Após 73 anos a votar à direita, Bordéus é o exemplo da onda verde que varre França

Ecologistas venceram em várias grandes cidades na segunda volta das municipais e ajudaram os socialistas a conquistar a capital. Macron é o derrotado da noite.
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Pierre Hurmic tem 65 anos e durante toda a sua vida (e mais quase uma década) a cidade de Bordéus foi governada pelo centro-direita. Mas este ecologista acaba de fazer história, ao conquistar a câmara desta cidade francesa, num dos exemplos da onda verde que varreu a França na segunda volta das eleições municipais, que se realizaram este domingo.

Bordéus, Lyon, Estrasburgo, Nancy... O partido Europa Ecologia - Os Verdes (EELV na sigla em francês) teve vários motivos para festejar, numa noite eleitoral em que o presidente Emmanuel Macron e o seu La République en Marche! (LREM) foram os grandes derrotados.

Hurmic, que tinha o apoio dos socialistas e dos comunistas, derrotou o atual presidente da câmara, Nicolas Florian, d'Os Republicanos, que tinha ganho na primeira volta e contava ainda com o apoio do LREM. Florian tinha assumido a presidência em 2019, após a saída do ex-primeiro-ministro e mentor Alain Juppé, que esteve à frente da câmara desde 2006.

"Estou muito triste", disse Juppé aos jornalistas à saída do edifício da câmara, quando já era quase certa a derrota de Florian, que tinha sido o favorito nas sondagens. "Mas o que é que querem? É a democracia. Há uma onda verde por toda a França", acrescentou. Desde 1947, primeiro com Jacques Chaban-Delmas e depois com Juppé, que a direita ganhava sempre à primeira volta em Bordéus.

"É um momento histórico para avançar a transição ecológica e social em termos de transportes, natureza, energia...", disse Hurmic, que durante vários anos se opôs à governação de Juppé (era vereador desde 1995). "Serei um presidente da câmara a tempo inteiro", acrescentou no discurso da vitória, numa crítica ao ex-presidente da câmara, que ocupou várias pastas ministeriais ao mesmo tempo que liderava Bordéus.

Em Marselha, a segunda maior cidade francesa, os Verdes conquistaram o maior número de lugares na assembleia municipal, mas a presidência da câmara ainda não está garantida porque não tiveram a maioria, precisando do apoio de pequenas formações políticas. A votação será ainda esta semana.

Em Lyon, a terceira cidade do país, o veterano presidente da câmara e ex-socialista Gérard Collomb não conseguiu que o seu sucessor, Yann Cucherat (em representação do partido de Macron), fosse eleito, com a vitória a caber ao ecologista Grégory Doucet.

Além das cidades onde ganharam, os Verdes ajudaram ainda os socialistas a conquistar várias câmaras, como a da própria capital, Paris, onde Anne Hidalgo foi reeleita com quase 50% dos votos, graças ao apoio do EELV.

O líder dos Verdes, o eurodeputado Yannick Jadot, exclui a entrada do partido no governo de Macron, apelando ao presidente que deixe de estar em "negação ecológica" e a aplicar "sem filtro" e "como prometeu" as 149 propostas da Convenção Cidadã sobre o Clima, que criou em resposta aos protestos dos coletes-amarelos, que recebe precisamente esta segunda-feira.

"Esta noite venceu o desejo de um ecologismo concreto, um ecologismo de ação", afirmou Jadot. Os Verdes impuseram-se na votação como a principal força política de esquerda em França, "sinal de um reposicionamento político que está a acontecer em vários países da Europa, onde os partidos ecologistas, à boleia das questões climáticas, têm tido mais votos", segundo a agência francesa AFP.

Macron, que deverá proceder a uma remodelação governamental nos próximos dias, disse no domingo que pretende dar "respostas fortes" e "à altura dos desafios e expectativas". O presidente entra nos dois últimos anos do seu mandato e, após as municipais, as questões ecológicas têm que fazer parte da agenda sob pena de não conseguir a reeleição em 2022.

A abstenção registou um nível histórico, com mais de 60% dos eleitores a faltarem na chamada às urnas, o que levou o presidente a manifestar-se "preocupado com a baixa taxa de participação".

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