"A retirada do nome de Mário Mesquita da capa do livro A Desinformação. Contexto Nacional e Europeu, a pedido do atual presidente do Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), é um ato vil e mesquinho, que atenta contra o inexcedível legado de Mário Mesquita e contra a dignidade do seu caráter. (...) Os seus amigos, colegas, alunos e admiradores não poderiam, pois, deixar de manifestar o seu repúdio por aquilo que consideram ser um ato de humilhação post mortem.".Intitulado "nota de repúdio", este texto, que começou nesta segunda-feira a correr nas redes sociais, tinha a meio da tarde de terça mais de 300 assinaturas, incluindo dois ex-membros do Conselho Regulador da ERC, Estrela Serrano e Arons de Carvalho..Twittertwitter1617543809520529408.Outros nomes que saltam à vista na subscrição do texto de desagravo ao intelectual a quem o Presidente da República atribuiu a 30 de maio, no velório, a Ordem da Liberdade, são os dos deputados Rui Tavares (Livre) e Porfírio Silva (PS), assim como o da eurodeputada socialista Margarida Marques e dos ex-parlamentares do BE Jorge Costa e Fernando Rosas..Trata-se de uma reação à notícia do DN que dá conta de que o juiz conselheiro Sebastião Póvoas, presidente da ERC, mandou retirar o nome do vice-presidente da instituição da capa do livro, agora posto à venda, em que trabalhava quando morreu, em maio, e de cuja elaboração era supervisor..Como referido na notícia anterior, várias pessoas que acompanharam o processo mais ou menos diretamente garantem que Mário Mesquita esteve, até ao seu desaparecimento, a dirigi-lo, e era o "mentor do projeto". Isso mesmo confirma também Ana Mesquita, a sua filha: "Sabia, pelo meu pai, que o livro estava feito e tinha sido entregue para revisão de gralhas, formatações.".Entre os subscritores da nota de repúdio, diz ao DN a promotora desta iniciativa, Marisa Torres da Silva, professora do curso de Ciências da Comunicação da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Nova, a preponderância é de jornalistas e ex-jornalistas, incluindo muitos ex-alunos de Mesquita, que era professor da Escola Superior de Comunicação Social desde a década de 1990, como antes o fora na Universidade Nova, nos primórdios do respetivo curso de Comunicação Social (foi também fundador do curso superior de jornalismo da Universidade de Coimbra)..Na lista de signatários contam-se por exemplo Joaquim Fidalgo, ex-Provedor do Leitor do Público, José Pedro Castanheira, Adelino Gomes, Maria Flor Pedroso, José Leite Pereira, Jacinto Godinho, Helena Garrido, José Manuel Mestre, Pedro Coelho, Daniel Cruzeiro, João Garcia e Sofia Branco (ex-presidente do Sindicato de Jornalistas). Também o atual presidente do sindicato, Luís Filipe Simões, subscreveu.."Amiga e admiradora" de Mário Mesquita, Marisa Torres da Silva diz ao DN conhecer o "clima de inimizade" -referido na notícia publicada por este jornal - existente entre ele e o presidente da ERC, e ter ficado chocada com o que considera "um ato indigno, absurdo e lamentável".."A coleção Regulação dos Media, da ERC, na qual foi publicado o livro em causa, foi criada e coordenada pelo Mário, enquanto vice-presidente. Eu própria trabalhei num livro da coleção, sobre discurso de ódio, e tenho meu nome na capa como coordenadora. Todos os livros da coleção têm na capa o nome dos responsáveis pela coordenação ou supervisão", explica a académica. "Achei que algo assim não podia passar sem repúdio, e como ao partilhar a notícia do DN nas redes sociais vi que havia muitas manifestações de indignação, resolvi criar esta forma de o exprimir"..Já depois da publicação da notícia do DN, a Almedina, a editora da coleção Regulação dos Media, assumiu, em resposta a perguntas enviadas pelo jornal, ter recebido a versão final do livro A Desinformação. Contexto Nacional e Europeu a 15 de julho de 2022, menos de dois meses após a morte de Mário Mesquita, que ocorreu a 27 de maio..Esta informação (parecendo confirmar a ideia de Ana Mesquita de que o livro estava praticamente pronto aquando da morte do pai) contrasta com aquela que o jornal recebeu da ERC, na qual se garante que a versão definitiva do livro, "miolo+capa", só foi aprovada a 6 de dezembro, e que a alteração se deveu a uma questão de "coautoria".."No processo que antecede o lançamento de qualquer publicação é normal existirem, de forma continuada, adaptações no grafismo e conteúdos de texto", escreveu a ERC em resposta ao DN. "No caso em questão, uma das muitas situações que foi repensada foi a referência na capa aos responsáveis pela supervisão deste trabalho em perfeita igualdade, tendo-se optado por fazer essa menção apenas no interior da publicação, na respetiva ficha técnica.".Na ficha técnica do livro, na categoria de supervisão, além do nome de Mário Mesquita, surge também o de João Pedro Figueiredo, membro do Conselho Regulador da ERC..De acordo com um relato efetuado ao DN, com a morte de Mesquita a supervisão da coleção passou para o presidente da ERC, Sebastião Póvoas. Este, perante o facto de a capa entregue à editora ostentar o nome do vice-presidente, quis substituí-lo pelo de João Pedro Figueiredo, que recusou. A decisão terá sido então a de publicar o livro sem menção de autoria na capa..Ainda segundo o diretor editorial da Almedina, Ricardo Monteiro, a capa em que o nome do vice-presidente da ERC constava foi difundida no universo livreiro no final de setembro, com indicação de que a obra seria lançada a 1 de outubro (informação que ainda consta no site brasileiro da Almedina, assim como a capa com o nome de Mesquita)..Mas o lançamento "foi adiado a pedido da ERC". E "a 20 de outubro, por determinação do Senhor Presidente do Conselho Regulador da ERC", foi recebida a ordem para suprimir o nome de Mário Mesquita..Ricardo Monteiro assegura, em nome da Almedina, que a capa com o nome do vice-presidente da ERC "não chegou a ser impressa, e que não houve despesas relacionadas com essa alteração"..O mandato de cinco anos do atual Conselho Regulador da ERC - que integra, além do presidente Sebastião Póvoas, e do já citado João Pedro Figueiredo, ainda Fátima Lima e Francisco Azevedo e Silva -, completou-se em dezembro. A eleição do próximo CR, que chegou a estar prevista para 22 de dezembro, deverá ter lugar esta semana.