Para uma banda cuja fama, ao vivo, é um dos maiores cartões-de-visita, faz todo o sentido que a apresentação do novo disco seja feita nas mais míticas salas nacionais, os coliseus de Lisboa e Porto, onde os Diabo na Cruz, por incrível que pareça, vão atuar pela primeira vez. A razão para isso chama-se Lebre. É este o nome do mais recente trabalho do grupo liderado por Jorge Cruz, editado há apenas um mês e que, segundo o próprio, representa o início de um novo caminho.."Sim, sem dúvida que chegar aos coliseus é sempre um marco simbólico para qualquer banda. Já tínhamos passado por todas as grandes salas de Lisboa e Porto e só nos faltavam mesmo essas", afirma o músico de 43 anos, em conversa com o DN no intervalo de mais uma das sessões de ensaio que antecedem o grande dia..Chegaram a equacionar "fazer os coliseus" aquando do terceiro disco, o aclamado álbum homónimo, lançado em 2014, mas "a digressão foi tão longa que se impôs a necessidade de começar um novo ciclo". Desta vez, optaram, por isso, por inverter o processo: "Normalmente acabam-se as digressões nos coliseus, mas nós decidimos que só lá iríamos quando tivéssemos material novo. Não fazia sentido ir ao Coliseu para fazer a mesma coisa. Assim é mais arriscado, mas também muito mais entusiasmante.".Além de servir para apresentar o novo disco, o espetáculo funcionará também para fazer uma retrospetiva do percurso da banda, mas "acima de tudo", de acordo com Jorge Cruz, "serve para simbolizar um recomeço", a dada altura sentido por todos como necessário. "Temos um universo muito específico e foram oito anos seguidos a tocar quase sem parar", lembra. Pelo caminho fizeram três discos, que lhes permitiram "atingir um certo nível de relação com o público", através do sucesso de canções como Dona Ligeirinha, Chegaram os Santos ou Vida de Estrada. "Conseguimos marcar o nosso espaço à custa de muito trabalho e de muita estrada, o que implicou muita energia da nossa parte. Devido a tudo isso, a ideia da banda teve de ser um pouco repensada, não porque estivesse a ser posta em causa, mas pela necessidade de se encontrar algo novo para dizer", explica o vocalista e principal compositor dos Diabo na Cruz, para quem os objetivos iniciais, que levaram à criação da banda, já estavam a ficar cumpridos.."Isso levou-nos a questionar o que poderíamos acrescentar a partir daí", refere. "Essa reflexão ainda demorou algum tempo e conduziu-nos até este disco, que nos parece um acrescento em relação ao que até aqui havia sido feito. Queríamos encontrar um novo caminho sem repetir as mesmas fórmulas, mas também sem desvirtuar o que já tinha sido feito até aqui", defende Jorge Cruz. Aliás, para o músico, esta banda "só faz sentido existir se for para responder à ideia original que esteve na sua génese", a de fazer música popular portuguesa, no século XXI e numa banda rock. ."Essa foi sempre a nossa luta, encontrar e ocupar um espaço que sentíamos vazio, de modo a ligar esses dois universos." Um objetivo concretizado ao longo dos últimos oito anos, mas que "neste quarto disco tinha de ser repensado, numa sociedade também ela hoje muito mais focada na cultural popular e mais aberta a uma certa folclorização". Para isso era necessário ir um pouco mais longe, "escarafunchar na terra em busca de uma ligação mais profunda às raízes". Daí a "sonoridade mais retro", como a classifica Jorge Cruz, "quase à moda antiga, com um lado A e um lado B, como no tempo do vinil". Daí também algumas peças mais longas, mais focadas na musicalidade e não tanto no formato canção, que tão bons resultados deu anteriormente.."É um álbum mais profundo, em que tentamos articular emoções como a dor da paisagem queimada, a relação com a ancestralidade e a ideia de tentar saber se ainda é possível termos um sítio ao qual possamos pertencer, num mundo cada vez mais globalizado e cosmopolita, com as cidades cada vez mais parecidas e tudo o resto a ficar deserto", explica Jorge Cruz, que compôs e escreveu a totalidade dos temas. "Este disco foi o mais unívoco para mim, no qual estive mais isolado a fazer as músicas. O resto da banda esteve a trabalhar noutros projetos musicais e só quando tive as músicas todas preparadas é que as apresentei aos restantes elementos." O resultado disto tudo pode agora ser conhecido finalmente ao vivo, no palco dos coliseus, naquele que, afinal, é o território natural desta banda..Diabo na Cruz.Coliseu dos Recreios, Lisboa. 15 de novembro, 21.30. 15 €.Coliseu do Porto. 22 de novembro, 22.00. 15 € a 17,50 €