Depois de um período de quatro anos retirada da representação, Angelina Jolie está pronta para receber a imprensa numa sala de baile de um hotel de luxo em Londres. A imprensa e bloggers de socialmedia de todo o mundo. O pretexto é a estreia de Maléfica - Mestre do Mal, de Joachim Ronning, a sequela da versão de Maléfica (2014), variação de A Bela Adormecida. Vai estar em exibição nos cinemas portugueses em versão original e dobrada já na próxima quinta..Aberta a conversa, o Diário de Notícias pergunta-lhe se o combate ao mal neste filme pode ter conotações de mensagem política. A resposta é dada com uma serenidade que impressiona: "Este filme ajuda a identificar de onde vêm algumas das trevas deste mundo. Aqui, a minha Maléfica não é tão maléfica como a Rainha Ingrid [interpretada com competência perversa por uma Michelle Pfeiffer sem medo das rugas), uma líder tão zangada, hostil e que acredita que a única maneira de sobreviver é destruir o outro. O filme é veemente a retratar uma líder fraca e ignorante. Os governantes ignorantes comportam-se dessa maneira e estão errados. Claro que não é um filme político, mas também é claro que os líderes do futuro, como a personagem de Elle Fanning, são aqueles que abraçam a diversidade, prezam o respeito entre as raças e querem saber do ambiente. São temas em que muitas pessoas e crianças nem vão reparar. Mas se alguém sair do cinema feliz e a sentir-se bem, então estamos a ir na direção certa.".Diz isto tudo na mesma altura em que na sala se ouve um telemóvel a tocar com música irritante: "Bem, lá tive de responder com banda sonora", diz com uma gargalhada tranquila. Ed Skrein, Elle Fanning, Chiwetel Ejiofor e Sam Riley, companheiros de elenco e sentados ao seu lado, olham encantados para a colega..Sobre o filme, nesta altura, a Disney tem esperança de que possa ainda superar os resultados do primeiro e pede para todos os críticos de cinema na sala assinarem um embargo para não publicar nada com juízo crítico até ao dia 15, véspera da data de estreia mundial, embora, por incrível que pareça, todos possam bater ou elogiar o filme nas redes sociais..Uma rapariga jovem com sotaque do Leste pergunta se tem ainda sonhos para o futuro: "Adoro ser artista, mas a minha primazia neste momento é cuidar dos meus filhos e guiá-los nesta fase da vida em que ainda precisam de mim, sobretudo antes de poderem ser lançados à vida. Quero estar com eles o máximo possível, mas tenho umas quantas ideias quanto ao meu futuro. Umas ideias loucas..." Sam Riley, o corvo negro do filme, deixa escapar: "Concorrer às presidenciais." Jolie ri, mas não comenta nem diz o previsível "que disparate". Na sala sente-se que o futuro da atriz pode passar por uma carreira política depois de todo o trabalho de madre Teresa de Calcutá que tem feito pelo mundo fora, mesmo sabendo-se agora que já tem acordo com a Marvel para ser uma das eternals de Eternals, a última palavra de cinema de super-heróis. A campanha para a Casa Branca pode esperar e de Hollywood é bem possível que George Clooney esteja em bicos de pés mais adiantados para essa aventura..Quanto ao papel desta figura maléfica de cornos duros e negros e de asas elegantes, Jolie lembra que agora a personagem está a criar uma mulher. Aurora, a afilhada, é desta vez encarada como uma filha. Mais do que no primeiro filme, Maléfica - Mestre do Mal flirta com a ideia de troca de lugares-comuns naquilo com que se representa o Bem e o Mal, mas não deixa de haver uma intencional afirmação do papel da força feminina. Uma fábula feminista? Jolie não responde, mas, quando confrontada com a hipótese de uma terceira parte, brinca: "Estamos com algumas ideias, algumas delas bem Disney, outras nem tanto. Gostaria de ser avó no próximo... De forma meio acidental, nestes dois filmes atingimos as etapas do crescimento de uma mulher, neste caso da personagem da princesa. Estes filmes mostram a evolução de uma mulher e agora também ficamos a conhecer o território das fadas negras. Pessoalmente, se voltarmos, gostava de ver as personagens viajar para outros lugares. Há tantos mundos para explorar." São palavras pronunciadas com uma nitidez e calma que é cada vez mais a sua característica. Uma voz que na versão dobrada do filme é assegurada por Inês Pereira..Tal como a sua personagem, Jolie apresentou-se em Londres com traços góticos: maquilhagem para o escuro e uma coroa subtil sob os seus longos cabelos castanhos. Alguém ao lado tenta investigar pela internet o criador do seu vestido decotado negro e todo de renda. Faz sentido ouvi-la falar da sua "criatura": "Ela tem tanto de humana como de animal. É uma criatura com instinto animal", precisamente aquilo em que a Angelina Jolie era perita em explorar em obras como Entre Estranhos e Amantes (1998) e Vida Interrompida (1999), o filme que lhe deu o Óscar de melhor atriz secundária..Antes de se despedir faz questão de deixar um recado: "O que gosto mais nestes filmes é o tema, em que se mostra que a noção de família não passa pela questão do sangue." O recado é dado com o tal sorriso tranquilo, tão tranquilo como magoado. Os tais influencers e bloggers aplaudem e estão felizes. Entre eles há portugueses, como é o caso de Ruben Rua, modelo, ator e apresentador, convidado pela Disney para a Première londrina. Hoje em dia, os filmes promovem-se através de stories nos instagrams da vida e as figuras públicas cada vez mais são convidadas para estas estreias, mas, como Angelina Jolie tem algo de realeza, não há autógrafos nem fotografias para ninguém. Maléfica - Mestre do Mal se calhar não precisava de nada disto para ser um sucesso gigante à escala planetária...