Há um braço-de-ferro entre o Conselho Europeu e o Parlamento da UE sobre o Orçamento para União para 2021-2027 que pode bloquear todo o processo de aprovação. O governo português não aceita a proposta do Conselho, muito mais baixa do que a do Parlamento, e que a vingar representaria um corte de 10% nos fundos de coesão para Portugal. António Costa reuniu-se em Beja, no início do ano, com os países "amigos da coesão" para bater o pé. Mas fez tudo o que podia e terá sucesso, apesar do apoio do PE?.O eurodeputado social-democrata José Manuel Fernandes argumenta que o executivo se atrasou nesta luta, mas assegura que o Parlamento Europeu, que terá de aprovar por maioria absoluta o Quadro Financeiro Plurianual (QFP) da UE, não dará o aval à proposta do Conselho Europeu para suprir a perda de receitas da saída do Reino Unido. E que representam dez mil milhões de euros anuais. O Conselho, que é presidido por Charles Michel, quer uma contribuição dos Estados membros de 1,074% do rendimento nacional bruto, enquanto o PE propõe 1,3%. Portugal admitiu manter os 1,16% que aceitou no quadro anterior, mas os países do norte - Finlândia, Suécia, Dinamarca e Holanda - não querem ultrapassar a fasquia de 1%. Num quadro em que o PIB da UE sem o Reino Unidos foi de mais de 14 biliões de euros. Entre as quatro propostas há muitos milhões em jogo.."António Costa reuniu-se com os amigos da coesão, mas teria sido muitíssimo mais útil tê-lo feito antes de o Conselho ter apresentado a sua proposta", afirma o eurodeputado do PSD. Agora, bate-se pela do Parlamento Europeu.."O Conselho diz que a nossa proposta é irrealista, mas é a única coerente para manter as políticas da coesão, a política agrícola comum, o Erasmus+, os programas de investigação, o fundo para a defesa e a transição justa. E a única justa para não enganar os cidadãos", afirma o eurodeputado coordenador do grupo do Partido Popular Europeu na comissão de Orçamentos e membro da equipa de negociação do PE do QFP 2021-2027..José Manuel Fernandes estabelece um paralelo sobre o que se conseguiria se o PE aprovasse a proposta do Conselho. "Seria como dar 20 euros a um cidadão e dizer que podia comprar um carro elétrico." O Parlamento diz que a proposta contraria as prioridades da UE..Perante o impasse, e que parece não ter fim à vista, o eurodeputado social-democrata defende um "pano de contingência" que prolongue o quadro financeiro atual para manter os programas em curso e renovar os que terminarem a 31 de dezembro de 2020. "É melhor prolongar um quadro que já não é bom do que ter um ainda pior", afirma..José Manuel Fernandes argumenta que para aliviar a contribuição dos países que mais contribuem para o Orçamento comunitário é preciso novos "recursos próprios". Volta às propostas, entre outras, de taxar os gigantes das novas tecnologias, como Google, Facebook e Amazon, sobre produtos que não respeitem as emissões de carbono, nova distribuição das verbas dos direitos aduaneiros e da cobrança de multas aos Estados membros, tal como uma taxa sobre as transações financeiras. "Tudo isto permitia não sobrecarregar os contribuintes." Estima que com estas medidas poderia arrecadar-se anualmente cerca de 22 mil milhões de euros, o que representaria 40% do Orçamento da UE..E remata: "Seria uma atitude criminosa impedir que os beneficiários do Orçamento o pudessem utilizar. Seria contra a Europa e os seus cidadãos." Isto no caso de não ser aceite a proposta de estender o atual quadro de financiamento da União até que haja consenso sobre o novo.. Como pedir mais fundos?.Joaquim Sarmento, economista e professor do Instituto Superior de Economia e Gestão - que é o "Centeno" de Rui Rio -, acredita que o governo está a fazer tudo o que pode para que Portugal não perca fundos de coesão. Mas, tal como José Manuel Fernandes, admite que devia ter agido por "antecipação" à proposta do Conselho Europeu.."Se há um contribuinte líquido que saiu (o Reino Unido), só há duas hipóteses: ou os outros aumentam a sua comparticipação, ou os que contribuem menos veem reduzidos os benefícios", diz e admite que seja só na presidência alemã da UE, no segundo semestre deste ano..Na batalha portuguesa pela manutenção dos fundos de coesão e por um maior nível de financiamento da UE, Joaquim Sarmento vê alguma debilidade. Que se traduz, afirma, na baixa taxa de execução dos fundos. "Se executamos pouco, com que argumento iremos reivindicar mais?", questiona..A mesma "fragilidade" é detetada pela vice-presidente do PSD e responsável pelas Relações Externas, Isabel Meirelles. "Portugal apenas executou 40% dos fundos. Como podemos pedir mais?"A falta de empenho na execução explica-se, dizem Sarmento e Meirelles, pela falta da comparticipação portuguesa e pela contenção na despesa pública, levada a cabo por Mário Centeno..Isabel Meirelles defende que o governo português devia jogar nesta negociação com o facto de Portugal ter conseguido superar a crise e ter equilibrado as contas públicas de uma forma sustentada. O ex-comissário Carlos Moedas é que já considerou que a proposta do Conselho Europeu para o Orçamento plurianual da União Europeia "não é um bom sinal para a Europa". E lembrou em entrevista à TSF: "O Orçamento do Estado americano federal é 20% do PIB americano, o Orçamento, entre aspas, federal da União Europeia é 1%, portanto, a diferença é de um para 20", diz.