"Sabem quantas mensagens eles trocam por dia entre eles, em média? Um adolescente português? À volta de 80, 100". A curiosidade é lançada pela pediatra Maria do Céu Machado numa conversa sobre "adolescentes e pré-adolescentes", promovida pelo Clube Infarmed, na terça-feira "Isto [SMS's] será uma forma de comunicar com eles", acrescenta logo a seguir a também presidente da Autoridade Nacional do Medicamento..Estar atento parecendo que não está.A comunicação entre pais e filhos adolescentes foi, aliás, um dos temas abordados com Maria do Céu Machado. Mas como deve ser feito esse diálogo, que se apresenta, por vezes, quase impossível de estabelecer? "Estar muito atento parecendo que não está", começa por dizer a professora catedrática da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. E explica porquê? "O pai ou a mãe não podem começar a ficar chatos. Até porque têm ali alguém em que há dias que julga-se muito crescido e em outros dias sente segurança em se considerar pequeno e ser criança." A adolescência, diz, "vive desta dualidade, desta ambivalência, que é quererem ter a segurança da família e ao mesmo tempo quererem cortar o cordão umbilical"..Gap geracional tem de existir.Depois, quando os pais ouvem os filhos adolescentes dizer 'não tens de dizer nada' ou "eu faço o que achar' estão perante comportamentos "importantes e essenciais" que fazem parte do processo de se tornarem adultos, explica a médica. "Têm esta fase de terem rasgos de independência e depois voltar a acatar [o que os pais dizem]. Isso é importante, faz parte do desenvolvimento. Se eles acatassem sempre o que os pais estão a dizer, ou o que os pais estão a exigir, ou o que querem que eles façam, iam ficar miúdos para sempre", refere..E os pais hoje são mais permissivos, em comparação com gerações anteriores, considera. "Estão mais perto dos filhos, é ótimo, mas são pais. O gap geracional tem de existir", alerta. "Ou seja, a pessoa passa do muito amigo, camarada, companheiro para pai ou mãe sem eles estarem à espera. E é automático, se se tem alguma coisa a dizer, qualquer coisa que não é discutível", exemplifica Maria do Céu Machado. "Temos de mostrar que somos pais, fazer o gap geracional", reforça..A pediatra considera, no entanto, que "não pode haver muitas regras em casa, mas algumas tem de haver". E são para cumprir. Até porque fazem parte do crescimento e, como defende a especialista, "as regras dão segurança aos adolescentes. Gostam de ter os limites definidos".."Levar os amigos a casa".Uma conversa no Infarmed que começou com Maria do Céu Machado a caracterizar a adolescência, um período que vai dos 10 aos 20 anos, segundo a Organização Mundial de Saúde, e é dividida por duas fases: dos 10 aos 14 anos e dos 15 aos 20 anos. Na primeira, "começam a ter pensamentos mais abstratos", a fazer perguntas mais elaboradas, e é também a altura em que "o grupo de amigos começa a ter mais importância que a família"..E é nesta altura que aconselha: "É muito importante conhecer os amigos." Não se trata de escolher, esclarece. "Não é dizer este não é bom amigo ou boa amiga. É levar os amigos lá a casa. Ou seja, nós temos de estimular desde pequenos os amigos que eles devem ter. E estimular é deixá-los convidar mas também convidar os amigos para casa", considera..Na hora de dormir ficar longe de iPads, telemóveis.Na fase dos 15 aos 20 anos começam a ter namorados, relações mais estáveis, são menos influenciados pelos amigos, menos centrados em si, disse a pediatra perante uma plateia atenta no Clube Infarmed, no âmbito destas conversas com colaboradores do instituto. Foi a partir da assistência que o problema do sono começou a ser abordado. "Dorme-se menos, sejam adolescentes ou adultos. Os adolescentes especialmente deitam-se mais tarde, começam a consumir café, álcool e têm pais mais permissivos.".As tecnologias no quarto são uma das razões para dormirem menos, aponta Maria do Céu Machado. "Normalmente são três a cinco aparelhos no quarto", revela a pediatra deixando algumas linhas de orientação nesta matéria. "A seguir ao jantar não se mexe nem em iPads, telemóveis, nada, porque com toda a luminosidade o cérebro fica alerta e têm dificuldade em adormecer. O telemóvel não fica no quarto", aconselha..Mas qual é o número de horas que devem dormir?.A questão é lançada por uma mãe de um rapaz de 17 anos. "Normalmente a partir dos 16 anos deve-se dormir 8 horas, mas é muito variável, porque todas as famílias têm um padrão de sono", esclarece Maria do Céu Machado..Outro dos problemas abordados teve a ver com as horas que os adolescentes passam a jogar no computador. "Como em tudo na vida a antecipação e a negociação é sempre melhor", sublinha a pediatra sobre esta problemática. Ou seja, deve-se estipular regras antes de se começar a jogar, aconselha..Como sensibilizar para os perigos sem causar pânico?.Da assistência surgiu ainda outra preocupação de quem tem filhos adolescentes. Como despertar ou sensibilizá-los para o perigo sem os deixar em pânico?", questiona a mãe de uma rapariga prestes a fazer 14 anos. O tema não é fácil, mas é possível captar a atenção. De acordo com Maria do Céu Machado, não se deve exagerar e na conversa com os filhos optar-se por histórias que não tenham a ver com eles, mas sim dando exemplos em que os intervenientes são outros adolescentes.."Eles ficam atentos e resulta muito mais do que dizer: 'olha não pode ser assim porque pode acontecer-te isto...'", exemplifica a médica, referindo-se à "sensação que eles têm de invencibilidade". "Quando estamos a dizer: 'pode acontecer contigo', eles acham que não". A história tem de ser sempre ao lado, reforça. E alerta: "Os miúdos não podem crescer num ambiente de medo e com a sensação de medo. Nós vemos tanta coisa e ouvimos tanta coisa que estamos cheios de medos, o que eles tomam como: 'mãe que exagerada'".