BE quer marcha-atrás na Tapada das Necessidades
O Bloco de Esquerda deu ontem os primeiros passos na caminhada para as eleições autárquicas em Lisboa, ao ritmo dos protestos contra as alterações previstas para a Tapada das Necessidades. O jardim da freguesia da Estrela deverá entrar em obras no próximo mês de setembro, estando prevista a construção de quiosques com esplanadas, parques infantis, um auditório com capacidade para 200 pessoas e um restaurante, que deverá ocupar um espaço central no jardim. "Não é o espírito do lugar", ouviu ontem, repetidamente, a candidata bloquista, Beatriz Gomes Dias, que foi até às Necessidades ouvir as queixas dos Amigos da Tapada, um movimento informal que quer travar o projeto previsto para aquele espaço.
Estamos a meio da manhã de um dia de semana, aqui e ali veem-se jovens a fazer exercício, um casal de idosos passeia de mão dada, crianças de uma escola próxima fazem ginástica já perto da entrada norte da Tapada. O bulício da cidade não entra aqui e é isso que os membros do movimento - que lançaram uma petição contra as alterações previstas para o jardim, que recolheu entretanto mais de 11 mil assinaturas - querem que permaneça. "O que querem fazer é um projeto megalómano para este espaço", argumenta Fátima Cavaleiro Ferreira, sublinhando que este é um espaço "até um bocadinho selvagem, um jardim histórico com 200 anos, que tem de ser respeitado na sua singularidade".
Beatriz Gomes Dias ouve as queixas, concorda, diz que é preciso que o movimento social contra o projeto ganhe força para obrigar a câmara a rever os planos para a Tapada. E os partidos, e o Bloco de Esquerda, o que fizeram, questionam os peticionários, algo incrédulos por serem eles os protagonistas da contestação ao projeto. A resposta é dada por Ricardo Moreira, deputado bloquista na Assembleia Municipal - o BE votou contra, o projeto foi aprovado por PSD e PS. E se os membros do movimento mostram alguma esperança de que a anunciada saída de José Sá Fernandes da vereação lisboeta possa resultar num travão a fundo dos planos para o jardim, o BE diz que não e aponta diretamente à presidência da câmara: isto não é uma teimosia do vereador dos espaços verdes, é um projeto com o respaldo de Fernando Medina.
Porquê a Tapada das Necessidades para abrir a pré-campanha? Beatriz Gomes Dias, que tenta nas próximas autárquicas manter o lugar na vereação lisboeta alcançado há quatro anos por Ricardo Robles, diz querer apoiar o movimento social que se criou em defesa da Tapada, sublinhando que o projeto que está em cima da mesa "vai descaracterizar profundamente este local". A candidata defende que "deve ser a câmara, com os recursos que tem" a avançar com a requalificação do espaço, e nunca através da concessão a um privado, para mais quando se trata de uma "intervenção expressiva". "Isto é uma forma de privatizar o espaço público." E como se trava um projeto que está aprovado, com obras licenciadas e prestes a iniciarem-se em setembro? "Já vimos outros exemplos, por exemplo o Martim Moniz."
Foi precisamente junto ao Martim Moniz que se instalou Helena Espvall, música sueca chegada a Lisboa há oito anos, que entretanto se mudou para a zona de Alcântara. Diz que não queria acreditar quando viu os planos para a Tapada das Necessidades: "Não queremos um grande projeto aqui, queremos uma recuperação, o espaço está degradado, mas uma recuperação que seja respeitosa. Colocar um restaurante no centro da Tapada é um crime." "Isto é usar as coisas como se fossem um produto. Não é um produto, é património", aponta igualmente Cláudia Domingues, também associada ao movimento. "Não podemos cair na asneira de padronizar tudo. Há muitos restaurantes nesta zona, as pessoas procuram a Tapada com outras finalidades, para estar em silêncio na natureza."