A quarentena numa "cela de luxo" do treinador do Santa Clara

João Henriques, que chegou aos Açores na quinta-feira, está a cumprir quarentena obrigatória num hotel, tal como o jogador Rafael Ramos.
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João Henriques, treinador do Santa Clara, regressou aos Açores na semana passada e está a cumprir a quarentena num hotel confinado numa "cela de luxo", como determinado pelo Governo Regional para conter a covid-19. "Vêm-nos trazer as refeições ao quarto e pronto. Não há mais contacto nenhum, não podemos sair do quarto. É praticamente uma prisão, estamos numa cela com uma vista extraordinária e somos bem tratados. É uma cela de luxo, se assim se pode dizer, mas é muito difícil", descreveu o treinador da equipa açoriana à agência Lusa.

A 14 de março, o Governo dos Açores decretou a realização de quarentena obrigatória de 14 dias a todos os passageiros que chegassem à região, sendo que, a 26 março, essa quarentena passou a ser realizada obrigatoriamente em unidades hoteleiras destinadas para o efeito, "independentemente da residência" das pessoas, disse o governo na altura.

"As pessoas do hotel são muito prestáveis e estão a tentar colaborar connosco, isso é inquestionável. Mas, por outro lado, estamos retidos num quarto com três metros por três. Temos a vantagem de ter uma vista extraordinária e uma varanda", evidencia Henriques.

Em "meados" de março, quando se aperceberam que iriam ser impostas restrições nos voos (o grupo SATA suspendeu as viagens para o exterior), João Henriques e os jogadores Rafael Ramos, Marco e André Ferreira decidiram regressar a casa para estarem com a família até porque o local onde se encontravam era "irrelevante" para os treinos no domicilio.

"Numa altura difícil para todos, a família é importante. É um apoio importante, sobretudo para jogadores com filhos pequenos", acrescenta Henriques, assinalando, que a "maioria" das famílias dos atletas já se encontrava nos Açores.

O plantel do Santa Clara terminará as férias no próximo dia 4 de março, altura em que João Henriques (que chegou aos Açores a 23 de abril) ainda estará em quarentena obrigatória no hotel. Uma situação que não irá impedir o técnico de 47 anos de "continuar a fazer exatamente aquilo" que fazia antes. No entanto, João Henriques avançou que foi traçado um plano de férias para os jogadores não deixarem "cair demasiado os índices físicos", estando a equipa técnica a controlar o peso e o estado anímico dos atletas.

Já durante o período de trabalho, são feitas videoconferências onde os jogadores fazem os exercícios que o treinador propõe e respondem a questionários sobre a qualidade de sono e o índice de disposição. "Tentamos que o primeiro inquérito chegue até às 9h30 da manhã, porque era a hora em que estávamos juntos a iniciar o treino para manter rotinas e horários", destaca.

Como forma de passar o tempo, João Henriques procura planear o futuro e observar jogadores. "Começo a planear o que vai ser o futuro a curto prazo, vamos buscar para a análise o que tínhamos feito para trás, observar jogadores, olhando tanto para o futuro imediato como a médio prazo", afirmou.

Entre o planeamento para o futuro, João Henriques analisa o "plano muito rigoroso" da Liga para o regresso aos treinos nos relvados, que se preveem muito "individualizados", num "espaço amplo" e com os treinadores de máscara, medidas que considera "importantes" para dar "confiança" aos jogadores.

João Henriques diz ser "fundamental" que a Liga retome a competição, quer por uma questão de "justiça desportiva", como de "sobrevivência" para os clubes que "dependem muito" das receitas televisivas. "Nós não podemos estar mais tempo parados, seja que indústria for, e a do futebol envolve muitos milhões de euros e muita gente. Não estamos só a falar de jogadores e treinadores, mas de tudo o que envolve o futebol", relevou.

Jogador procura manter a forma confinado num quarto de hotel

Rafael Ramos diz ser necessário manter a forma para o eventual regresso da I Liga, apesar de ser "mais difícil" ter motivação para treinar durante a quarentena num hotel, devido à covid-19. "É um bocado mais difícil ganhar motivação [para treinar estando num quarto de hotel], mas somos todos profissionais e sabemos bem aquilo que temos de fazer para estar em forma. Não vamos desperdiçar a oportunidade que poderemos ter de voltar à competição", afirmou o jogador do clube da I Liga de futebol.

Rafael Ramos (tal como os colegas André Ferreira, Marco e o treinador João Henriques) decidiu sair da região a 16 de março para ficar junto da família, em Lisboa, durante o período de confinamento. "Sai na altura em que decidiram parar o campeonato. Eu, como estava sozinho na ilha, decidi ir para o pé da família porque não sabia quanto tempo é que isso ia durar", assinala.

O jogador chegou aos Açores a 19 de abril, completando os 14 dias de quarentena obrigatória no próximo dia três de maio, precisamente o dia em que terminam as férias dos jogadores do emblema insular, que no dia quatro voltará aos treinos por videochamada. "É um pouco mais complicado estar num quarto de hotel, mas tinha de vir agora para depois estar disponível assim que os treinos pudessem recomeçar. Agora, temos de passar essa fase mais difícil. Há de passar", destaca.

Confinado ao quarto e impedido de circular no hotel, o lateral direito diz ser um "bocado estranho" não ter contacto com ninguém, uma vez que até as refeições são deixadas à porta do quarto.

Ainda assim, faz questão de frisar "todos os cuidados" prestados quer pela unidade hoteleira, quer pelo clube, dando o exemplo da bicicleta que tem no quarto. "Foi espetacular, deixaram a bicicleta entrar. Eu cheguei no domingo [19 de abril] e o clube na segunda-feira arranjou logo a bicicleta. Ajuda muito porque, além da corrida, não havia muito mais cardio que eu pudesse fazer sem ser com bicicleta", releva.

O jogador de 25 anos diz que "procura na internet" várias maneiras de se manter ativo durante o dia e fala "com muitos familiares" como forma de passar o tempo. "Também ocupo muito tempo a ver televisão, a ver as notícias, filmes, séries e jogo muito Playstation também. Surpreendentemente o tempo tem passado rápido", acrescenta.

O atleta considera os treinos por videochamada uma "excelente ideia", porque permite "manter a relação" entre o grupo, e diz que, atualmente, o que sente mais falta é do "ambiente do balneário". "Agora não temos estado juntos há algum tempo e é disso que mais sinto falta. Aquele ambiente de balneário, de ver toda a gente, estar junto com eles, e treinar com eles", aponta.

Rafael Ramos refere que é preciso "força mental" para ultrapassar a situação que vive, sendo que a "mentalidade" de atleta "ajuda" a ultrapassar esta fase. "Resiliência é o que é preciso agora. Mas acho que para estarmos no mundo do futebol temos de ter um pouco isso e então a nossa mentalidade ajuda a passar essa fase", destaca.

O Santa Clara encontrava-se em 10.º lugar com 30 pontos, aquando da suspensão da I Liga devido à covid-19, a 12 de março.

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