Arguidos e vítimas acham normal demora no processo
O advogado Ricardo Sá Fernandes, que defendeu o apresentador televisivo Carlos Cruz, condenado a sete anos de prisão por vários crimes de abuso sexual de menores, afirmou à Agência Lusa que ainda se pode considerar razoável o tempo que o Tribunal da Relação de Lisboa está a levar para apreciar os recursos.
"Já deixei de fazer prognósticos. Enganei-me tantas vezes", argumenta o advogado, frisando que o acórdão proferido a 03 de setembro de 2010 só subiu à Relação em janeiro passado.
Ricardo Sá Fernandes indicou que, "face à dimensão da matéria a apreciar, um ano não é um prazo excessivo".
"Tenho grande expetativa que se possa fazer justiça. Não sei é quando nem onde. Não sei se será na Relação, noutro tribunal superior, em Estrasburgo [no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos]", referiu.
Miguel Matias, advogado da Casa Pia e dos jovens assistentes que acusaram os arguidos, considera "normal" que ainda não tenha havido decisão sobre os recursos por se tratar "de um processo que acumulou uma impressionante quantidade de papel, ou melhor, de incidentes", que fizeram com que o julgamento durasse seis anos.
Em declarações à Lusa, Miguel Matias afirmou que para os jovens que acusaram os arguidos de abusos sexuais pouco importa o tempo que a Relação demore para analisar os factos considerados como provados em primeira instância.
"Para eles, o processo terminou no dia em que foi lido o acórdão. Foi para eles a demonstração de que acreditaram no que diziam quando acusaram pessoas conhecidas. Foram submetidos a tanta pressão e lutaram com muita dignidade contra essa pressão", declarou.
Ricardo Sá Fernandes mantém que a verdade "não é o que está no acórdão" e pode até ser descoberta fora do processo, frisando que "é uma questão de tempo" até vir ao de cima.
"Não seria a primeira vez que a verdade é descoberta fora do processo e este vai a reboque", indicou.
Desde a leitura do acórdão, a atenção mediática sobre o processo abrandou, mas o caso ainda fez manchetes, nomeadamente na entrevista de Carlos Silvino, ex-motorista da Casa Pia, condenado a 18 anos de prisão por abusos sexuais, que afirmou em janeiro deste ano ter sido obrigado a mentir para acusar os arguidos, que disse estarem todos inocentes.
Em março, foi a vez de Ilídio Marques, um dos assistentes, declarar que tinha mentido nos interrogatórios, desmentindo as acusações que fez.
As defesas de Carlos Cruz e do advogado Hugo Marçal, condenado a seis anos e dois meses de prisão, requereram que Carlos Silvino e Ilídio Marques fossem ouvidos novamente, mas, segundo Ricardo Sá Fernandes, "não houve resposta".
O advogado considera que as declarações de Silvino e Ilídio são "revelações da maior importância".
Quanto a Miguel Matias, afirma que "não é de estranhar" que surjam essas formas de "pressão", referindo mesmo que poderão "haver mais".
Os recursos foram entregues em novembro do ano passado. Na Relação, estão a ser analisados pelos juízes desembargadores Guilhermina Freitas e Calheiros Gama.
O médico Ferreira Diniz foi condenado a sete anos de prisão, o embaixador Jorge Ritto a seis anos e oito meses e o ex-provedor-adjunto da Casa Pia Manuel Abrantes a cinco anos e nove meses. Gertrudes Nunes foi a única arguida absolvida.