Bombas, ferraduras, túmulos, ossadas e um cofre. As incríveis descobertas nas obras dos estádios
O Real Madrid e o River Plate estão a aproveitar a pandemia de covid-19 e a impossibilidade de terem público nos jogos para realizarem obras de modernização dos seus estádios. As máquinas irromperam pelos relvados e pelas bancadas, numa espécie de contrarrelógio para que tudo fique pronto até serem levantadas a restrições relacionadas com a presença de público nos recintos. E o curioso é que no Estádio Santiago Bernabéu e no Monumental de Buenos Aires foram feitas descobertas inusitadas durante os trabalhos.
Os merengues estão a modernizar a sua histórica casa bem no centro de Madrid e, quando rebaixavam a zona do relvado em 30 metros para ali montarem um moderno tapete verde retrátil, encontraram um cano gigante do saneamento básico da cidade que atravessava todo o recinto, de uma baliza à outra. A canalização estava já bastante velha e, como tal, aproveitaram a oportunidade para a renovar. As fotos da incrível descoberta foram publicadas no Twitter pelo responsável máximo pelos relvados do Real Madrid, o britânico Paul Burgess, e tiveram um enorme impacto nas redes sociais.
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Ainda mais extraordinária foi a descoberta feita nas obras do Estádio Monumental de Núñez, palco da final do Mundial de 1978, em que a Argentina derrotou a Holanda e se sagrou campeã do mundo pela primeira vez.
Além da remodelação das bancadas e de desaparecer a pista de atletismo, o relvado também teve intervenção, pois foram retirados 30 metros cúbicos de terra para que o terreno de jogo pudesse ser rebaixado em um metro. E foi precisamente neste processo que os operários encontraram três ferraduras com mais de 120 anos e que pertenceram ao antigo Hipódromo Nacional de Belgrano, que funcionou precisamente naquele local entre 1887 e 1911. Em 1934, já depois da demolição, o River Plate comprou aqueles terrenos para ali edificar o seu imponente estádio.
A descoberta destas três ferraduras é um autêntico achado histórico da cidade de Buenos Aires do final do século XIX e princípio do século XX, quando aos domingos as corridas de cavalos eram um evento importante da sociedade da capital argentina. Por isso mesmo, as três peças passam a estar expostas no museu do River Plate, como importante testemunho histórico do local onde está o Estádio Monumental, um verdadeiro espaço de culto para os fanáticos hinchas dos millionarios.
Estas descobertas na sequência de remodelações ou construções de recintos desportivos têm sido recorrentes um pouco por todo o mundo. Em Portugal não há relatos de grandes descobertas, embora durante as obras de demolição do antigo Estádio da Luz, em 2004, tenha havido quem dissesse, em jeito de brincadeira, que iria ser finalmente encontrado o brinco de Vítor Batista, antigo avançado do Benfica que num dérbi com o Sporting, em 1978, perdeu esse adereço nos festejos de um golo. Na altura, o irreverente jogador obrigou mesmo o árbitro Rosa Santos a parar o jogo para procurar o brinco, que custara mais de 10 contos (50 euros)... uma fortuna. O momento ficou para a história do futebol português e tornou-se uma lenda.
Há de tudo entre o imenso rol de descobertas. Que o digam os adeptos de outro clube argentino, o Central de Córdoba, clube de Santiago del Estero que em 2019, aproveitando a subida à I Divisão, iniciou as obras de expansão do seu estádio. E não é que foram encontrados ossos humanos? De imediato pararam os trabalhos, até que historiadores da cidade do norte da Argentina vieram dizer que, afinal, aqueles ossos pertenciam a um cemitério que ali existira no século XIX.
Uma descoberta semelhante, mas com maior valor arqueológico, foi feita, em 2017, na Nicarágua, no início da construção do Estádio Nacional de Basebol, na capital, Manágua. Foram descobertas mais de 42 urnas funerárias em cerâmica, algumas delas decoradas com desenhos de animais em relevo e com várias cores, com cerca de 1200 anos, que apresentavam ainda restos de ossos humanos. Ou seja, anteriores à colonização espanhola, o que permitiu ter mais dados sobre os povos indígenas que habitaram aquela região da América Central.
Também na Colômbia, em 2007, foi encontrado um cemitério indígena com cerca de 48 túmulos, com mais de 2000 anos. Foi durante a construção do estádio do Deportivo Cali, cujas primeiras escavações revelaram também a existência peças de cerâmica.
Mais macabra foi a descoberta durante a remodelação do Estádio Playa Ancha, em Valparaíso, no Chile, nada mais, nada menos do que ossadas humanas, pois naquele local tinha funcionado um centro de detenção durante a ditadura de Augusto Pinochet.
Ainda no continente americano, mas nos Estados Unidos, a descoberta foi ainda mais surpreendente, em 2016, durante as obras de expansão dos balneários do Estádio Reser, de futebol americano, pertencente à Universidade de Oregon State. Foi encontrado um fémur de um mamute com mais de 10.000 anos, além de ossos de outros animais da Idade do Gelo, como um bisonte e um camelo.
No continente europeu, tem sido mais comum encontrar bombas por rebentar. Foi assim em 2017, na fase final da construção do Estádio Wanda Metropolitano, do Atlético de Madrid. Um operário que trabalhava numa grua nas zonas circundantes do recinto descobriu, após escavar cerca de quatro metros, uma bomba da Guerra Civil Espanhola, com cerca de 50 centímetros de largura. O engenho, com mais de 75 anos, acabou por ser detonado pela brigada de minas e armadilhas espanhola e os trabalhos puderam depois prosseguir.
Em 2015, tinha sido o Borussia Dortmund a fazer uma descoberta semelhante, quando alguns técnicos analisavam o terreno junto ao estádio para ampliação da zona VIP do Signal Iduna Park. Foi então encontrada uma bomba de origem britânica, de 250 quilos, lançada na II Guerra Mundial, mas que acabou por não rebentar. Aliás, esta foi a segunda vez que houve uma descoberta do género no recinto do Dortmund, pois em 1998 foi encontrada uma bomba ainda maior, de 450 quilos, enterrada no solo junto à entrada principal do estádio. Dois anos depois, sucedeu o mesmo no Estádio Olímpico de Berlim.
Aliás, de acordo com as autoridades alemãs, há muitas bombas que nunca foram detonadas e que se encontram ainda hoje incógnitas no solo de várias cidades, o que representa um perigo, tendo em conta que à medida que o tempo passa os detonadores vão-se tornando mais frágeis e o risco de explosão é maior.
Duas dessas bombas da II Guerra Mundial foram encontradas em 2004, em Munique, durante a construção do estádio do Bayern, no exterior do recinto. Os engenhos eram bem mais pequenos do que aquele que foi descoberto em Dortmund, do tamanho de granadas, tendo acabado por ser detonadas no local.
Mas a descoberta de bombas da II Guerra Mundial não é um exclusivo da Alemanha. Na Rússia, durante a construção da Arena Volvogrado para o Mundial 2018, foram encontradas bombas e outros engenhos que ali caíram durante a batalha de Estalinegrado.
Também na Polónia, durante a construção do Estádio Nacional de Varsóvia, que recebeu o jogo de abertura do Euro 2012, foi descoberta uma bomba de oitenta centímetros de diâmetro, que se encontrava no local há mais de 65 anos. Acabaram por ser os militares a retirar o engenho do local para que as obras pudessem prosseguir.
Do tempo da II Guerra Mundial foi também descoberto na Alemanha, em Hamburgo, uma cruz suástica de betão, com cerca de quatro metros, no sítio onde os dirigentes do SpVgg Billstedt-Horn pretendiam construir os balneários do Estádio Hein-Kling. As escavações revelaram a presença daquele símbolo nazi a apenas 40 centímetros de profundidade, num local onde outrora existiu um monumento do partido de Adolf Hitler. Por ser tão pesada, acabaram por a destruir no local.
Mais inesperado foi aquilo que os operários que remodelavam o El Sadar, estádio do Osasuna, encontraram, no verão de 2019, numa das paredes do recinto: um cofre com 3400 euros. E o mais curioso é que ninguém fazia ideia da existência daquele tesouro, embora dois anos antes tenham sido descobertos outros dois cofres, só que estes estavam vazios.