1970, a fundação do MRPP."O movimento não devia chamar-se "comunista"".O MRPP germinou no meio estudantil. Arnaldo Matos ganhou as eleições para a Associação Académica da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, em 1969-70, mas a sua lista nunca foi homologada pelo regime. É a 18 de setembro de 1970 que Matos se reúne numa casa em Benfica, Lisboa, com Fernando Rosas, Vidaul Ferreira e João Machado, para formalizarem aquilo que já envolvia cerca de 50 pessoas. Nesse dia, decidiu-se tudo: o nome do partido, o nome dos jornais, quem ficava no órgão central. E logo ali houve uma grande discussão sobre se o movimento devia chamar-se "comunista". Arnaldo Matos defendeu que não, contra a opinião dos outros três. No fim da sua argumentação, todos estavam convencidos - e assim nasceu o Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado..1974, contra o 25 de Abril."O levantamento popular nas primeiras horas é que fez a Revolução contra as intenções dos militares".O MRPP foi apanhado desprevenido com o 25 de Abril e, às primeiras horas da Revolução, um comunicado do movimento desconfiava de marcelistas e spinolistas, para garantir que eram "os chacais que se disputam, os abutres que conspiram, as hienas que entre si lutam". Em 2004, 30 anos depois da madrugada clara, Arnaldo Matos alimentava a ideia de que "quem ouve hoje os militares de Abril a falar ficará a pensar que esses indivíduos desde o ventre das respetivas mães que se propunham salvar a pátria, quando, na verdade, só se propunham salvar o pelo". Afinal, argumentava, "o levantamento popular nas primeiras horas do golpe militar é que fez a Revolução contra as intenções dos próprios militares"..1975, a proibição de ir a votos."Eu não sou - infelizmente para mim - o grande educador e dirigente da classe operária e do povo. Isso é uma tarefa do meu partido e sou um militante do MRPP".O esquerdismo mais radical trama o partido legalizado em 18 de fevereiro de 1975. Por motivos burocráticos, por ter um símbolo muito semelhante ao do PCP, o PCTP é proibido de concorrer às eleições para a Assembleia Constituinte, em abril de 1975. Arnaldo Matos acelera a sua retórica sempre desconfiada da liberdade. Atos violentos de tortura de militantes do partido são usados como pretexto pelos militares de Abril para irromper pelas sedes do partido, em Coimbra e em Lisboa, sobretudo, e levar presos cerca de 400 militantes do PCTP, muitos com mandados de captura em branco, assinados por Otelo Saraiva de Carvalho. É por estes dias que se pintam paredes a pedir a libertação do "camarada Arnaldo", o "grande educador da classe operária"..1982, a saída do partido."Fui-me embora porque na verdade eu tinha de tomar conta dos meus filhos e não tinha outra forma de ganhar a vida a não ser exercer a profissão que eu sei fazer".O PCTP-MRPP esteve do lado dos vencedores no 25 de Novembro, mas isso tornou-o um perdedor, por minar a sua credibilidade como movimento revolucionário. Com o refluxo do PREC também se esvazia a esquerda radical e normaliza-se a democracia. O partido passa a ser uma nota de rodapé: nas eleições, o partido fica sempre longe de São Bento, onde se sentam PCP e UDP. A sua quase irrelevância leva Arnaldo Matos a deixar o partido em 1982, uma saída que o partido demorou três anos a digerir: só o comunicou em 1985 ao Tribunal Constitucional. O advogado voltou à advocacia, como explicou em 2015: "A única coisa que eu aprendi com os trabalhadores é que não se vai embora quando se perde. (...) Explico por que é que me fui: fui-me embora porque na verdade eu tinha de tomar conta dos meus filhos e não tinha outra forma de ganhar a vida a não ser exercer a profissão que eu sei fazer."2015, o ano da rutura."Vimos para criar uma sociedade sem classes. Se isso custar o pescoço a uma quantidade de indivíduos, não temos medo disso".Depois de ir ganhar a vida, Arnaldo Matos foi voltando a pouco e pouco ao partido que fundou, sobretudo desde que o PCTP passou a receber subvenção pública, por ter ultrapassado os 50 mil votos. Garcia Pereira, seu afilhado, recebeu-o, ouviu conselhos, seguiu orientações. O "grande educador" transformou-se num pequeno ditador no modo como mandava num partido de que não era dirigente e levou tudo a eito no jeito truculento de sempre. Após as eleições de 2015, afastou aqueles que tinham feito a travessia do deserto sem ele e passou a gerir o PCTP. Duvidando de que este seja o tempo para que a revolução aconteça no imediato, Arnaldo confessou. "Não há condições para que seja, não vale a pena. Não sou um idealista, sou um romântico da revolução.".Jornalista do DN e autor do livro Morte aos Traidores!(a história do MRPP)