Muitas vezes apelidado de "o último ditador da Europa", o presidente bielorrusso Alexander Lukashenko tem sido uma pedra no sapato da União Europeia (UE) praticamente desde que foi eleito pela primeira vez, em 1994. Trinta anos depois da independência que adveio da queda da União Soviética, as relações com Bruxelas parecem agora ter batido no fundo, com as autoridades bielorrussas a serem acusadas de desviar um avião para Minsk de forma a prender um opositor que seguia a bordo. Uma nova ronda de sanções está em cima da mesa, com a Rússia à espera de colher os frutos..A UE reconheceu a independência da Bielorrússia em 1991 e chegou a assinar um acordo de parceria e cooperação em 1995, mas nunca chegou a ratificá-lo. Entretanto Lukashenko, que tinha sido o gestor de uma quinta estatal durante a época soviética foi eleito presidente em 1994, com 80% dos votos na segunda volta, abrindo as portas a uma relação cada vez mais estreita com a Rússia..O regime foi-se entretanto tornando mais autoritário, com as primeiras sanções europeias a chegar em 2004, em resposta à "contínua deterioração da democracia, do Estado de direito e dos direitos humanos na Bielorrússia" depois do desaparecimento de quatro opositores. A cada nova eleição, e a cada nova acusação de fraude eleitoral, a situação ia piorando, tendo o próprio Lukashenko sido incluído na lista de proibição de viajar. Mas, ao mesmo tempo, a UE continuava a tentar alcançar algum acordo com o presidente, que durante anos aproveitou os receios europeus de que a Bielorrússia pudesse ser absorvida pela Rússia..A ideia da integração não é nova, estando em cima da mesa já desde o final dos anos 1990, mas o próprio Lukashenko tem lutado contra, jogando ao mesmo tempo com Bruxelas e Moscovo à procura de apoios de um e de outro lado - e mais recentemente também da China. O presidente russo, Vladimir Putin, tem insistido em retomar os planos para uma união, há muito suspensos, sendo que a Bielorrússia é um país de trânsito para o petróleo que exporta para o Ocidente (houve uma disputa entre os dois países em 2007) e serve de tampão para a NATO..Nos últimos 20 anos, os momentos de maior aproximação da Bielorrússia à UE, foram também os de maior distância da Rússia. Ainda no rescaldo da disputa energética, Minsk não reconheceu em 2008 a separação da Abcásia e da Ossétia do Sul, após a guerra entre Rússia e Geórgia, da mesma forma que não reconheceu em 2014 a anexação russa da Crimeia, apesar de ter justificado as ações de Moscovo na região ucraniana. Uma das razões é por não querer que a Bielorrússia acabe da mesma forma..Em 2008 a UE tinha levantado as sanções impostas, numa tentativa de encorajar reformas democráticas, mas voltaria a aplicá-las após as eleições de 2011, quando ele foi eleito para um quarto mandato. Em 2016, Bruxelas voltou a levantar as sanções, um ano depois de o presidente libertar vários presos políticos. As denúncias de fraude eleitoral nas eleições de agosto do ano passado, seguidas da repressão violenta dos manifestantes que saíram à rua em protesto, resultaram na aplicação de novas sanções a 88 indivíduos - incluindo Lukashenko. A União Europeia também não reconhece o resultado eleitoral, considerando que as eleições não foram nem livres, nem justas..Mas as sanções existentes não impediram a última ação de Minsk. No domingo, alegando a existência de uma bomba a bordo, um avião da Ryanair que fazia a ligação entre Atenas, na Grécia, e Vílnius, na Lituânia, foi desviado para a capital bielorrussa, acompanhado de um avião de combate. A bordo seguia o jornalista opositor Roman Protasevich, que foi detido junto com a namorada à chegada. Outros dois passageiros não voltaram a embarcar, suspeitando-se que fossem agentes dos serviços de informação bielorrussos (KGB)..A UE denunciou um ato de "terrorismo de Estado", com as autoridades bielorrussas a alegar que havia uma ameaça concreta do grupo islamita palestiniano Hamas - as buscas não revelaram qualquer bomba. Além da libertação imediata do jornalista, Bruxelas exige uma investigação independente e vários países já deram ordens para que as companhias aéreas evitem sobrevoar a Bielorrússia..Reunidos numa cimeira, os líderes europeus discutiram as hipóteses de implementar mais sanções (um novo pacote já estava a ser preparado), incluindo proibir a companhia aérea do país de voar para a Europa. A Rússia, por seu lado, considerou "chocante" a reação ocidental, defendendo que a posição bielorrussa era "razoável"..susana.f.salvador@dn.pt