A associação ambientalista Último Recurso vai colocar o Estado em tribunal, alegando "omissão de ação" do Governo no combate à crise climática, com vista a obter uma sentença que reforce o compromisso de Portugal contra as alterações climáticas.."Um dos maiores objetivos é obter a redução de emissões de gases de estufa através de decisões judiciais. Aquilo que se chama litigância climática deu agora o primeiro passo em Portugal com este processo que a Último Recurso está a iniciar", afirmou à Lusa a presidente da organização, Mariana Gomes, que sublinhou: "Esta narrativa de que Portugal está a combater as alterações climáticas e está bem posicionado nos rankings é bastante falaciosa"..A ação judicial vai dar entrada nos tribunais "muito em breve", faltando apenas definir se vai ocorrer por via administrativa ou cível, segundo a líder da associação fundada em dezembro de 2021 e cuja intervenção no terreno se tornou efetiva a partir de abril deste ano, com o "apoio jurídico a mais de 300 ativistas"..A representação judicial nesta ação contra o Estado estará a cargo de Ricardo Sá Fernandes, confirmou à Lusa o advogado.."Depois da entrada em vigor da lei de bases do clima, Portugal continua a esgotar o seu orçamento de carbono em 2027", alertou Mariana Gomes, enumerando outros fundamentos para esta ação: "Várias medidas regulamentares e administrativas não foram desenvolvidas na lei de bases do clima, como o conselho de ação climática. E o governo tem demonstrado que quer aumentar as emissões, com a construção do novo aeroporto"..Recordando o compromisso português com o Acordo de Paris, em 2015, para manter o aumento da temperatura abaixo dos dois graus centígrados, e o relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) que veio dizer que as metas nacionais de redução de gases de efeito de estufa (entre 45% a 55% face a 2005) "são insuficientes", a líder da Último Recurso deu o caso da Alemanha como referência para este processo.."Na Alemanha houve um processo judicial parecidíssimo com este que estamos a iniciar. Eles têm uma meta de redução por volta dos 50% e o Tribunal Constitucional alemão disse que o Estado deveria reduzir 70% até 2030. Há a questão de obter esta sentença judicial que aumente o compromisso e a ambição de Portugal e, consequentemente, as políticas públicas inerentes", referiu..Mariana Gomes argumentou ainda com a "responsabilidade histórica" de Portugal enquanto país do hemisfério Norte que produziu emissões de gases, devendo, por isso, atender à "responsabilidade de auxílio global" aos países do Sul, em nome do desenvolvimento destes estados.."Portugal, ao ter aqui uma omissão de ação, coloca em risco direitos constitucionais", observou, depois de citar o direito a um ambiente são e ecologicamente equilibrado..A contribuir para a decisão de avançar com o processo está também a ausência de resposta por parte do Ministério do Ambiente e da Ação Climática a um pedido de audiência, bem como a não regulamentação da lei de bases do clima, que foi aprovada pelo parlamento em 5 de novembro de 2021..Com apenas 21 anos, a estudante de Direito que lidera a Último Recurso manifestou ainda a expectativa de que a ação judicial "possa servir de inspiração para outros jovens" a agirem dentro do sistema.."Só com a atividade de mais pessoas é que conseguiremos, de facto, combater a crise climática", concluiu Mariana Gomes.