Aprender a navegar. 20 municípios já o ensinam nas escolas públicas
Uma vez por semana, Maria Beatriz e Sofia Bandurra, de 16 e 14 anos, têm encontro marcado na base militar de Almada para a aula de vela, integrada no plano curricular complementar das suas escolas. Uma está a terminar o ensino básico, a outra a começar o secundário. Ambas fazem parte do Agrupamento de escolas da Costa da Caparica, um dos 20 nacionais com desporto náutico escolar a quem a Fundação Oceano Azul e o Oceanário de Lisboa decidiram entregar novos equipamentos para as modalidades náuticas. O protocolo foi assinado esta segunda-feira, em Lisboa. As pequenas Maria e Sofia estão convencidas das vantagens que esta decisão traz à sua modalidade: "vai chamar mais jovens" e aproximá-los do mar.
E a verdade é que o número de jovens interessados nestas modalidades tem aumentado, garantem os professores. Muito às custas do investimento concretizado ao longo dos anos no equipamento para a parceria entre os vários centros de formação náutica no país e o programa de Desporto Escolar - enquadrado na legislação do Ministério da Educação e Ciência de Portugal como complemento curricular de atividades desportivas. Foi agora finalizada a doação de 29 equipamentos náuticos que incluem 12 barcos Laser Bahia, dois barcos Access para a prática de vela adaptada e 15 pranchas de Stand Up Paddle, num investimento de mais de 130 mil euros.
A ideia de levar os alunos para o desporto de mar e de rio começou a ser semeada durante a Expo 98. Os professores Rosa Rosa e Pedro Nuno Santos viram-na nascer, há mais de 20 anos. Estiveram esta segunda-feira na capital para a assinatura do protocolo, em representação do Agrupamento de escolas à Beira Douro, em Gondomar. Contam anualmente com 200 alunos no desporto escolar náutico e afirmam mesmo que o número de alunos está "garantidamente" a crescer. Muito fruto da dinâmica que se vai criando entre escolas e dentro da própria escola, pelo "passa a palavra". Há atualmente sete professores dedicados ao desporto náutico escolar, mas "a comunidade escolar inteira trabalha para isto", explica Pedro Nuno. Lá, até os professores de Físico-Química decidem ter uma ou outra aula na água.
E o novo material que estão agora a receber faz a diferença? "Faz mesmo", garante Rosa. "Vamos receber uma embarcação de vela (adaptada) para todos, que permitirá que alguém com dificuldades motoras pratique a modalidade, mesmo que o adversário não tenha qualquer limitação", conta. Diz que nunca lidou com situações em que jovens com dificuldades motoras desistem de entrar ou continuar numa modalidade náutica por falta de equipamento adaptado, mas ter as ferramentas mais seguras para estes casos "é uma forma de os incentivar a eles também".
Mais abaixo no mapa, o fenómeno faz-se sentir de igual forma. No agrupamento de escolas da Gafanha da Nazaré, o número de estudantes interessados no desporto náutico aumentou significativamente "desde que os serviços centrais do desporto escolar começaram a apoiar financeiramente e com equipamento os vários centros de formação", garante o professor Mariano Rodrigues. Atualmente, há cinco escolas e um total de 40 a 50 alunos em prática regular semanal no porto de Aveiro, que cedeu as instalações para o desenvolvimento do desporto escolar náutico na região.
O material doado pela Fundação Oceano Azul e pelo Oceanário de Lisboa prometido às escolas desta cidade já lá chegou há uns meses e Mariano sente que foi um chamariz para mais alunos. "Nota-se uma maior adesão, só pelo facto de se ter equipamento novo e em ótimas condições". Em termos práticos, conta que o novo equipamento traz mais "facilidade de navegação e segurança", mas também "dinâmica de grupo", pois o novo barco tem capacidade para mais pessoas.
Ao todo, há 56 centros de formação náuticos no país inteiro e é através deles que os agrupamentos estabelecem protocolos para integrar as modalidades náuticas no desporto escolar. Os 19 centros contemplados no protocolo são frequentados por mais de 20 mil alunos do ensino básico e secundário.
"Cada um é atribuído a um agrupamento de escolas, o ministério atribui horas de formação para o centro e retiradas dos horários letivos dos professores". Quem explica é Nuno Reis, coordenador do Centro Náutico do Parque das Nações, onde decorreu a cerimónia, mas também membro da equipa de coordenação nacional do desporto escolar. "Os agrupamentos apresentam um projeto e têm como condição requisitar professores. Quando estes não têm tanto à vontade para estar dentro de água, os técnicos dos clubes auxiliam, mas é obrigatório haver um professor presente".
Na generalidade, cada centro contempla 12 horas por semana para o desporto escolar. Mas há exceções. Os agrupamentos de escolas à Beira Douro e Coimbra Oeste são os únicos dois que têm 15 horas, como consequência do "trabalho de grande envolvência e relevância", frisa Nuno. "Os novos começam a atividade com oito ou dez horas, evoluindo gradualmente".
Uma das práticas dos centros de formação para fomentar a aproximação dos jovens a estes desportos é abertura das suas agendas para visitas de escolas, dentro ou fora da cidade. "Chegamos a novembro com as marcações para estas visitas fechadas até junho, todas as semanas", conta o coordenador.
O chefe executivo da Fundação Oceano Azul considera que é urgente pensar em iniciativas que promovam o mar e o desporto envolvente. "Todos andamos aqui a dizer que é preciso aproximar mais os portugueses ao mar, mas só andamos a ensaiar como o fazer", começa por dizer Tiago Pitta e Cunha, em entrevista ao DN.
O administrador frisa a capacidade competitiva que Portugal pode alcançar se der mais alento às modalidades náuticas. "Não temos de ser só o país do futebol. Podemos ser uma potência náutica no desporto náutico." E embora o objetivo do Desporto Escolar não seja a alta competição, "a apetência para a alta competição é uma consequência positiva", disse. Por isso, "o Desporto Escolar deve estar bem articulado com os desportos de alta competição", remata.
Para a Ministra do Mar, Ana Paula Vitorino, também presente na cerimónia desta segunda-feira, o principal desta iniciativa é mesmo a literacia oceânica que impulsiona nos jovens. "Não é só uma questão de oportunidades, mas também de responsabilidades", sublinhou.
O projeto Desporto Escolar Náutico foi elaborado em colaboração com a Direção Geral de Educação e o Ministério da Educação e já foi formalmente concluído, com os 29 equipamentos distribuídos por todos os municípios selecionados.