alunos"..A explicação para as raparigas terem melhores notas internas e os rapazes se saírem melhor nos exames e a queda delas entre um e outro ser maior do que a deles - apesar de, como partem em vantagem, continuarem a ter, na generalidade notas superiores nos exames - não surge nos dados analisados pelas académicas, mas Ana Balcão Reis baseia-se em estudos desta área, feitos em Portugal e noutros países, para avançar com uma teoria.."Num exame é a nota do exame e acabou e a nota dos professores ou professoras tem em conta tudo o que foi a avaliação ao longo do ano. Olha para os testes, mas olha também para os trabalhos de casa, se elas chegam a horas, como é que intervêm na aula, e, portanto, o que vários estudos mostram é que provavelmente as raparigas são mais consistentes ao longo do ano, são mais certinhas, conseguem manter a atenção, fazer os trabalhos todos, ter os cadernos mais apresentáveis. Há uma série de outras competências, e de permanência ao longo do ano, que elas, se calhar, conseguem ter mais", enumera a docente. "Também há alguns estudos que mostram que, em momentos de grande stress, como podem ser os exames, aí as raparigas tendem a portar-se pior e os rapazes reagem bem ao stress"..Perante a disparidade na resposta de rapazes e raparigas às diferentes avaliações, as duas autoras mostram alguma preocupação quando se fala na possibilidade de mexer no peso destas componentes de avaliação e na forma como contribuem para o acesso ao ensino superior. "Eu acho que o sistema português é bastante equilibrado. O que acontece também é que isto tem estado bastante em discussão e até com a própria pandemia gerou-se aqui alguma discussão de como é que deve ser o acesso ao ensino superior, o que é que se deve ter em conta, e o que eu penso é que se deve ter algum cuidado em alterar uma coisa que tem funcionado bastante bem e pensar quais vão ser as consequências dessas alterações e também do tipo de alunos que vão passar a entrar no ensino superior"..ana.meireles@dn.pt