A Autoridade Tributária (AT) recusa-se a explicar como poderá atuar junto dos deputados, depois do Tribunal de Contas (TC) ter apontado que as despesas de transporte dos parlamentares "poderão ser consideradas como rendimentos do trabalho", nos termos do Código do IRS, uma vez que aquelas ficaram "dispensadas da apresentação de documentos que comprovem os custos incorridos"..O Tribunal de Contas chamou a atenção, na sua auditoria às contas de 2017 do Parlamento, divulgada na quarta-feira passada, "para as situações relativas às despesas de transporte dos senhores deputados (no montante de 3,1 milhões de euros em 2017) que, de acordo com os critérios constantes da Resolução da Assembleia da República n.º 57/2004, foram dispensadas da apresentação de documentos que comprovem os custos incorridos e, consequentemente, não foram objeto de prestação de contas por cada senhor deputado, pelo que, nos termos do Código do IRS, poderão ser consideradas como rendimentos do trabalho"..Contactado pelo DN, o gabinete do ministro das Finanças informou que não seria dada uma resposta da AT sobre um eventual pedido para os deputados alterarem a sua declaração de rendimentos respeitante ao ano de 2017..No texto do parecer, o TC regista que o conselho de administração da Assembleia da República defendeu que "tratando-se de compensação por despesas realizadas está afastada a natureza remuneratória, (...) não sendo considerada em sede de retenção na fonte de IRS"..O TC não se deu por convencido: "Sem prejuízo destas despesas se destinarem a compensar os senhores deputados de encargos de deslocação e mesmo que estas importâncias não tenham natureza remuneratória, como não são prestadas quaisquer contas poderão estar abrangidas pela alínea d), n.º 3 do artigo 2.º do CIRS [Código do IRS] que equipara os abonos que não tenham natureza remuneratória e relativamente aos quais não tenham sido prestadas contas até ao fim do ano a rendimentos do trabalho.".Mais: para o tribunal, é o fisco que deve decidir sobre esta matéria."Como a não prestação de contas decorre da RAR [Resolução da Assembleia da República] já referida, a questão da eventual tributação é matéria da competência da AT - Autoridade Tributária e Aduaneira", lê-se nas páginas 20 e 21 do parecer..Várias fontes parlamentares, também ouvidas pelo DN, atiraram esta discussão para o futuro, nomeadamente para o grupo de trabalho, criado na semana passada para avaliar os procedimentos das deslocações dos deputados e o registo de presenças e para o qual as diferentes bancadas indicaram, como avançou o DN, nomes de peso: António Leitão Amaro (PSD), Pedro Delgado Alves (PS), Pedro Filipe Soares (BE), António Carlos Monteiro (CDS), António Filipe (PCP) e José Luís Ferreira (PEV)..No entanto, este grupo de trabalho vai refletir para o futuro e dificilmente terá em conta as advertências do Tribunal de Contas relativas ao ano de 2017 (e que, na mesma lógica, se estenderão ao ano de 2018). Afinal, os deputados limitaram-se a aplicar as regras da resolução do Parlamento que regula os "princípios gerais de atribuição de despesas de transporte e alojamento e de ajudas de custo aos deputados"..No entendimento de fontes ouvidas, é difícil voltar atrás e obrigar a tratar estas verbas em sede de IRS por dois motivos: o primeiro, era fazer repercutir na esfera patrimonial dos deputados aquilo que é uma prática da Assembleia da República; em segundo lugar, o Tribunal de Contas foi validando sempre esta prática, só agora emitindo estas reservas..Na mesa de trabalho do grupo, que ainda não tem data marcada para começar a trabalhar, e será coordenado pelo vice-presidente do Parlamento Jorge Lacão - em representação do presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues -, esta será uma matéria a avaliar para o futuro. Se se vai adotar a regra de que estas verbas passarão a ser tributáveis em sede de IRS ou se se trata estritamente de apoio às deslocações dos deputados. Uma ou outra obrigará a mudar as regras atuais.