A Assembleia da República aprovou no passado dia 15 de março uma resolução, publicada nesta segunda-feira em Diário da República, em que recomenda ao governo a adoção de um "plano de emergência" para o alojamento de estudantes do ensino superior. Mas a implementação das medidas sugeridas não se antevê muito prática. Uma das propostas dirigidas ao executivo passa por recorrer a verbas do POPH - Programa Operacional do Potencial Humano, utilizadas para reforçar as garantias do sistema de empréstimos a estudantes - pondo assim em causa o sistema - e transferi-las para um novo "fundo" que, no essencial, será igual ao que já existe desde outubro do ano passado..Mais concretamente, a resolução, nascida de uma proposta do Bloco de Esquerda, propõe ao governo que, "através do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, reequacione o fundo financeiro disponibilizado para os empréstimos bancários a estudantes do ensino superior, utilizando-os na construção de mais residências universitárias e implementando um mecanismo financeiro de emergência para todos os estudantes deslocados que não encontrem oferta de alojamento nas residências universitárias"..O problema, desde logo, é que não existe propriamente um "fundo financeiro disponibilizado para os empréstimos bancários a estudantes"..O que há é uma linha de crédito com garantia mútua, reativada no final do ano passado após um interregno de mais de três anos, em que o Estado, através da Sociedade Portuguesa de Garantia Mútua (SPGM), assume o papel de avalista junto da banca. Ou seja: só entra com capital em caso de incumprimento por parte dos beneficiários dos créditos em causa - 155 até agora -, mantendo o direito de posteriormente lhes exigir a restituição desses valores..O único "fundo" - que, na realidade, é uma contragarantia - envolvido nesta operação é do Programa Operacional Capital Humano. Com uma dotação máxima de dez milhões de euros financiados pelo Fundo Social Europeu, acrescidos de 1,7 milhões da componente nacional, o apoio é destinado, não a financiar os empréstimos propriamente ditos, mas a melhorar as condições em que estes são concedidos. Por exemplo, permite assegurar um Swap de 1% aos alunos beneficiários de apoios da ação social, por oposição aos 1,25% cobrados aos restantes..De uma certa forma, o POPH acaba por ser fiador do fiador (Estado), garantindo assim melhores condições nos empréstimos..Admitindo que era a essa verba que a assembleia se referia - o DN tentou, sem sucesso, ouvir um dos deputados autores desta proposta -, continua a ser difícil que a solução possa ser implementada..Questionado pelo DN, o ministério informou que "o governo está a analisar a compatibilidade do quadro legal e regulamentar existente, nomeadamente no que diz respeito ao financiamento através de fundos comunitários, à medida concretamente recomendada pelo n.º 2 daquela Resolução da Assembleia da República n.º 46/2019"..No entanto, a reprogramação do atual quadro comunitário foi feita recentemente pelo ex-ministro do Planeamento e Infraestruturas Pedro Marques - atual cabeça-de-lista do PS às eleições europeias -, não parecendo viável que o dossiê possa ser reaberto a cerca de sete meses do fim da legislatura..Programas e fundos já existem.A isto acresce o facto de as respostas defendidas pela Assembleia da República já estarem, na prática, previstas em medidas já adotadas, ainda que a sua implementação esteja ainda em curso.."No que diz respeito às formas de financiamento do plano de alojamento, estão disponíveis para as instituições de ensino superior, municípios e demais entidades envolvidas na implementação do plano, o Fundo Nacional de Reabilitação do Edificado (FNRE), bem como o Instrumento Financeiro para a Reabilitação e Reconversão Urbanas (IFRRU 2020) e o Programa Reabilitar para Arrendar", referiu o ministério ao DN..Só em relação ao FNRE, que se destina também à oferta de imóveis para arrendamento acessível à população em geral, estão previstos, segundo foi anunciado em outubro, investimentos de quinze milhões de euros neste ano em alojamento estudantil..Já no que respeita à questão dos apoios financeiros aos estudantes deslocados, o ministério, sem descartar eventuais medidas adicionais, diz que em sede de Orçamento do Estado para 2019 ficou já assegurado um aumento de 33% do valor máximo do complemento de alojamento para estudantes bolseiros (fora de residência), que corresponde agora a 40% do indexante de apoios sociais, que aumenta de forma significativa o apoio a estudantes deslocados que não encontram oferta de alojamento nas residências das instituições de ensino superior..Levantamento de Pousadas de Juventude.A proposta do Parlamento contempla ainda o possível recurso à rede de Pousadas de Juventude como alternativa para o alojamento estudantil. Com essa finalidade, é pedido ao governo que, "através do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e da Secretaria de Estado da Juventude e do Desporto, efetue um levantamento pormenorizado sobre as pousadas de juventude, para aferir as que têm capacidade para receber estudantes do ensino superior a partir do início do próximo ano letivo e preparar intervenções rápidas ao nível da gestão e reabilitação de espaços que ainda não estejam preparados para o efeito".