NATO "nunca esteve mais unida do que está hoje" no apoio à Ucrânia

Bruxelas acolheu reuniões da Aliança Atlântica, G7 e Conselho Europeu, com Zelensky a participar à distância para pedir apoio ilimitado dos aliados (a resposta ficou aquém do pedido) e denunciar o uso de fósforo branco pela Rússia. Moscovo aumenta a retórica contra a Polónia após expulsão de "espiões". No terreno, Kiev aparenta estar a contra-atacar.
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A maratona diplomática de cimeiras em Bruxelas culminou com a promessa de mais sanções contra a Rússia e de mais ajuda à Ucrânia, ainda assim aquém do "apoio ilimitado" pedido pelo presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. A NATO "nunca esteve mais unida do que está hoje", disse o presidente norte-americano, Joe Biden. Um mês depois da invasão russa, Kiev parece contra-atacar no terreno, com alegações de que recuperou o controlo de algumas localidades em redor da capital e de que destruiu um navio da frota russa em Berdyansk, no mar de Azov.

"Um mês de resistência heroica. Um mês do sofrimento mais sombrio", disse Zelensky na reunião da NATO, a primeira do dia de ontem. "Para salvar o nosso povo e as nossas cidades, a Ucrânia precisa de ajuda militar sem restrições", acrescentou o presidente, alegando que a Rússia está "a usar o seu arsenal total sem restrições".

Na prática, Zelensky está a pedir armas ofensivas, incluindo tanques e aviões, em vez de apenas as armas defensivas que tem recebido. Contudo, não insistiu em pedir à NATO que feche o espaço aéreo ucraniano (algo que os aliados já rejeitaram em várias ocasiões), nem falou em aderir à organização (uma hipótese que a Rússia rejeita totalmente, defendendo o estatuto de neutralidade para a Ucrânia).

O Ministério dos Negócios Estrangeiros russo reagiu acusando a NATO de querer que o conflito continue e avisando que o Ocidente "está a colher uma colheita terrível" ao armar a Ucrânia, encorajando o governo de Kiev a usar a força contra as autoproclamadas repúblicas de Donetsk e Lugansk. Moscovo tem argumentado que os habitantes destas zonas estavam sob a ameaça de "genocídio", justificando assim a decisão de invadir.

Zelensky denunciou também, na sua intervenção na reunião da NATO mas também mais tarde na do G7, que Moscovo estará a usar fósforo branco, que arde a alta temperatura e pode ser usado para iluminar o terreno ou como camuflagem, por causa do fumo que gera. Nesse contexto, o seu uso não é ilegal segundo a Convenção sobre Armas Químicas, podendo contudo sê-lo se o seu alvo forem as pessoas, visto causar queimaduras graves. Zelensky disse que a ameaça de uso de armas químicas é "real".

Na conferência de imprensa após a cimeira da NATO, o secretário-geral Jens Stoltenberg lembrou que o uso de armas químicas "vai mudar totalmente a natureza do conflito, será uma violação flagrante do direito internacional e terá consequências alargadas". Mais tarde, falando aos jornalistas após a cimeira do G7, o presidente norte-americano avisou que haverá uma resposta se forem usadas: "A natureza da resposta vai depender da natureza do uso".

Biden defendeu ainda que "a NATO nunca esteve mais unida", alegando que o presidente russo, Vladimir Putin, "está a ter exatamente o oposto do que pretendia como consequência de entrar na Ucrânia". Mostrou-se ainda a favor da saída da Rússia do grupo do G20, algo que não é consensual (a China já se mostrou contra, por exemplo), sugerindo como alternativa que a Ucrânia seja convidada para as reuniões.

Stoltenberg, por seu lado, apelidou a invasão russa como "a maior crise de segurança numa geração", reiterando também que os aliados se mantêm unidos na sua resposta. O secretário-geral da NATO, que viu os líderes da Aliança estenderem por mais um ano o seu mandato, confirmou o reforço esperado das defesas na fronteira leste, com mais 40 mil tropas e o envio de quatro batalhões para a Eslováquia, Hungria, Bulgária e Roménia. Haverá ainda apoio à Ucrânia para reforçar a defesa contra ameaças "biológicas, químicas, radiológicas e nucleares".

A Rússia poderá estar a tentar testar a união da NATO, tendo entretanto aumentado a retórica contra um dos aliados, a Polónia. Moscovo acusou Varsóvia de uma "perigosa escalada" da situação, após ter expulso 45 diplomatas russos por alegada espionagem. Para o Ministério dos Negócios Estrangeiros russo, esta ação é guiada por uma "russofobia" que a NATO "elevou ao nível de política oficial".

O presidente norte-americano lembrou também que os EUA já prometeram dois mil milhões em ajuda militar à Ucrânia e mil milhões em ajuda humanitária, além de terem decidido abrir as portas a até cem mil refugiados ucranianos. Washington anunciou ainda mais sanções contra a Rússia, que atingem políticos, oligarcas e empresas do setor da defesa. Já o G7 e a União Europeia sancionaram todas as transações que envolvem as reservas de ouro russo, para evitar que Moscovo contorne as medidas de isolamento financeiro já tomadas. O G7 reiterou que fará de tudo para garantir que Putin e os apoiantes serão responsabilizados pela invasão da Ucrânia, ameaçando com sanções ainda mais severas.

Biden foi também convidado para o Conselho Europeu, que antes da sua chegada reelegeu o belga Charles Michel para um segundo mandato de dois anos e meio. Os líderes europeus rejeitaram entretanto a ideia de pagar o gás russo em rublos, como exige Moscovo, alegando que isso seria uma rutura dos contratos. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, alegou que a Rússia não poderá mais usar o gás para "chantagear" a União Europeia.

Do outro lado do Atlântico, a Assembleia Geral das Nações Unidas voltou a aprovar uma resolução (não vinculativa) exigindo que a Rússia ponha um fim "imediato" à guerra na Ucrânia. A resolução foi aprovada com 140 votos a favor, 38 abstenções e cinco votos contra.

Enquanto prosseguem as tentativas de isolar a Rússia a nível diplomático, na Ucrânia prosseguem os bombardeamentos. Contudo, após um mês de combate, a situação parece estagnada, com os ucranianos a alegar mesmo ter recuperado o controlo de algumas localidades junto a Kiev. É o caso de Makariv.

A principal conquista ucraniana terá contudo sido a destruição de um navio de transporte russo, atracado no porto de Berdyansk que já caiu sob o controlo de Moscovo. A chegada do Orsk tinha sido assinalada pelos media russos como um "evento épico". O anúncio da sua alegada destruição, vinha acompanhado de um vídeo amador onde se via um incêndio, que supostamente terá alastrado a outros navios. Nada disto foi confirmado pela Rússia.

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Kiev e Moscovo confirmaram contudo uma troca de prisioneiros - dez soldados de um lado por dez do outro. Segundo os ucranianos é a primeira troca de militares, tendo também havido uma troca de marinheiros civis. Os russos já tinham também devolvido o presidente da câmara de Melitopol, em troca de nove presos.

O Kremlin desvalorizou entretanto o suposto desaparecimento do ministro da Defesa, Sergei Shoigu, que não é visto há duas semanas, alegando que ele está demasiado ocupado para aparecer em público. "Há uma operação militar especial em curso. Não é o momento para atividade mediática", disse o porta-voz, Dmitry Peskov.

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