Corrupção na Defesa? Diretor-geral suspeito nunca foi interrogado

O MP e a PJ estão a investigar denúncias de corrupção na Direção-Geral de Recursos de Defesa Nacional há, pelo menos, 4 anos, incluindo o caso da derrapagem nas obras do Hospital Militar de Belém.
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Alberto Coelho, um dos mais antigos quadros de topo do Ministério da Defesa Nacional (MDN), ex-presidente do Conselho de Jurisdição do CDS, que ocupou durante seis anos (até 2021) o cargo de Diretor-Geral de Recursos de Defesa Nacional e é atualmente presidente do Conselho de Administração da ETI (EMPORDEF - Tecnologias de Informação, S.A), uma empresa do universo da holding IdD Portugal Defence (Indústrias de Defesa), detidas pelo Estado, é o principal visado de um conjunto de denúncias sobre suspeitas de corrupção que chegaram ao Ministério Público (MP) e à Polícia Judiciária (PJ) nos últimos quatro anos.

No entanto, este dirigente superior, que foi nomeado para o atual cargo pelo ex-ministro da Defesa João Gomes Cravinho (atual titular da pasta dos Negócios Estrangeiros), quando já tinha sido apontado, numa auditoria interna da Inspeção-Geral de Defesa Nacional (IGDN) como o principal responsável pela derrapagem de mais de dois milhões de euros (de 750 mil para 3,2 milhões) nas obras do antigo Hospital Militar de Belém (HMB), nunca foi interrogado pelas autoridades pela sua atividade na Direção-Geral de Recursos, confirmou ao DN fonte próxima do processo.

Segundo noticiou a revista Visão nesta quinta-feira, citando fontes judiciais, o primeiro inquérito foi aberto em 2018, depois de ter chegado uma denúncia aos procuradores que investigavam o caso de Tancos.

Eram referidas alegadas ilegalidades na atribuição de subsídios e violação de segredo por funcionário e nessa altura foi aberto o primeiro inquérito -crime à gestão da DGRDN.

Em causa, refere a Visão, podem estar crimes de peculato, participação económica em negócio e corrupção, que estão a ser investigados há quatro anos pela procuradora Celestina Morgado da 1ª secção do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa.

A este processo ter-se-á também juntado o do HMB, em relação ao qual o MP junto ao Tribunal de Contas deduziu acusação - procedimento de efetivação de responsabilidade financeira - contra Alberto Coelho no final de março último, na sequência da referida auditoria da IGDN que tinha sido remetida a este Tribunal um ano antes.

Se for condenado no julgamento, que será conduzido pelo juiz conselheiro Paulo Dá Mesquita, Alberto Coelho poderá ter de ressarcir o Estado.

Uma terceira denúncia, confirmou o DN junto a fontes judiciais que estão a acompanhar processo, chegou à Unidade Nacional de Combate à Corrupção da PJ em abril do ano passado.

Fortemente documentada e tendo também o ex-diretor-geral como principal alvo, visava alegados favorecimentos, contratações e compras que levantavam dúvidas.

A UNCC partilhou o dossiê com o DIAP de Lisboa que o terá juntado ao inquérito iniciado em 2018.

Questionada pelo DN sobre os factos descritos pela Visão, sobre o inquérito, crimes imputados e arguidos, a Procuradoria-Geral da República responde telegraficamente: "Confirma-se apenas a existência de inquérito, o qual se encontra sujeito a segredo de justiça", afiança o gabinete da Procuradora-Geral Lucília Gago.

O DN já tinha interrogado várias vezes a PGR sobre a existência de investigações relacionadas com a DGRDN, mas nunca tinha tido antes obtido resposta.

Quando o caso da derrapagem do Ex-HMB (transformado em Centro de Apoio Militar - Covid 19 durante apenas um ano e atualmente centro de acolhimento dos refugiados afegãos), estava na agenda política, no segundo semestre de 2020, Alberto Coelho mereceu da parte do o ex-ministro da Defesa João Gomes Cravinho rasgados elogios.

Numa das várias vezes que foi inquirido no parlamento sobre esta situação, ao mesmo tempo que anunciou que não iria renovar a comissão de serviço a este diretor-geral (naquele cargo desde 2015), o governante reiterou que se tratava de uma "pessoa extremamente qualificada e capaz" e "prestou enormes contributos ao ministério, que lhe estará sempre grato".

Cravinho manifestou a sua "grande satisfação com a qualidade da obra", que será no futuro uma unidade de cuidados continuados", assinalando que era "dinheiro que não se perde".

Como prova de confiança nas capacidades daquele dirigente, como foi anteriormente referido, nomeou-o para um um dos mais importantes ativos das indústrias de defesa, a ETI, detida a 100% pelo Estado.

No próprio despacho em que remete para o Tribunal de Contas auditoria da IGDN, João Gomes Cravinho não deixa de salientar que aquela obra representa "uma mobilização extremamente ágil de recursos e meios num contexto de emergência" e que "a utilidade e valia desta obra é, por isso, evidente e incontestável quer nos serviços de saúde prestado neste quadro de emergência, quer na valorização futura do património de Defesa Nacional".

Contactado pelo DN, Alberto Coelho não quis prestar declarações.

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