Estudo mostra como o vírus se espalhou rapidamente desde o ano passado

Análise genética em mais de 7600 doentes de todo o mundo mostra que o vírus circula a partir de novembro e dezembro. Mas, segundo este novo estudo, nada há provas que as mutações tornem o coronavírus mais facilmente transmissível ou causem danos mais graves.
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O novo coronavírus circula pelo mundo desde o final do ano passado e será difícil encontrar o paciente zero em cada país. As conclusões são de um novo estudo com análise genética do vírus em mais de 7600 doentes de todo o mundo. O trabalho desenvolvido por uma equipa de cientistas do University College London Genetics Institute aponta que o SARS-Cov-2 espalhou-se muito rapidamente pelo mundo logo após a primeira infeção que deve ter ocorrido na China, provavelmente em novembro.

Os investigadores do Reino Unido analisaram mutações no vírus e dizem ter encontrado evidências de uma disseminação rápida mas afirmam que dessas mutações não se pode concluir que o vírus é agora mais facilmente transmitido ou haja maior probabilidade de provocar doenças graves.

"O vírus está a mudar, mas isso por si só não significa que está a ficar pior", disse à CNN o investigador de genética François Balloux, do University College London Genetics Institute.

Balloux e a sua equipa extraíram sequências virais de um gigantesco banco de dados global que cientistas de todo o mundo estão a usar para partilhar dados. Para o seu estudo, analisaram amostras colhidas em momentos e locais diferentes, chegando à conclusão que indicam que o vírus começou a infetar pessoas no final do ano passado.

"Isto exclui qualquer cenário que suponha que o SARSCoV-2 possa estar em circulação muito antes de ser identificado e, portanto, ter já infetado grandes proporções da população", escreveu a equipa de Balloux no seu relatório, publicado na revista Infection, Genetics and Evolution.

Esta conclusão não é propriamente uma boa notícia. Muitos especialistas esperavam que o vírus circulasse já há muitos meses, infetando silenciosamente muito mais pessoas do que o relatado porque daria a esperança de que pudesse existir alguma imunidade em populações. "Todo o mundo estava à espera disso. Eu também", disse Balloux.

As suas descobertas são um balde de água fria nessa ideia. No máximo, 10% da população global foi exposta ao vírus, estimou o cientista.

Muitos estudos diferentes mostram que o novo coronavírus teve origem num morcego, mas teve que infetar outro animal antes de saltar para os seres humanos. Os primeiros casos humanos foram relatados oficialmente em Wuhan, China, em dezembro passado.

Sempre que se replicam, os vírus têm mutações que podem ser usadas como um relógio molecular para rastrear através do tempo e da geografia. "Os nossos resultados estão alinhados com as estimativas anteriores e apontam para todas as sequências que partilham um ancestral comum até ao final de 2019, o período em que o SARS-CoV-2 deu o salto para o hospedeiro humano", escreveu a equipa de investigadores.

"É muito recente", disse Balloux. "Estamos muito, muito confiantes de que o salto para o ser humano aconteceu no final do ano passado."

Sustenta-se em amostras virais colhidas por todos os cantos do globo que exibem múltiplas mutações e são todas muito semelhantes. "Tudo está em toda parte", lê-se no estudo.

Os cientistas também encontraram evidências genéticas que sustentam suspeitas de que o vírus estava infetando pessoas na Europa, EUA e outros países semanas antes dos primeiros casos oficiais serem relatados em janeiro e fevereiro. Será impossível encontrar o "primeiro" paciente em qualquer país, aponta François Balloux.

"Todas essas ideias sobre a tentativa de encontrar um paciente zero são inúteis porque existem muitos pacientes zero", disse.

As descobertas da equipa de Balloux foram revistas por outros especialistas, um processo chamado revisão por pares, antes de serem publicadas na revista. O investigador afirma que alguns estudos de outras equipas, publicados online nos chamados sites de pré-impressão, podem ter tirado conclusões incorretas.

"Todos os vírus sofrem mutação naturalmente, o que por si só não é mau e não há nada que sugira que o SARS-CoV-2 esteja a ter mutações mais rápido ou mais devagar do que o esperado. Até agora, não podemos dizer se o vírus está a tornar-se mais ou menos letal e contagioso", disse.

Lane Warmbrod é analista do Johns Hopkins Center for Health Security que acompanha os estudos sobre a genética do novo coronavírus e disse à CNN que são necessários mais estudos em animais para demonstrar como as mudanças na genética do vírus podem torná-lo mais ou menos infeccioso ou patogénico.

"Só porque estes estudos dizem que essas mutações estão a espalhar-se rapidamente ou a tornar-se dominantes isso não significa nada, exceto que sabemos que tal aconteceu. Na verdade, não nos diz nada sobre o que está a acontecer biologicamente", disse Warmbrod.

Estudos sobre mutações podem ser importantes para as equipas que trabalham com medicamentos e vacinas para combater o coronavírus. As vacinas, principalmente, precisam atingir partes do vírus que são conservadas, que não mudam muito ao longo do tempo.

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