A 7 de março de 1921, o DN dava conta de que "estava convocada para ontem, na sede da Associação de Classe dos Empregados de Escritório uma sessão de propaganda promovida pela comissão organizadora do partido comunista. Esta sessão não se realizou devido a ter sido proibida pela autoridade superior, mas no entanto a assembleia ainda sancionou os nomes dos indivíduos indigitados para os corpos dirigentes do partido e que serão junta nacional, conselho económico e comissão de propaganda"..Desde o final do ano anterior que se vinham desenhando os alicerces do novo partido, mas esta reunião acabou por ser o ato fundador do Partido Comunista Português, que veio dar um corpo político às lutas sindicais que então se sucediam no país (e que, em maio desse ano, levarão à instituição das oito horas de trabalho) e à simpatia com a revolução de outubro na Rússia, que tivera uma primeira expressão na Federação Maximalista Portuguesa - de onde proveem, aliás, vários fundadores do partido. Instalada a sede em Lisboa, no mesmo ano viriam a abrir centros comunistas no Porto, em Beja e em Évora e seria lançado O Comunista, publicação precursora do Avante!. Em 1923 realizou-se o primeiro congresso. No final da década, o partido foi ilegalizado, iniciando um período de mais de 40 anos na clandestinidade..A comemorar 99 anos, o PCP deu ontem o pontapé de saída para as comemorações do centenário, que vão prolongar-se pelos próximos dois anos e que terão o momento alto a 6 de março do próximo ano, com o Comício do Centenário, no Campo Pequeno, em Lisboa. Comemorações que vão decorrer sob o lema "liberdade, democracia, socialismo - o futuro tem partido". Até lá, e ainda durante o ano seguinte, o PCP tem prevista uma longa lista de iniciativas, entre as quais se contam a edição de um livro sobre a sua história e de um documentário que será apresentado na Festa do Avante! do próximo ano - que constituirá outro momento alto das comemorações..Do programa consta também a realização de um encontro internacional, com a presença de outros partidos comunistas e operários, e várias iniciativas que pretendem destacar a ação dos comunistas em várias frentes - a ligação à juventude, a emancipação das mulheres e a valorização da cultura, com espetáculo no Porto, no final de 2021..Álvaro Cunhal, líder histórico do partido, terá um lugar de destaque nas comemorações do centenário, nomeadamente com a evocação do 70.º aniversário do julgamento de Cunhal, a 5 de maio de 2020, e o 60.º aniversário da fuga de Caxias, que se assinala a 4 dezembro de 2021. Para novembro de 2020 está prevista a iniciativa "Álvaro Cunhal e o PCP", visando destacar a obra teórica do líder comunista, mas também as "marcas indeléveis que, como organizador e dirigente, gravou na vida do coletivo partidário"..Se o 25 de Abril e o 1.º de Maio do próximo ano serão também datas especiais no calendário das comemorações, há outra data na agenda que assume particular relevância - o PCP reúne-se em congresso a 27, 28 e 29 de novembro. Será também um momento de comemoração, mas não será só isso. "A nova fase da vida política nacional, correspondente à anterior legislatura - balanço, significado e ilações" é um dos temas postos em cima da mesa pelo Comité Central do partido, mas com contornos definidos - "as insinuações sobre comprometimentos do PCP", a "mistificação sobre uma alegada "maioria de esquerda". E há também a questão, ainda não definida, da liderança..Jerónimo de Sousa, que precisamente em novembro completa 16 anos à frente do PCP, dizia ao DN, no final do ano passado, que a liderança "não será um problema, independentemente de qualquer solução". E mais não diz.."O futuro tem partido".Com o título de um dos partidos comunistas mais antigos do mundo, o PCP chega ao centenário a olhar para o futuro, reclamando para si o estatuto de um partido "diferente dos outros". Mas com razões para preocupação: a CDU, coligação com que se apresenta às eleições, vem batendo recordes negativos em sucessivos atos eleitorais - o que voltou a acontecer nas últimas legislativas, com os comunistas a registar o pior resultado desde o 25 de Abril..O fortalecimento do partido é, aliás, uma das linhas de ação do programa do centenário. Num discurso ontem à noite, num comício no Pavilhão Carlos Lopes, em Lisboa, que lançou as comemorações do centenário, Jerónimo de Sousa prometeu um "amplo programa de reforço do partido no plano de direção, dos quadros, da formação política e ideológica", bem como da sua "estruturação e organização", e estabeleceu o objetivo de "criar cem novas células" no partido, "responsabilizando cem novos quadros" por essa tarefa. "Exige o reforço do partido que levemos até ao fim a ação nacional de contacto com 5000 trabalhadores, pondo-lhes a questão de aderirem" ao PCP, afirmou ainda Jerónimo, que anunciou também o lançamento de uma "grande campanha nacional de fundos" e o "aumento geral das quotizações"..No discurso, o líder comunista evocou os "cem anos quase cumpridos, tendo sempre no horizonte a perspetiva de que o PCP não abdica da realização de uma terra sem amos". Um centenário em que o partido foi "submetido às mais duras provas", o "único que atravessa os anos da ditadura sem se render nem abandonar a luta". "Quase um século depois, aqui estamos. Somos o Partido Comunista Português. Um Partido Comunista digno desse nome", rematou..As fases do PCP.O PCP nasceu a 6 de março de 1921, em Lisboa, com o seu corpo fundador a ter origem principalmente no sindicalismo. Cinco anos depois, foi obrigado a passar à clandestinidade, situação em que viveria até 25 de abril de 1974. Durante o Estado Novo foi, na prática, o único partido a combater o regime..Bento Gonçalves: o PCP no caminho do marxismo-leninismo.Bento Gonçalves é eleito secretário-geral em 1929. Operário do Arsenal da Marinha, é o grande responsável pela reorganização do partido e pela afirmação de uma linha marxista-leninista, o que até então era alvo de disputas internas. Em 1930 é preso e deportado. Volta a ser preso em 1936 e é enviado para o Tarrafal, onde morre em 1942..Álvaro Cunhal: líder histórico da clandestinidade até à liberdade.O homem que fez do PCP aquilo que em parte ainda é hoje inscreveu-se no partido em 1931, aos 17 anos. Proveniente da burguesia e licenciado em Direito, Álvaro Cunhal (1913-2005) declarava-se um "filho adotivo do proletariado" e pôs toda a sua vida e carisma ao serviço do PCP e da sua luta. Passou várias vezes pela prisão e em 1961, após a fuga de Peniche, assumiu formalmente o cargo que na prática já era seu, o de secretário-geral. À política juntou diversa produção intelectual - romances, traduções, pintura. Em 1962 exilou-se no estrangeiro, de onde só regressaria dias depois do 25 de Abril. Conduziu o partido até 1992, sucedendo-lhe Carvalhas. Manteve o PCP na mais estrita ortodoxia, recusando a perestroika de Gorbachev. Em 1991 tinha visto o sonho de uma vida desmoronar-se com o colapso da URSS..Carlos Carvalhas: um partido na ressaca da queda da União soviética.Economista, Carlos Carvalhas sucedeu a Álvaro Cunhal em 1992, mantendo-se como secretário-geral durante 12 anos, até resignar, em 2004. O PCP vive então um período conturbado. Carvalhas apanha um partido dividido entre renovadores e ortodoxos, no rescaldo da queda da União Soviética..Jerónimo de Sousa: o acordo político em que ninguém acreditava.Em 2004, o PCP escolhe novamente um operário (metalúrgico) para a liderança. Cerca de dez anos depois, será Jerónimo de Sousa a conduzir o partido quando, em 2015, se ensaia uma solução política totalmente inédita em Portugal: pela primeira vez, o PCP dá suporte parlamentar a um governo do PS.