A vereadora dos Direitos Humanos e Sociais da Câmara Municipal de Lisboa desafiou a oposição a participar numa reunião com a Estamo, a imobiliária do Estado, para encontrar um espaço central para acolher as pessoas sem-abrigo que se encontram atualmente no Centro de Acolhimento de Emergência (CAE) no Quartel de Santa Bárbara, que terá de ser desocupado em setembro.."Pedir à Estamo que repense, pondere, tenha em conta todas estas pessoas que atravessam esta situação difícil e vulnerável, e que se disponibilize a ponderar, a pensar e a encontrar um espaço central", declarou a vereadora Sofia Athayde na reunião da Assembleia Municipal de Lisboa realizada na terça-feira..Em causa está o encerramento, até ao final de setembro, das instalações do CAE no Quartel de Santa Bárbara, em Arroios, inaugurado em 2021 em contexto de pandemia para prestar apoio às pessoas em situação de sem-abrigo. Estas instalações vão ser utilizadas pelo Governo para a construção de habitações de renda acessível. De recordar que, atualmente, a resposta dada por este centro a 120 pessoas integra várias entidades nas áreas do emprego, apoio psicossocial e consumos..Neste sentido, Sofia Athayde desafiou os vereadores da oposição a participar numa reunião com a Estamo, agendada para a próxima quarta-feira, para que ajudem "a corrigir erros que foram cometidos no passado", defendendo que o anterior executivo municipal, liderado por Fernando Medina, já sabia que a ocupação do Quartel de Santa Bárbara seria temporária..O DN questionou os partidos da oposição sobre o desafio feito pela vereadora e o recurso ao Estado para resolver esta questão, sendo geral o silêncio sobre e reunião com a Estamo. O PCP deixou claro que "a câmara pode e deve entrar em negociação com a administração dos edifícios vazios do Estado disponíveis na Colina de Santana para poder manter o centro de acolhimento aberto no território onde serve a população sem abrigo".."A mobilização de edifícios vazios do Estado para os transformar em equipamentos ao serviço da população, inclusivos para as pessoas em situação de sem abrigo, deveria ser uma prática corrente, como há muito os vereadores do PCP têm vindo a defender", prossegue a vereação comunista, ressalvando que "consideram as diferentes respostas dirigidas às pessoas em situação de sem abrigo devem ser enquadradas no território, nomeadamente considerando as áreas onde se concentram estas pessoas, de forma a serem o mais eficazes possíveis. Empurrar a população sem-abrigo para a geografia dos bairros municipais irá fragilizar esta resposta e conforma um processo de exclusão, até mesmo de guetização destas situações"."Aquilo que nos parece é que o executivo Novos Tempos está a passar a bola, não assumindo as suas responsabilidades, ao fim de dois anos para procurar uma solução. E dá o dito por não dito na sua própria estratégia", refere o Cidadãos Por Lisboa, sublinhando que "quanto à questão do local, a proposta conjunta prevê que se esgotem as possibilidades tanto em termos do património municipal, como do poder central, nesta área da cidade. É esta proposta, que surgiu em resposta à opção da CML que achamos errada de dispersar o centro de emergência por 4 pontos, que temos de discutir o mais depressa possível"..Já o Livre defende que "o que a proposta conjunta propõe é que se identifique um espaço dentro do património municipal ou do Estado central. Não colhe, por isso, a tentativa da vereadora empurrar a responsabilidade por encontrar uma solução para a Estamo. Era já do conhecimento da vereadora que a ocupação do Quartel de Santa Bárbara era temporário e portanto é lamentável que se tente encontrar uma solução a apenas 2 meses da saída do quartel".."O Livre entende que a solução apresentada pela vereadora Sofia Athayde, de dispersar a resposta às pessoas em situação de sem abrigo por vários bairros municipais distantes do centro da cidade não é uma boa solução para o problema e, pelo contrário, os vai exacerbar. Por isso o Livre juntamente com BE, PS e CPL apresentou na câmara uma proposta para que o centro de acolhimento se mantivesse no centro da cidade, perto das pessoas que pretende apoiar", prossegue o partido, referindo que "a vereadora parece agora assumir o mesmo, iniciando diligências nesse sentido..Mesmo assim, o gabinete de Rui Tavares mostra-se "disponível para dialogar com o executivo de Carlos Moedas (não podendo deixar de notar igualmente o silêncio do Presidente da Câmara numa matéria desta importância até ao momento), numa postura construtiva, esperando que os serviços municipais possam identificar as várias opções à disposição da Câmara para que se identifique o melhor local para o centro de acolhimento a pessoas em situação de sem abrigo"..Apenas o BE se pronunciou sobre o desafio lançado por Sofia Athayde, avançando que "recebeu por WhatsApp uma pergunta sobre a disponibilidade para participar numa reunião com a Estamo, não tendo havido nenhum contacto formal entre vereadoras ou gabinetes"..Quanto à possibilidade de a solução para o problema do acolhimento dos sem-abrigo atualmente no Quartel de Santa Bárbara, o gabinete da vereadora Beatriz Gomes Dias declara que "tendo em conta que a CML e o Estado Central são os maiores proprietários de imóveis em Lisboa, o Bloco de Esquerda considera que não há razão para que não seja encontrada uma solução para as pessoas em situação de sem abrigo que mantenha a resposta no território onde as pessoas em situação de sem abrigo se encontram. Na verdade, a CML possui vários imóveis perto do Quartel de Santa Bárbara, assim como o Estado Central tem as instalações do antigo Hospital Miguel Bombarda ou a Academia Militar na mesma zona".."O imperativo social de responder a estas 130 pessoas em situação de sem abrigo é maior do que qualquer projeto de investimento imobiliário privado que esteja previsto para esses espaços. Só a falta de vontade política poderia resultar na falta de soluções para estas pessoas vulneráveis", prossegue o BE, sublinhando que "continua disponível para trabalhar com as outras vereadoras e vereadores da CML para encontrar alternativas"..Na opinião da vereação do Partido Socialista, "não compete à Estamo, pois não está no seu objeto e funções, encontrar uma solução para as pessoas em situação de sem abrigo em Lisboa. Essa responsabilidade é da autarquia, que tem de uma vez de assumir o seu papel na cidade em vez de inventar desculpas, pois é a instituição que sempre teve um papel de apoio e integração desta população, em articulação com uma rede de instruções sociais"..Para os eleitos socialistas, a prova de que este é um problema municipal é que "a vereadora se propôs encontrar uma solução, concentrando a resposta social em bairros municipais. O PS considera essa solução um retrocesso perigoso, não só porque é menos eficaz, afastando a resposta do centro da cidade onde há uma rede social e contam com a solidariedade dos restaurantes, porque estigmatiza e alimenta preconceitos".."Quem tem a capacidade para encontrar soluções concretas para os equipamentos municipais em falta, seja entre o património municipal, do Estado ou no mercado, é a Câmara Municipal de Lisboa", prosseguem, garantido que "o Partido Socialista está sempre disponível para colaborar nas soluções políticas que sejam necessárias, mas convém não esquecer que quem governa é a equipa liderada por Carlos Moedas e esta não pode passar para a oposição a responsabilidade para encontrar soluções que sabiam ser temporárias há mais de ano e meio e não acautelaram atempadamente"..A solução proposta pelo executivo de Carlos Moedas para este encerramento é a deslocação das pessoas sem-abrigo que se encontram no CAE do Quartel de Santa Bárbara para quatro bairros municipais - Condado (Marvila), Alfredo Bensaúde (Olivais), Armador (Marvila) e Ourives (Beato)..Esta solução tem recebido duras críticas da oposição, tanto na câmara como na Assembleia Municipal de Lisboa (AML). No dia 6, a AML já tinha decidido recomendar à autarquia que recue na sua decisão de descentralizar a resposta às pessoas em situação de sem-abrigo. Já a oposição na Câmara de Lisboa apresentou na passada quinta-feira, durante uma visita ao Quartel de Santa Bárbara, uma proposta para que a resposta às pessoas sem-abrigo, que é atualmente feita em Arroios, se mantenha no centro da cidade. Para os vereadores de PS, BE, Livre e Cidadãos Por Lisboa, "a Câmara Municipal de Lisboa conhece o calendário dos investimentos do PRR e a necessidade do Quartel de Santa Bárbara entrar em obras para a construção de habitações de renda acessível por parte do Estado central, desde o início do presente mandato. Apesar disso, a vereação dos Direitos Sociais não procurou alternativas atempadamente", pode ler-se na proposta..No mesmo documento, os oito vereadores de BE, PS, Livre e Cidadãos por Lisboa referem que "o anunciado desmantelamento deste equipamento levaria à deslocação das pessoas que hoje acolhe para quatro bairros sociais da CML, solução deverá manter-se até que esteja concluída, no futuro, a recuperação das instalações da Escola Secundária Afonso Domingues, em Marvila, desativada há mais de uma década", prossegue o documento dos vereadores, referindo que esta opção revela "fraca compreensão" das necessidades sociais das pessoas sem-abrigo, que normalmente permanecem em zonas centrais das cidades..Neste sentido, estes partidos querem "garantir que a resposta do centro de acolhimento de emergência municipal se mantém no centro da cidade, nas zonas onde estão as pessoas em situação de sem-abrigo", defendendo que, para essa continuidade, o executivo de Carlos Moedas deve "abrir durante dois meses um processo de identificação de hipóteses alternativas, no património da CML e do Estado situado na zona central da cidade, para a instalação de um equipamento de natureza definitiva"..Os dois vereadores do PCP foram consultados para a elaboração desta proposta, mas optaram por não subscrever o documento, embora concordem com os seus traços gerais, pelo que irão votar a favor, permitindo a sua aprovação - a oposição tem dez vereadores, contra os sete eleitos pela coligação Novos Tempos de Carlos Moedas..O DN questionou a Câmara de Lisboa sobre quando é que o documento será agendado para discussão e votação, mas não recebeu resposta a esta pergunta..Sobre a política da CML em relação às pessoas sem-abrigo, a autarquia recordou ao DN que "o atual executivo camarário decidiu aumentar significativamente o investimento no apoio às pessoas em situação de sem abrigo, este ano, vai exceder os 6 milhões de euros - o maior de sempre. Hoje, a CML já garante 1 046 vagas de acolhimento, o que significa um aumento de 30% relativamente a 2021 - último ano da responsabilidade do PS e do BE - e no final de 2023, esse aumento deverá atingir os 43%"..Questionada sobre se na reunião da próxima semana a Estamo não apresentar nenhuma proposta de espaço central para acolher quem está no Quartel de Santa Bárbara, a autarquia mantinha a intenção de deslocar essas pessoas para os bairros do Condado, Alfredo Bensaúde, Armador e Ourives, o gabinete da vereadora Sofia Athayde afirmou que "a CML não comenta cenários hipotéticos e especialmente quando há uma reunião marcada com a Estamo no próximo dia 28". E reiterou "o convite aos vereadores da oposição, em especial aos do PS e à do BE, para que a acompanhem na mencionada reunião com aquela entidade".."Para a atual câmara a prioridade é ajudar as pessoas em situação de sem-abrigo procurando a sua autonomização e integração. Estamos, como sempre estivemos, disponíveis para debater e acolher todos os contributos, seja das diferentes forças políticas, seja das várias associações da sociedade civil, construindo os consensos necessários", defendeu ainda a autarquia..com Lusa