Ada Hegerberg, a vencedora da Bola de Ouro que luta pelos direitos das mulheres

Norueguesa de 23 anos estreou-se como sénior aos 15 e a partir daí foi sempre a queimar etapas. Recentemente deixou de representar a seleção do seu país por considerar que existe um tratamento desigual da federação em relação aos homens. E por isso vai falhar o próximo Mundial feminino.
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Ada Hegerberg começou a marcar golos na Noruega ainda muito nova, "por volta dos sete anos", mas só começou a levar o futebol a sério "por volta dos 10". Agora com 23 anos, e no meio de alguma polémica que nada tem a ver com futebol devido a um episódio na gala de segunda-feira, tornou-se a primeira futebolista a receber a Bola de Ouro da revista France Football, que até este ano foi apenas entregue a atletas masculinos.

A distinção da France Football, que a considerou a melhor jogadora de 2018, premeia uma época em que ajudou o Lyon a vencer a terceira Liga dos Campeões consecutiva e a assegurar a 12.ª vitória seguida no campeonato francês. Pelo caminho fez 53 golos, marcando 15 na Champions (tantos como Cristiano Ronaldo) e batendo um recorde que já era seu. De acordo com a UEFA, já tem mais de 280 golos oficiais.

A carreira de Ada Hegerberg começou a ganhar notoriedade em 2010, quando tinha apenas 15 anos e se estreou pelo Kolbotn, onde jogava com a irmã, Andrine. Em 2011, com apenas 16 anos, faz um hat trick em sete minutos e no mesmo ano sagrou-se a melhor marcadora da equipa. No ano seguinte as duas irmãs Hegerberg foram jogar para o Stabaek e Ada foi novamente a melhor marcadora do campeonato.

As boas atuações das irmãs Hegerberg chamaram a atenção dos alemães do Turbine Potsdam e ambas emigraram em 2012. A dupla foi apenas separada em 2014, quando a vencedora da Bola de Ouro se transferiu para Lyon. Curiosamente, Ada e Andrine defrontaram-se pela primeira vez no passado mês de novembro, quando o Lyon jogou com o Paris Saint-Germain.

De 2014 para a frente os golos de Ada Hegerberg foram e têm sido importantíssimos no sucesso do Lyon, mas goi em 2016 que começou a surgir o reconhecimento internacional do futebol apresentado pela norueguesa. Nesse ano foi eleita a Melhor Jogadora da Europa para a UEFA, a Desportista do Ano na Noruega e entrou no Onze do Ano da FIFA. Em 2017, a BBC considerou-a a melhor jogadora do ano.

Mundial é já para o ano... mas Ada não vai

Depois de vencer a Bola de Ouro aos 23 anos, e já com uma série de títulos individuais e coletivos, seria óbvio que os olhos dos fãs do futebol se focassem em Ada durante o Mundial 2019, que se realiza em França. Mas ao que tudo indica, isso não vai acontecer, mesmo com a Noruega apurada.

É que desde 2017, após a eliminação do Europeu do mesmo ano, que a Ada Hegerberg não veste a camisola da seleção norueguesa, por iniciativa própria e como protesto pelas desigualdades que sente. "O futebol é o maior desporto na Noruega para as raparigas, mas agora não temos as mesmas oportunidades que os rapazes. A Noruega tem uma história rica no futebol feminino mas agora é mais complicado. Parámos de falar sobre o desenvolvimento do desporto e outros países passaram por nós", afirmou numa entrevista ao Guardian no verão.

Na segunda-feira, após vencer a Bola de Ouro, não mostrou sinais de querer voltar atrás na decisão de tornar a vestir a camisola do seu país. À AP disse que manteria a escolha para preservar a sua "autenticidade e valores enquanto pessoa e futebolista". "É preciso fazer muito para as mulheres terem mais condições para jogar futebol. Isto é tudo sobre respeito, e acho que esse respeito não tem existido", afirmou.

"Por vezes precisamos de tomar decisões duras para nos mantermos fiéis a nós. E eu disse-lhes, muito claramente, o que achava que não estava a resultar na seleção", explicou.

"Sempre me senti igual aos rapazes"

Também ao The Guardian, Ada Hegerberg, contou que ela e a irmã Andrine cresceram a "jogar com rapazes", até aos "13 ou 14 anos". E, por isso, nunca se sentiu diferente dos homens enquanto atleta, embora admita que as mulheres tenham muitas lutas pela frente.

"Nunca olhei para mim de forma diferente em relação a um futebolista homem. Sempre me senti igual. E trabalho arduamente para conseguir os meus sonhos como qualquer outra rapariga. Seja uma futebolista, uma mulher ou uma jovem, existem muitas lutas para se travar. Mas ao mesmo tempo, venham elas. Tenham confiança, acreditem em vocês e tenham respeito", afirmou então, na linha do que viria a dizer na segunda-feira, após receber a Bola de Ouro.

A Bola de Ouro, diz Ada, serviu também como contributo pessoal para uma causa: "Muitas vezes pensamos que isto é mesmo um mundo de homens e isso pode acontecer diariamente como mulher, sinceramente. Existem várias discussões para se ter como mulher em 2018 e ser uma futebolista e ganhar a Bola de Ouro é também para mim, pessoalmente, um passo para agir nesse tema."

Mais preparação do que números e recordes

Mais uma vez, os números e recordes estão todos do lado da jogadora de 23 anos. No entanto, Ada não pensa muito nisso, para não se desconcentrar. "Muitas pessoas falam sobre recordes, mas eu não penso muito nisso. Penso mais na preparação do que em números. Se estiver bem preparada, aparecerão resultados", afirmou também ao The​​​​​​Guardian.

"O importante é o lado mental. Durante o verão, eu a minha irmã Andrine e o meu pai estamos preocupados com resultados que nos tragam confiança e bem-estar. A minha filosofia é que as coisas se constroem pedra sobre pedra e quando se chega a um nível alto, temos de trabalhar para lá ficar", acrescentou a jogadora.

Ada Hegerberg explicou ainda que "lê muito", devido ao facto de não estudar, e que todos os dias precisa de alguma "distância do futebol", apesar de "treinar muito sozinha".

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