As ilustrações de Yara Kono entre gatos e galinhas

Conheça a vencedora do Prémio Bissaya Barreto de Literatura para a Infância 2016 com o livro "Gato Procura-se".
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Yara Kono traz um monte de livros coloridos consigo. "Não estão todos", avisa. "Estes são os que consegui reunir." No topo desta pilha de livros está Gato Procura-se, o livro ilustrado por ela, com texto de Ana Saldanha, que esta semana ganhou o Grande Prémio Bissaya Barreto de Literatura para a Infância, promovido pela Fundação Bissaya Barreto. "Foi uma surpresa enorme, porque quem concorreu foi a editora, eu não sabia de nada. Quando me ligaram acho que fiquei sem palavras."

Ainda fica sem palavras, mesmo depois de ter ganho tantos prémios. Em 2010 ganhou o Prémio Nacional de Ilustração, com O Papão no Desvão, também com Ana Saldanha. Em 2013, A Ilha, com texto de João Gomes de Abreu, ganhou uma Menção do Júri na categoria Opera Prima nos Bologna Ragazzi Awards. No mesmo ano, recebeu uma Menção Especial no Prémio Nacional de Ilustração com Uma Onda Pequenina, com texto de Isabel Minhós Martins. A mesma dupla já tinha ganho, em 2008, uma Menção Honrosa no Prémio Internacional Compostela para Álbuns Ilustrados pelo livro Ovelhinha Dá-me Lã. "Os prémios são importantes porque são um reconhecimento, mas também porque temos mais oportunidades de trabalho", explica. E quando se gosta tanto do que se faz como Yara, esse é o verdadeiro prémio.

E pensar que podia estar agora a vender comprimidos atrás de um balcão. Yara ri-se. Nasceu no Brasil, há 43 anos. "Sempre gostei de desenhar. Mesmo desde pequena. Em casa, a minha mãe tinha uma parede reservada para nós desenharmos. Eu e o meu irmão rabiscámos imenso ali. E na cozinha tínhamos um quadro negro enorme, para estudarmos e para desenharmos. Havia sempre pó de giz no chão. Havia esse desejo mas nunca o levei muito a sério, nunca achei que pudesse trabalhar nessa área." No momento de escolher um curso, optou por Farmácia e Bioquímica. Mas nunca deixou de desenhar. Já a trabalhar num laboratório, fez um curso livre de desenho e correu tão bem que decidiu fazer um curso de design de comunicação. "Nessa idade temos imensa energia, trabalhava de dia e estudava à noite", recorda.

Até que, a certa altura, tirou um mês de férias para ir ao Japão conhecer a família do pai e descobriu que, por ter família japonesa, poderia ter uma bolsa de estudo na área que quisesse. "Decidi fazer um curso de design gráfico. Foi aí que eu comecei a tirar o pé da área da farmácia. Fiquei lá um a no e foi ótimo. Quer como experiência de vida quer profissionalmente, foi o descobrir de uma área que eu julgava ser só um hobby."

Apesar disso, quando veio para Portugal com o namorado português ainda considerou a hipótese de trabalhar na área de farmácia. Mas como era difícil conseguir as equivalências para exercer farmacêutica, começou a mandar currículos na área do design gráfico. Por uma vez a burocracia teve um lado positivo. Aconteceu tudo "meio sem querer". Trabalhou em alguns ateliers até, em 2004, chegar à Planeta Tangerina.

Foi Yara Kono que redesenhou o logótipo do Planeta Tangerina e que paginou o primeiro livro ali editado, Um Livro Para Todos os Dias. E, à medida que o atelier Planeta Tangerina se transformava também na editora Planeta Tangerina, o trabalho de Yara também começou a alastrar-se para outras áreas. "Decidi fazer alguns cursos e workshops na área da ilustração, que me começou a interessar." O primeiro livro que publicou foi De Sol a Sonho, de Raul Malaquias Marques, que foi feito a convite da Caminho. E nunca mais parou.

Ilustrar um livro não é só fazer uns desenhos. É muito importante a comunicação entre os dois autores. "Às vezes, o ilustrador interpreta o texto de uma forma que não é bem aquilo que o autor do texto tinha pensado", conta. "Para mim é obrigatório acompanhar todo o processo." Gosta de intervir na escola da letra, de fazer a capa, de ser ela a paginar. "Tudo é importante, a maneira como o texto encaixa na ilustração, como se divide o texto."No caso de Gato Procura-se o grande desafio era ter 32 páginas para preencher com um texto muito curto. "Então eu propus repetirmos a frase "o meu gato desapareceu", em página dupla, ao longo do livro, para dar um ritmo de leitura mais interessante." Yara Kono e Ana Saldanha já fizeram quatro livros juntas e este é já o segundo prémio que ganham juntas.

No quintal da Planeta Tangerina, numa vivenda em Carcavelos, há uma casinha de madeira e vidro com uma mesa grande onde se pode trabalhar com a luz do sol. Também há um galo e três galinhas que dão ovos de vários tamanhos. Foi uma dessas galinhas que serviu de inspiração para a escritora Isabel Minhós Martins e a ilustradora Yara Kono fazerem o livro Como é Que uma Galinha. Ali os livros nascem assim. "Para mim o Planeta além de ser uma escola é também o meu grupo de amigos. Tornei-me uma sócia pequenina e tomamos as decisões em conjunto." Hoje, Yara está feliz e realizada, longe dos laboratórios químicos. "Podia ter começado mais cedo mas este percurso foi importante. Tudo aconteceu no momento certo."

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